Encerrado o motim do último final de semana na Rússia, o presidente Vladimir Putin voltou atrás em sua promessa de punir severamente o empresário Evgeny Prigozhin, que liderou o movimento rebelde, e os mercenários do Wagner Group que dele participaram. A ação criminal contra o antigo aliado foi retirada, e tanto ele quanto os combatentes receberam autorização para um exílio em Belarus. Tal decisão, porém, esconde uma armadilha, segundo o think tank Instituto para o Estudo da Guerra (ISW, da sigla em inglês).
“O Kremlin provavelmente considera o pessoal do Wagner Group que segue Prigozhin a Belarus como traidores, quer tome ou não uma ação imediata contra eles”, diz relatório do centro de pesquisas sediado em Washington, nos EUA.
O documento destaca que o presidente russo chegou a dizer publicamente, em um pronunciamento à nação, que respeitaria os termos do acordo que perdoou Prigozhin e os amotinados. Entretanto, alerta que “o valor de longo prazo dessa promessa, apesar do discurso de Putin, é questionável.”
O motim terminou graças à intervenção do presidente belarusso Alexander Lukashenko, daí a decisão de direcionar os rebeldes para Belarus. Entretanto, se no país vizinho à Rússia todos parecem protegidos contra eventuais tentativas de assassinato orquestradas por agentes de Moscou, não estão totalmente livres da Justiça russa
“É improvável que o pessoal do Wagner Group em Belarus permaneça a salvo das ordens de extradição russas se Putin renegá-los e acusá-los de traição”, diz o relatório. “Lukashenko entregou anteriormente 33 funcionários do Wagner detidos em Belarus a Moscou depois de usá-los como alavanca contra o Kremlin em 2020, e não há razão aparente para que ele não o faça novamente.”
Prigozhin morto?
Uma vingança de Putin, mesmo que tardia, também é a aposta do ex-agente da KGB Sergei Zhirnov, que atualmente vive refugiado na França. Em entrevista ao jornal espanhol La Vanguardia, ele disse que é uma questão de tempo até o líder russo tentar matar o inimigo, que agora surge inclusive como uma ameaça política na eleição presidencial do próximo ano.
Zhirnov fala com conhecimento de causa, pois chegou a ser entrevistado pelo presidente russo em 1980, quando Putin também era um agente da KGB. Anos depois, os dois se reencontraram no Instituto Andropov, considerado a universidade de espionagem russa.
“Putin fará tudo o que puder para fazer Prigozhin desaparecer antes de março do próximo ano”, disse o ex-espião, segundo quem Putin é um homem fraco e amedrontado, mas que faz o possível para projetar o oposto. Partindo dessa premissa, existe sim o risco de o empresário “ser eliminado, principalmente agora, porque tentou derrubar Putin” e tornou-se “o inimigo mais perigoso” do presidente da Rússia.
De acordo com Zhirnov, Putin passou a ser considerado um “perdedor”, enquanto Pirgozhin já havia ganhado a simpatia de muitos russos antes mesmo do motim. “Prigozhin é um populista. Para resumir, eu diria que é um Trump russo, um falastrão que usa uma linguagem bem floreada, direta, que explica a verdade”, analisou.
Com vistas ao pleito do próximo ano, o ex-KGB não tem dúvidas ao apontar Prigozhin como favorito caso consiga se candidatar. “As pessoas que estão muito à direita, extrema-direita, os nacionalistas russos que estão criticando Putin hoje, estão felizes com Prigozhin. Ele tem mais chances do que Putin de vencer as eleições. Se houver eleições no próximo ano e Prigozhin concorrer contra Putin, Prigozhin vencerá.”