O referendo de reforma constitucional na Rússia foi aprovado por 78% dos eleitores, que foram às urnas entre 25 de junho e 1 de julho. Apenas uma região do país se opôs, com 55,25% das pessoas votando não: Nenets, no extremo norte do país, a menor unidade da federação russa.
A região é banhada pelo Mar de Barents e tem cerca de 45 mil habitantes. Destes, 22 mil participaram da votação e 12 mil optaram pelo não.
Entre as mudanças, a mais significativa era a possibilidade de extensão dos mandatos do presidente até 2036. Isso significa que o presidente Vladimir Putin, no poder desde 1999, poderia permanecer até seus 83 anos.
Contexto local
Em Nenets, pesou a possibilidade de uma fusão com a região vizinha, muito maior, de Arkhangelsk. Antes da pandemia, havia um referendo marcado para 13 de setembro de 2020. Agora, a consulta deve acontecer em 2021.
A meta dos eleitores do inóspito território era a de chamar a atenção de Moscou para uma negativa nessa fusão.
De acordo com eleitores da região, consultados pela Reuters, o voto pelo não foi um protesto. Há manifestações em Nenets desde o anúncio da fusão, em maio.
Embora Putin só tenha perdido em Nenets, outras regiões mais periféricas do país foram também refratárias à mudança. Entre elas Yakutia, Khaborovsk e Kamchatka, todas no extremo leste do país, onde a rejeição foi de cerca de 40%.
A Radio Free Europe observou que, na imprensa ligada ao governo, a mensagem era a de “não dramatizar a situação”.
Já na Chechênia, região no Cáucaso palco de violentos conflitos separatistas, as mudanças de Putin foram aprovadas por 97% dos eleitores.
Acusações de ONGs de que houve fraude no processo foram classificadas como “informação falsa, fake” pela presidente da Comissão Eleitoral da Rússia, Ella Pamfilova. “Vamos lutar contra todas elas”, afirmou.
Teatro eleitoral
Na reforma constitucional, foi aprovado pelos eleitores russos o banimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Também graças à consulta, agora, a “crença em Deus” é um valor nacional fundamental e o russo é a “língua da etnia formadora do Estado”.
O texto aprovado inclui sobre questões sobre previdência, animais e a “memória dos russos mortos na II Guerra”, observou o jornal norte-americano “The New York Times“. No pleito, ou o eleitor aprovava todas as mudanças, ou nenhuma delas.
De acordo com fontes consultadas pelo jornal, trata-se de uma estratégia para manter o apoio da população em alta. “É teatro, mas um teatro importante e bem feito”, afirmou o cientista político Greg Yudin ao NYT.
O pota-voz do Kremlin Dmitry Peskov já avisou que o governo não levará em consideração “supostas preocupações a respeito da votação”, segundo a agência de notícias oficial Tass.
A declaração vem na esteira de críticas da União Europeia em relação à mudança constitucional. O porta-voz de política externa do bloco, Peter Stano, afirmou esperar que “a Rússia cumpra com suas obrigações internacionais”.