Rússia ‘homenageia’ Bonnie e Clyde durante a celebração do Dia da Vitória

Casal de criminosos surgiu por engano em transmissão do Canal Um, um dos principais meios de propaganda estatal de Putin

A TV estatal russa Canal Um mostrou uma imagem de Bonnie e Clyde durante a transmissão ao vivo de um concerto alusivo ao Dia da Vitória, data celebrada em 9 de maio que lembra o triunfo sobre os nazistas no fim da Segunda Guerra Mundial. A icônica dupla de criminosos que abalou os EUA nos anos 1930 apareceu em um telão durante a exibição de uma galeria de fotografias de supostos casais soviéticos separados em consequência do conflito. As informações são do think tank Atlantic Council.

A inusitada aparição de Bonnie e Clyde ocorreu em meio a uma apresentação musical, em que uma intérprete russa cantava uma música chamada ‘Se Não houvesse Guerra’, que fala do sofrimento de uma mulher distante do seu amado por causa de uma luta armada.

Bonnie e Clyde no telão durante uma apresentação musical (Foto: Channel One/Captura de tela)

Não demorou para usuários de redes sociais identificarem o casal de “inimigos públicos” que cometeu inúmeros assaltos durante a Grande Depressão norte-americana. A fotografia mostrada pode ser encontrada no perfil da Wikipédia dedicado aos famosos assaltantes, mortos pela polícia dos EUA em maio de 1934 – cinco anos antes do início da guerra.

Mais tarde, o canal tentou maquiar o erro ao reeditar a versão online do show. O Laboratório de Pesquisa Forense Digital (DFRLab, da sigla em inglês) do Atlantic Council comparou a filmagem da transmissão ao vivo com o material postado posteriormente no site do Canal Um com o evento já encerrado e constatou a edição. A fotografia de Bonnie e Clyde ainda pode ser vista, porém, mais distante e mais rapidamente.

No Twitter e Reddit, usuários discutiram se a aparição do casal de criminosos dos EUA, durante evento tão simbólico para o Kremlin, teria sido mesmo um erro ou um ato de desafio ao presidente Vladimir Putin.

A maioria dos veículos estatais e pró-Kremlin não repercutiu o incidente. Mas os poucos que se manifestaram alegaram que o episódio foi fruto de uma “sabotagem”, executada com o objetivo de constranger a emissora. De acordo com o portal rosbalt.ru, financiado pelo governo russo, a emissora declarou em comunicado que “só transmitiu o show e não tinha nada a ver com sua produção”.

Não chega a ser um fato novo para a mídia russa o uso incorreto de imagens. Em 2017, o Ministério da Defesa divulgou capturas de tela de um jogo de videogame, afirmando que se tratava de uma “evidência irrefutável” de que os Estados Unidos tinham uma aliança com a organização extremista Estado Islâmico (EI).

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho, no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo an. Aquele conflito foi usado por Vladimir Putin como argumento para justificar a invasão integral, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país.

No início da ofensiva, o objetivo das forças russas era dominar Kiev, alvo de constantes bombardeios. Entretanto, diante da inesperada resistência ucraniana, a Rússia foi forçada a mudar sua estratégia. As tropas, então, começaram a se afastar de Kiev e a se concentrar mais no leste ucraniano, a fim de tentar assumir definitivamente o controle de Donbass e de outros locais estratégicos naquela região.

Em meio ao conflito, o governo da Ucrânia e as nações ocidentais passaram a acusar Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, dando início a investigações de crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos pelos soldados do Kremlin.

O episódio que mais pesou para as acusações foi o massacre de Bucha, cidade ucraniana em cujas ruas foram encontrados dezenas de corpos após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.

O jornal The New York Times realizou uma investigação com base em imagens de satélite e associou as mortes em Bucha a tropas russas. As fotos mostram objetos de tamanho compatível com um corpo humano na rua Yablonska, entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.

Fora do campo de batalha, a Rússia tem sido alvo de todo tipo de sanções. As esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais já começaram a sufocar a economia russa, e o país tem se tornado um pária global. Desde a invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro, mais de 600 empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral.

Os mortos de Putin

Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.

Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.

A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.

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