Oficiais morrem, ressurgem mais tarde e expõem guerra de desinformação entre Rússia e Ucrânia

Duas importantes figuras das forças armadas russas foram dadas como mortas, mas vídeos de autenticidade questionável sugerem o contrário

A Ucrânia anunciou na segunda-feira (25) que o almirante russo Viktor Sokolov, comandante da frota do Mar Negro, morreu em um ataque ao quartel-general da esquadra na Crimeia. No dia seguinte, porém, vídeos exibidos pela TV estatal da Rússia e por canais de Telegram mostraram o que seria o oficial em uma reunião de líderes de defesa. Desde então, persiste a dúvida: foi a inteligência de Kiev que errou ou é Moscou que tenta esconder a perda? Ante à incerteza, fica claro que desinformação e propaganda têm sido usadas como armas no conflito, e identificar as mentiras dos dois lados é um desafio cada vez maior.

Não chega a ser novidade o ressurgimento de um oficial russo que havia sido dado como morto. Um episódio idêntico ao de Sokolov envolveu Anton Kuprin, capitão do cruzador Moskva, o orgulho da frota russa, que afundou em abril de 2022.

Reunião de lideranças militares russas comandada pelo ministro da Defesa Sergei Shoigu, março de 2022 (Foto: facebook.com/mod.mil.rus)

A própria perda do navio até hoje não foi esclarecida. Embora Moscou insista em dizer que foi destruído por um incêndio no depósito de munições, serviços de inteligência ocidentais alegam que mísseis de cruzeiro disparados pelas forças ucranianas foram responsáveis pelo afundamento da embarcação.

Kiev foi além e disse que Kuprin morreu no ataque, junto de um número incerto de marinheiros. Assim como nesta semana, a Rússia usou um vídeo para tentar desmentir a informação. O capitão, ou alguém muito parecido com ele, aparecia nas imagens junto de outros sobreviventes do ‘incêndio”, como mostra o post abaixo na rede social X, antigo Twitter, de 17 de abril. Até hoje não há uma confirmação oficial da morte do militar.

“Mistério quando o capitão “morto” Anton Kuprin do navio russo afundado apareceu no desfile de sobreviventes inspecionado pelo Chefe da Marinha”, diz o post.

O caso de Sokolov é idêntico. Na terça, um dia depois de Kiev anunciar a morte, imagens dele surgiram na TV russa. Segundo a agência Reuters, ele apareceu em uma reunião de oficias com o ministro da Defesa Sergei Shoigu. Já o jornal The Washington Post relatou a presença do almirante na emissora Zvezda News, onde conversa com repórteres sobre o desempenho das forças armadas na guerra.

“As forças de superfície, as forças submarinas, a aviação naval e as tropas costeiras estão cumprindo com sucesso as suas tarefas”, diz o almirante na entrevista à Zvezda News, que não informou a data em que as imagens foram registradas. Na mesma entrevista, o oficial cita um prêmio entregue à unidade dele pelo presidente Vladimir Putin em agosto.

Baixas de guerra

Do lado russo, são vários os fatores capazes de justificar a omissão de informação. Nos primeiros meses de conflito, Moscou sofreu perdas devastadoras entre seus oficiais de média e baixa patentes, segundo relatório divulgado em maio de 2022 pelo Ministério da Defesa do Reino Unido. Um problema para as tropas do país, afetadas pela falta de comandantes de pelotão e companhia experientes e confiáveis​.

Paralelamente, a Rússia tenta transmitir a seus cidadãos e ao resto do mundo um balanço otimista do conflito, que tem durado muito mais que o Kremlin projetava antes da invasão, com perdas de vidas e equipamento que as forças armadas russas não têm conseguido contornar.

As perdas, aliás, também podem se inseridas na campanha de desinformação e propaganda. Os números são incertos dos dois lados, e cada país divulga dados que claramente minimizam suas próprias perdas e supervalorizam as do inimigo.

O blog The Loop, da associação acadêmica Consórcio Europeu para a Investigação Política (ECPR, na sigla em inglês), analisou a questão em um post.

“Por exemplo, em 21 de setembro de 2022, o Ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, relatou 5.937 mortes de soldados russos. Na mesma semana, o Ministério da Defesa ucraniano (MoD) relatou 55.510 mortes de militares russos. Em 20 de julho de 2022, o diretor da CIA relatou cerca de 15.000 mortes russas desde a invasão”, diz o post.

Os próprios autores explicam o que está por trás da tentativa dos dois lados de controlar a narrativa. “Os números das perdas podem ser manipulados para gerir a opinião pública, para aumentar o moral das tropas e para transmitir narrativas específicas a aliados e oponentes”, dizem eles no The Loop.

Tags: