Ativista que dizia temer pela própria vida morre sob custódia policial na Rússia

Anatoly Berezikov foi preso por contestar a guerra da Ucrânia. Advogada levanta suspeita de que ele foi torturado

O ativista russo Anatoly Berezikov, que havia sido preso por protestar contra a guerra da Ucrânia, morreu sob custódia policial na quarta-feira (14), na cidade de Rostov-on-Don, no sul do país. A advogada dele, Irina Gak, levantou a suspeita de que o homem tenha morrido em função de ferimentos infligidos em sessões de tortura. As informações são do do grupo OVD-Info, que monitora a repressão estatal no país.

Na terça (13), um dia antes da morte, a advogada diz que visitou o ativista e identificou no corpo dele marcas compatíveis com as deixadas pelas armas de choque usadas pelas autoridades locais. Ele, então, contou que havia sido ameaçado pela polícia e que temia ser morto sob custódia.

No dia seguinte, ao retornar ao centro de detenção, a defensora foi informada de que Berezikov não poderia recebê-la. Então, ela viu no pátio do estabelecimento um veículo médico para o qual estava sendo levado o corpo do homem de 40 anos.

Berezikov foi preso sob a acusação de espalhar por Rostov-on-Don panfletos divulgando o grupo ucraniano I Want To Live (eu quero viver, em tradução literal), que acolhe militares russos dispostos a se render às forças ucranianas. A casa dele foi revistada pela polícia no dia 10 de maio, e na ocasião o ativista teria reclamado de que teve as costelas quebradas pela polícia.

Preso inicialmente por dez dias, não foi autorizado a voltar para casa ao fim do prazo, sendo mantido em prisão administrativa. Mais uma vez, delatou abusos por partes dos policiais, que o teriam levado para fora da cidade e o torturado com choques elétricos. Então, no dia 31 de maio recebeu mais uma ordem de prisão de 15 dias, mas morreu um dia antes do fim do prazo.

Ativista russo morto sob custódia policial diz que sofreu violência na prisão (Foto: Denny Müller/Unsplash)
Por que isso importa?

Na Rússia, protestar contra o governo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas a partir do momento em que a Justiça local passou a usar a pandemia de Covid-19 como pretexto para punir grandes manifestações, alegando que o acúmulo de pessoas feria as normas sanitárias. Assim, para driblar o veto, tornou-se comum ver manifestantes solitários erguendo cartazes com frases contra o governo.

Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro de 2022, o desafio dos opositores do presidente Vladimir Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos. Uma lei do início de março do ano passado, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das forças armadas”.

Dentro dessa severa legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 22 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, que é como o governo descreve a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.

Desde o início da guerra, a ONG reportou quase 20 mil detenções em protestos contra a guerra em todo o país. A enorme maioria dos casos, cerca de 15 mil, foi registrada no primeiro mês de guerra. Depois, houve um pico entre setembro e outubro, devido à mobilização parcial de reservistas imposta pelo governo. Entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, foram registradas somente 22 detenções, um sinal de que a repressão estatal tem funcionado.

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