Jornalista russo critica governo e fala em ‘destruição da mídia’ antes de eleição

Roman Dobrokhotov, editor-chefe do site investigativo "The Insider", condena o crescente controle do Estado sobre a imprensa

Roman Dobrokhotov, editor-chefe do site investigativo The Insider, designado como “agente estrangeiro” por ter denunciado o envenenamento do político da oposição Alexei Navalny, acusa o Kremlin de “destruir a mídia” no país. Jornalistas e veículos de imprensa críticos ao governo são alvo de uma perseguição que tem o respaldo da Justiça do país. As informações são do portal suíço Swissinfo.

A declaração de Dobrokhotov resume o momento da imprensa na Rússia, que dentro de três semanas terá suas eleições parlamentares sem a participação dos aliados de Navalny, excluídos do pleito ou forçados a buscar exílio depois que suas organizações foram declaradas inimigas do Estado em junho.

O The Insider ganhou notoriedade ao irritar o Kremlin quando identificou os funcionários de segurança do Estado que supostamente estavam por trás do envenenamento de Navalny, em agosto do ano passado. O governo russo negou a responsabilidade pela tentativa de assassinato do político e classificou o incidente como “uma operação especial apoiada pelo Ocidente para manchar sua reputação”.

Roman Dobrokhotov, editor-chefe do The Insider, após batida policial na sua casa que resultou em prisão (Foto: The Insider/Reprodução YouTube)

Após a publicação de tais reportagens desfavoráveis, a Rússia declarou o site e cinco de seus jornalistas como “agentes estrangeiros”. A medida foi um aparente ato de vingança contra a mídia independente por ajudar a revelar o papel do Kremlin no envenenamento de Navalny e outras tentativas de assassinato pelas agências de segurança.

O Insider também trabalhou com o site investigativo Bellingcat, da Holanda, e foi um dos vários novos veículos a publicar exposições embaraçosas para o governo russo. Entre elas, histórias da vida de regalias e irregularidades da elite russa aliada ao presidente Vladimir Putin.

Dobrokhotov chegou a ser detido em julho, quando a polícia realizou uma ação de busca no apartamento em que ele mora em Moscou. A Justiça alegou que a ação tinha relação com um caso alheio de difamação, episódio que o jornalista classificou como “absurdo”.

“Não estamos falando sobre censura aqui, mas sobre a destruição dos elementos democráticos da sociedade civil”, declarou em entrevista à agência Reuters.

“Acho que isso é apenas o começo”, disse ele. “A destruição da mídia, de organizações não governamentais, não é um fim em si mesma, mas um meio para apertar o controle do Estado”.

O partido de situação Rússia Unida, alinhado com Putin, nunca foi seriamente desafiado durante suas longevas duas décadas no poder. Mas as disputas eleitorais no passado levaram a manifestações de rua contra o governo. Os oponentes do Kremlin dizem que as autoridades estão mais preocupadas do que nunca por causa do declínio dos padrões de vida no país.

Ponto de inflexão

A designação de “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. A Rússia nega que uma repressão esteja em andamento, embora sites que denunciam erros de Putin e escândalos ligados ao governo já tenham sido listados como “organizações indesejáveis” e até banidos.

Para Dobrokhotov, o envenenamento quase fatal no ano passado de Navalny, o crítico mais proeminente do presidente, foi o ponto de inflexão.

“Uma tentativa de assassinato contra o principal líder da oposição é um passo sério”, disse Dobrokhotov. “Eu acho que foi quando tudo começou a se desenrolar.”

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