Países europeus, inclusive da Otan, ignoram os riscos e investem pesado em câmeras chinesas

Equipamentos de vigilância, suspeitos de enviar dados sigilosos a Beijing, são encontrados até em instalações militares da Romênia

Nos últimos anos, governos ocidentais têm imposto diversas barreiras ao uso, sobretudo por entidades estatais, de tecnologia chinesa. Argumentam que, sob a Lei de Inteligência Nacional da China, empresas do país podem ser forçadas a entregar a Beijing os dados obtidos por seus equipamentos. Câmeras de vigilância estão entre os principais alvos desse escrutínio, mas ainda assim há muitos países que ignoram a ameaça e investem pesado na compra desses artigos. Inclusive integrantes da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), como mostra uma reportagem da rede Radio Free Europe (RFE).

Duas empresas chinesas em particular marcam forte presença na Europa atualmente com suas câmeras de vigilância: Dahua e Hikvision. Elas dominam o mercado inclusive em nações da Otan, casos de Hungria, Romênia e Bulgária, bem como em Sérvia, Moldávia, Bósnia e Herzegovina, Kosovo e Geórgia. Até a Ucrânia, que vê na China um aliado crucial da Rússia em meio à guerra entre as duas nações europeias, aposta pesado nos produtos chineses.

Câmera da Hikvision: presença marcante na Europa, inclusive em países da Otan (Foto: WikiCommons)

A posição dessas nações europeias contrasta com a desconfiança de nações como EUA, Austrália e Reino Unido, onde artigos tecnológicos chineses são vistoso com crescente desconfiança. Em fevereiro de 2023, o ministro da Defesa australiano, Richard Marles, anunciou a remoção de câmeras chinesas após uma editoria indicar que havia 900 delas em escritórios diversos do departamento.

Washington, por sua vez, sancionou a Hikvision por suspeitar que os equipamentos da empresa sejam utilizados com fins de espionagem, além de acusar a empresa de fornecer aparelhos que facilitam a detenção de uigures em Xinjiang. Já Londres determinou, no fim de 2022, que os departamentos governamentais parassem de usar câmeras fabricadas na China em “locais sensíveis” do país. 

Na Europa Oriental e Central, entretanto, não há qualquer restrição aos aparelhos fabricados na China. A RFE apurou que a Ucrânia, por exemplo, tem “centenas de milhares” de câmeras chinesas em diversas cidades, enquanto a Hungria, que mantém relação cada vez mais próxima com Beijing e Moscou, tem mais de 21 mil desses equipamentos espalhados por todo seu território.

Quem também é próximo de russos e chineses é o governo da Sérvia, que somente em 2023 gastou o equivalente US$ 5,8 milhões em câmeras chinesas de vigilância. Geralmente, empresas privadas são responsáveis pela aquisição, mas o produto invariavelmente é repassados ao governo depois.

Em 2021, quando as câmeras começavam a se propagar pela Sérvia, ativistas pelos direitos digitais levantaram a hipótese de que elas faziam parte de um grande projeto governamental de vigilância da população. O equipamento questionado havia sido fornecido pela gigante chinesa de tecnologia Huawei, um dos principais alvos de desconfiança global devido à proximidade da empresa com Beijing.

No Kosovo, a presença de equipamentos de vigilância chineses também está ligada à boa relação entre Sérvia e China. Assim, diversos edifícios governamentais kosovares contam com aparelhos da Dahua e da Hikvision, adquiridos por autoridades de regiões do país controladas por sérvios e que estão fora do controle do governo central.

O caso da Romênia, membro da Otan, é de especial preocupação para o Ocidente, pois ao menos 28 instalações militares contam com câmeras chinesas. Se confirmados os temores ocidentais de que Beijing tem acesso aos registros feitos pelo equipamento, o governo da China conta com uma importante fonte de informações.

Um relatório de 2021 indica que a Romênia tinha na ocasião mais de 189 mil câmeras chinesas da Dahua e da Hikvision. O governo local se defende argumentando que todas elas são mantidas offline, evitando assim o risco de extração de dados pelas empresas e eventual entrega ao Partido Comunista Chinês (PCC).

Na Hungria não existe dados sobre o número de câmeras chinesas espalhadas pelo país, mas um contrato de 2018, avaliado em US$ 45 milhões, previa a compra de equipamentos de vigilância chineses pelo governo. A situação é semelhante na Geórgia, que igualmente não dispõe de uma estatística oficial, mas em 2023 comprou ao menos dez mil câmeras da China. Dados alfandegários sugerem que 80% das câmeras de vigilância georgianas são provenientes da China.

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