Metade dos russos diz não ter valores democráticos, aponta pesquisa de opinião

Levantamento se baseou em entrevistas com mais de 1,6 mil cidadãos russos, ouvidos em 137 cidades do país

Passado um mês das eleições parlamentares, uma pesquisa da agência independente Levanda Center publicada nesta terça-feira (19) aponta que mais russos dizem não ter valores democráticos do que aqueles que os têm. O trabalho foi realizado a partir de entrevistas com 1.634 cidadãos, ouvidos em 137 cidades da Rússia entre os dias 23 e 29 de setembro, segundo o jornal The Moscow Times.

O levantamento aponta que um percentual próximo da metade (47%) da população afirma que não tem convicções políticas baseadas nos chamados valores democráticos, frente a 44% dos russos que se identificam com o sistema igualitário de detenção do poder. A polarização mostrou uma disparidade crescente nos resultados desde a pesquisa de 2018 sobre o mesmo tema.

O estudo surge exatamente um mês após o polêmico pleito da câmara baixa do parlamento russo, a Duma, onde o partido governista Rússia Unida atingiu a maioria parlamentar em uma votação que se estendeu por três dias e foi marcada por denúncias de fraude e interferência estatal.

Manifestação contra a prisão de Alexei Navalny em Moscou, em abril de 2021 (Foto: Okorok/WikiCommons)

Na faixa etária dos jovens, entre 18 e 24 anos, os russos se mostram mais inclinados a se posicionarem como defensores dos valores democráticos (50%) do que os entrevistados mais velhos (41%), entre 40 e 54 anos.

Outro tópico revelou que 18% dos russos afirmam ter orientação política conectada aos ideais socialistas de esquerda, bem atrás da maioria dos entrevistados (72%) que rejeitam se identificar como tal.

A identificação com a esquerda e o socialismo é uma característica mais presente na população acima dos 55 anos, que têm maior probabilidade que as outras faixas etárias. Em todas as idades, 40% dos entrevistados que revelaram apoiar os ideais de esquerda também apoiam o Partido Comunista da Rússia.

Necessidade de mudança ética

Uma outra pesquisa publicada pela agência de comunicação internacional PBN Hill + Knowlton Strategies em conjunto com a agência de pesquisa independente MAGRAM Market Research revelou que seis em cada dez russos acreditam que o país precisa “desesperadamente” de um novo código de ética.

Segundo o estudo, os principais tópicos de interesse da população dentro de um contexto ético reformulado são: meio ambiente (85%), inclusão (83%), violência doméstica (78%), política (74%), igualdade em na família (59%) e nas carreiras (57%).

Por que isso importa?

Durante a corrida eleitoral, o Kremlin impôs uma forte repressão contra figuras políticas da oposição e a mídia independente, em meio a um processo de perda de popularidade do Rússia Unida e do presidente Vladimir Putin.

O governo chegou a obrigar Apple e Google a retirarem de suas lojas virtuais um aplicativo criado por aliados do opositor Alexei Navalny, sob risco de aplicação de uma multa às duas big techs. O opositor defendia uma estratégia de “votação inteligente”, que consistia em incentivar seus seguidores a apoiarem o candidato com melhor chance de derrotar o Rússia Unida em suas regiões.

Navalny é o principal crítico do governo Putin e está preso desde janeiro, quando retornou da Alemanha após cinco meses de recuperação médica. Ele foi envenenado por novichok, um agente químico que afeta o sistema nervoso e foi desenvolvido pela ex-União Soviética nos tempos da Guerra Fria. O oposicionista acusa Moscou de tentar matá-lo.

Em fevereiro, um tribunal condenou Navalny a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, quando foi acusado de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente no período em que estava em coma pela dose tóxica.

Tags: