Jornalista russa que noticiou o ataque ao teatro de Mariupol pega seis anos de prisão

Maria Ponomarenko está presa desde abril de 2022 e diz que chegou a tentar o suicídio, tendo inclusive passado por um hospital psiquiátrico

A Justiça da Rússia sentenciou a seis anos de prisão a jornalista Maria Ponomarenko, sob a acusação de divulgar informações “falsas” sobre a guerra na Ucrânia. Ela está presa desde abril de 2022, após noticiar o bombardeio a um teatro da cidade ucraniana de Mariupol. As informações são do jornal independente The Moscow Times.

Ponomarenko trabalhava para o site RusNews quando as tropas de Moscou foram acusadas de realizar o ataque aéreo que atingiu um teatro que abrigava civis em Mairupol, na região de Donetsk, no leste da Ucrânia, no dia 16 de março de 2022. O número de mortos até hoje é incerto, e o Kremlin nega que tenha sido responsável pelo bombardeio.

Presa desde então, a jornalista chegou a ser internada em um hospital psiquiátrico. Em setembro do ano passado, durante uma audiência, ela revelou ainda que chegou a tentar o suicídio. À época, alegou que sofre de depressão e claustrofobia e que, por isso, precisaria ser transferida para a prisão domiciliar. Mãe de duas meninas, teve o pedido negado e foi mantida na prisão.

Teatro de Mariupol abrigava mulheres e crianças e foi bombardeado (Foto: Ukraine Now/Telegram)

No julgamento realizado nesta semana, a promotoria pediu que uma pena de nove anos de prisão fosse imposta à acusada, com o juiz a sentenciando a seis anos. Além disso, Ponomarenko foi proibida de exercer o trabalho jornalístico pelos próximos cinco anos.

“Basta abrir a Constituição e lê-la para provar minha inocência”, disse a jornalista em seu depoimento final ao tribunal na terça-feira (14). “Nenhum regime totalitário jamais foi tão forte quanto antes de seu colapso”, acrescentou em tom desafiador, dando a entender que o regime de Vladimir Putin está perto do fim.

Centenas de mortos

O ataque ao teatro de Mariupol foi o primeiro episódio de repercussão global a gerar acusações de crimes de guerra contra Moscou no conflito em curso na Ucrânia, iniciado em 24 de fevereiro do ano passado. O número de mortos, porém, ainda é incerto.

Inicialmente, falou-se em cerca de 300 mortos no local, que sabidamente abrigava civis, inclusive mulheres grávidas e crianças. A estimativa é de que cerca de 1,2 mil pessoas estavam escondidas ali dentro. Uma investigação posterior da agência Associated Press sugeriu que o número de mortos se aproxima de 600.

Em julho do ano passado, a organização humanitária Anistia Internacional classificou o episódio como crime de guerra, mas fez um cálculo diferente quanto ao número de vítimas. “Não está claro exatamente quantas pessoas foram mortas, mas é provável que a contagem seja muito menor do que o informado anteriormente”.

Por que isso importa?

Na Rússia, posicionar-se contra o governo já era perigoso antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro, a ameaça aos opositores do presidente Vladimir Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos.

Uma lei do início de março de 2022, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das forças armadas”. Dentro dessa severa nova legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 22 mil), com penas de prisão de até 15 anos.

A pena mais rigorosa da legislação é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, que é como o governo descreve a guerra.

Desde o início do conflito, a ONG OVD-Info, que monitora a repressão estatal na Rússia, reporta mais de 19,5 mil detenções em protestos contra a guerra em todo o país, com 400 pessoas levadas ao tribunal para responder criminalmente por seus atos.

A enorme maioria dos casos, cerca de 15 mil, foi registrada no primeiro mês de guerra. Depois, houve um pico entre setembro e outubro de 2022, devido ao recrutamento de cidadãos anunciado por Putin. Entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, foram registradas somente 22 detenções, sinal de que a repressão estatal tem funcionado.

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