População carcerária russa caiu drasticamente durante recrutamento, aponta pesquisa

Levantamento mostra mais de 17 mil casos documentados de condenados que saíram da cadeia em 2022, mais que o dobro do ano anterior

As prisões de 35 regiões russas perderam ao menos 17.248 presos no ano passado, uma redução da população carcerária duas vezes maior que a do ano anterior, 2021. Esses altos números, que são apenas parciais, tendem a ser explicados também pelo recrutamento de presos pelo Wagner Group, organização paramilitar privada que atua a serviço da Rússia na guerra da Ucrânia. As informações são do site independente Mediazona.

Os dados foram obtidos com base em balanços regionais de redução da população carcerária, vez que os dados nacionais foram bloqueados por Moscou. Como a reportagem teve acesso aos números de apenas 35 das 83 regiões russas reconhecidas internacionalmente, os números de todo o país no ano passado tendem a ser bem maiores.

O próprio governo chegou a anunciar números incrivelmente mais altos antes de suspender a divulgação dos dados. No último balanço anunciado, em janeiro deste ano, o sistema carcerário russo havia perdido 33 mil presos em 2022, incluídos aí os casos registrados antes do recrutamento.

Considerando somente o período em que o Wagner buscou nas colônias penais novos combatentes, os dados do governo apontam que 23 mil condenados haviam deixado as prisões russas no ano passado. Porém, o Mediazona só conseguiu confirmar, através de documentos, cerca de 17 mil desses casos.

Imagem meramente ilustrativa mostra prisão Statsi, em Berlim, notória por casos de tortura física e psicológica (Foto: Matthew Ansley/Unsplash)

O recrutamento de presos foi uma alternativa encontrada pelo Wagner Group para driblar a falta de combatentes gerada sobretudo pelo elevado número de baixas na guerra. Os condenados recebiam a promessa de perdão por seus crimes em troca de seis meses de serviço paramilitar, o que ajudou a organização a obter mão de obra abundante.

Evgeny Prigozhin, importante aliado do presidente russo Vladimir Putin e chefe da organização de mercenário, foi pessoalmente a alguns dos presídios oferecer anistia em troca de serviço paramilitar.

Em setembro do ano passado, um vídeo compartilhado através do aplicativo de mensagens Telegram pela equipe do oposicionista russo Alexei Navalny mostrou um indivíduo que se parece fisicamente com o empresário supostamente recrutando os criminosos.

No vídeo, o homem fala a um grande grupo de presos, todos com uniformes escuros. Ele se apresenta como membro da organização paramilitar Wagner Group e explica as condições que devem ser atendidas para o recrutamento. O contrato é para seis meses de serviços no campo de batalhas. Entre os avisos, ele diz que desertores seriam fuzilados.

Então, em fevereiro deste ano, Prigozhin informou que o recrutamento havia se encerrado e que o Wagner Group “cumpre as obrigações” prometidas aos presos libertos. Entretanto, não faltam denúncias de abusos praticados pela organização contra os criminosos que resolveram se juntar a ela.

Em dezembro do ano passado, o Ministério da Defesa do Reino Unido publicou balanço de inteligência dizendo que combatentes recrutados nos presídios russos são levados à Ucrânia para atuar na linha de frente e assim reduzir o risco à vida dos membros mais experientes do Wagner Group. Também há casos relatados de execuções sumárias contra indivíduos que não cumprem ordens de superiores, exatamente como advertiu Prigozhin.

Para se ter ideia de como a população carcerária foi reduzida durante o recrutamento, uma fonte que pediu anonimato disse que mil presos foram recrutados somente em uma das colônias penais da região de Tula. As estatística coletadas confirmam isso, como uma queda no número de presos de 6,4 mil para 5,5 mil na prisão citada.

Apesar do fim do recrutamento anunciado por Prigozhin, o Mediazona diz que a realidade é diferente e o recrutamento continua. Já os 17.248 casos documentados representam apenas uma projeção, vez que “é impossível estimar quantos condenados foram levados para a guerra nos últimos meses”.

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