Portugal é país pioneiro na Europa em proibir a mineração no fundo do mar

Nova lei portuguesa estabelece moratória sobre atividade mineira em águas profundas do processo para os ecossistemas e a pesca

Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News

Portugal deu um passo determinante na proteção dos oceanos ao aprovar a primeira lei europeia que estabelece uma moratória sobre a mineração no fundo do mar.

A medida, que proíbe a exploração de minérios em águas profundas até 2050, responde às preocupações ambientais e às reivindicações de cientistas e organizações de defesa dos oceanos.

Em letra de lei

A aprovação desta legislação coloca Portugal na vanguarda da proteção marinha, numa altura em que a comunidade internacional debate os impactos da mineração submarina nos ecossistemas.

Tiago Pitta e Cunha, presidente da Fundação Oceano Azul, destacou a importância da decisão. “Portugal é o primeiro país a aprovar em letra de lei, ou seja, é a primeira lei europeia que estipula uma moratória até 2050 para a exploração mineira. Isso é relevante também porque a lei tem um grau hierárquico mais relevante, superior, à da resolução parlamentar. Ou seja, uma lei só pode ser alterada por outra lei”, afirmou em entrevista à ONU News.

A promulgação da lei pelo presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, garante que a posição do país sobre a mineração submarina não poderá ser revertida sem novo debate parlamentar.

“Portugal está neste momento numa crise política, vai haver eleições, e eu tenho a certeza que o próximo governo, seja ele qual for, não vai poder mudar a posição do país relativamente à moratória para a mineração submarina, porque ela só pode ser alterada por lei do parlamento”, explicou Pitta e Cunha. Ele destacou ainda que essa estabilidade legislativa é crucial, uma vez que Portugal teve três governos nos últimos três anos.

O que acontece no mar não fica no mar

Os riscos ambientais da mineração em alto-mar estão amplamente estudados e identificados. Estudos científicos indicam que o fundo do mar desempenha um papel fundamental na regulação do clima e na absorção de carbono.

“O que acontece no fundo do mar não fica no fundo do mar, tem repercussões negativas não apenas na coluna de água, mas em todo o sistema oceânico”, alerta Pitta e Cunha.

A exploração mineral pode causar distúrbios significativos nos sedimentos marinhos, que acumulam calor e ajudam a regular o aquecimento global. Além disso, perturbar essas camadas pode liberar grandes quantidades de carbono armazenado, agravando ainda mais a crise climática.

Contaminação na pesca

A contaminação da coluna de água também representa uma preocupação para a pesca e a segurança alimentar. “Para além do distúrbio dos sedimentos do fundo e do desaparecimento da biodiversidade, há uma pluma de sedimentos que contamina a coluna de água de uma forma absolutamente gigante”, afetando 20% da proteína que os humanos consomem no planeta.

Portugal na defesa dos oceanos

Portugal tem-se destacado internacionalmente na defesa dos oceanos. “Portugal realizou a maior conferência sobre oceanos do planeta, a Conferência da ONU em 2022, em que foi coanfitrião com o Quênia e que impulsionou num grande progresso da agenda multilateral do oceano”, explicou Pitta e Cunha. Segundo o presidente da Fundação Oceano Azul, nos últimos três anos tomaram-se mais decisões sobre a proteção marinha do que nos 30 anos anteriores.

O fundo do mar (Foto: hallie heeg/Unsplash)

Apesar desse avanço, Portugal ainda enfrenta desafios na formulação de uma política externa para os oceanos. “Portugal não tem uma verdadeira política externa para o oceano, e, sem isso, Portugal não tem os mecanismos para influenciar decisões de outros estados-membros”, alertou Pitta e Cunha.

Mesmo assim, o especialista defende que a nova lei fortalece a posição do país como um líder global na proteção dos oceanos, podendo incentivar outras nações a adotar medidas semelhantes.

Impacto internacional

A decisão portuguesa gera impacto nas discussões internacionais, especialmente no âmbito da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), organismo da ONU responsável pela regulamentação da mineração submarina em águas internacionais.

A ISA tem sido pressionada por governos, cientistas e organizações ambientais para impor uma moratória global à mineração no fundo do mar, mas enfrenta resistência de alguns países e empresas interessadas na exploração desses recursos.

A posição de Portugal pode fortalecer esse movimento e contribuir para um debate mais amplo sobre a necessidade de proteger os ecossistemas marinhos.

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