Fontes de inteligência sugerem que Putin perdeu força entre militares e está ameaçado

Oficiais afirmam que novas tentativas de golpe tendem a ocorrer em breve, conforme cresce o isolamento do presidente

O apoio da elite das forças armadas e dos serviços de inteligência da Rússia ao presidente Vladimir Putin é cada vez menor. O isolamento dele ficou evidente no frustrado golpe encabeçado pelo Wagner Group entre 23 e 24 de junho, e é questão de tempo até que novos atores tentem colocar fim aos mais de 20 anos de reinado do líder russo. Quem diz isso são fontes das principais agências de espionagem do país e do Ministério de Assuntos Internos da Rússia, que falaram sob condição de anonimato ao site The Insider.

Segundo os informantes, a forma como se desenrolou o motim do mês passado evidenciou o isolamento de Putin, com generais ignorando a convocação para ajudar a defender o regime e agentes de segurança assustados com o avanço dos mercenários rumo a Moscou.

Uma autoridade do GRU, a inteligência militar russa, destaca a liberdade que o Wagner Group e seu líder, Evgeny Prigozhin, tiveram para marchar Rússia adentro em direção à capital. Na opinião dele, este é um sinal evidente de que figuras importantes dos serviços de inteligência e das forças armadas abandonaram Putin.

Prigozhin jamais teria ido adiante com o motim “se não tivesse entendido que haveria quem o apoiasse na direção do GRU”, diz o informante. Um dos motivos seria o esgotamento causado pela guerra da Ucrânia. “Todos no Ministério da Defesa e no governo como um todo já estão cansados ​​desta guerra e gostariam de pará-la”, acrescenta.

Putin: poder ameaçado desde o frustrado golpe orquestrado por Prigozhin (Foto: Kremlin.ru)
Generais de ressaca

Diante desse cenário, a ideia de que Putin não tem força para se sustentar na presidência pode levar a novos golpes. “Agora todos estão convencidos de como se pode tomar o poder facilmente e sem luta. Então, pode haver muitos que queiram”, disse o oficial do GRU, contando que alguns generais se negaram a agir contra o Wagner sob o argumento de que estavam de ressaca porque haviam bebido muito na noite anterior.

Um oficial da inteligência ucraniana deu a mesma versão para a evidente falta de apoio militar que Putin teve conforme os mercenários avançavam em direção a Moscou. “Ficou claro que, em primeiro lugar, no exército eles estavam totalmente despreparados para essa rebelião. Em segundo lugar, eles não fariam nada a respeito”, disse a fonte.

O ucraniano contou uma história que corrobora a versão do oficial do GRU. “Vimos um general em uma das regiões russas que recebeu uma ligação no sábado (23) e foi exigido a comparecer com urgência ao quartel-general em conexão com uma tentativa de golpe militar”, contou. “Mas ele não foi a lugar nenhum e continuou a beber. E, pelo que entendemos, tal reação foi típica.”

A expectativa por uma nova tentativa de golpe também é alta entre as agências de inteligência de outros países europeus. Uma fonte de um desses serviços afirmou que, “caso a Ucrânia seja dramaticamente bem-sucedida na contraofensiva” que está em curso para retomada de territórios, “a probabilidade de um segundo ato (contra Putin) aumenta. Pode ter um elenco diferente, mas a cena está montada.”

Uma fonte do FSB, principal serviço de segurança doméstica e sucessor da KGB, destaca que nem mesmo as forças especiais russas, as Spetsnaz, reagiram ao pretenso golpe de Estado. E questiona o fato de que os mais importantes membros da tropa de elite tenham sido enviados dois dias antes para longe de Putin, com a missão de proteger a sede do FSB.

“Por alguma razão, dois dias antes da rebelião, a unidade Alpha foi transferida para Lubyanka”, disse o informante, acrescentando, no entanto, que “não está claro” se realmente existe uma relação entre o sumiço das Spetsnaz e o motim dois dias depois.

De acordo com um funcionário do Ministério de Assuntos Internos da Rússia, o sentimento entre os agentes de segurança em meio ao motim era de pavor, o que ajuda a explicar por que militares e policiais não mostraram resistência ao avanço dos mercenários.

Ele relata que diversos oficiais receberam ordens para que seus homens fossem colocados na rua em Moscou, mas todos simplesmente se recusaram a obedecer.

O destino de Prigozhin

Diante desse cenário, uma questão continua difícil de ser compreendida. Por que Prigozhin interrompeu a marcha rumo a Moscou quando a vitória parecia certa? “Ele teve a situação mais bem-sucedida possível. Não houve resistência. Por que ele parou ninguém sabe ao certo”, afirmou a fonte do FSB.

O informante sugere inclusive que o líder do Wagner Group não se acovardou após o fim do motim, mesmo frente à possibilidade de ser morto por traição. Tanto que o filho dele, Pavel, chegou a ameaçar os agentes de segurança que fizeram, sob ordem judicial, uma busca na empresa de Prigozhin um dia após o motim.

“Ele (Pavel) disse pessoalmente aos agentes do FSB: ‘Vou me lembrar de você’. Ele os ameaçou”, disse a fonte do FSB. “Então, os contadores da empresa foram presos. Mas todos foram finalmente liberados.”

Atualmente, o paradeiro de Prigozhin é incerto. Ele chegou a se reunir com Putin em São Petesburgo e era aguardado em Belarus, onde deveria passar a viver como parte do acordo que encerrou o motim, negociado pelo presidente belarusso Alexander Lukashenko. Fato é que ele sobreviveu ao motim, embora isso possa mudar em breve. Afinal, matar o líder do levante pode ser a melhor forma de o presidente russo sustentar seu regime.

“Durante a rebelião, foi difícil para Putin matar Prigozhin simplesmente porque ele não tinha capital político suficiente para lidar facilmente com um homem que ganhou certo nível de popularidade devido à sua retórica de ‘buscador da verdade'”, disse o oficial do GRU. “Mas, depois de algum tempo, Putin pode muito bem punir Prigozhin para enviar um sinal para o resto. Então, se eu fosse ele, não sairia para a varanda em um futuro próximo.”

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