Rússia recebeu informações capazes de impedir ataque terrorista, mas falhou

EUA teriam inclusive dito a Moscou que o alvo dos extremistas seria o Crocus City Hall, onde efetivamente ocorreu o atentado

A Rússia não recebeu um, mas sim dois alertas, de países diferentes, antes do ataque terrorista que matou 144 pessoas em uma casa de espetáculos em Moscou em 22 de março. E eles continham informações suficientes para que as forças de segurança conseguissem impedir a ação dos radicais. Ainda assim, falharam.

Um dos alertas de segurança foi dado pelos EUA. Já no início do mês passado ficou claro que o governo norte-americano tinha informações importantes, com a embaixada em Moscou emitindo um aviso a seus cidadãos para o risco de atentados na capital russa.

“A Embaixada está monitorando relatos de que os extremistas têm planos iminentes de visar grandes reuniões em Moscou, incluindo concertos, e os cidadãos dos EUA devem ser aconselhados a evitar grandes reuniões durante as próximas 48 horas”, disse a diplomacia norte-americana em 7 de março.

Ataque terrorista no Crocus City Hall, em Moscou (Foto: WikiCommons)

O presidente russo Vladimir Putin chegou a criticar a manifestação da embaixada, sugerindo se tratar de uma campanha de desinformação. “Permitam-me também recordar as recentes declarações provocativas de uma série de estruturas oficiais ocidentais sobre a possibilidade de ataques terroristas na Rússia. Tudo isto se assemelha a uma chantagem aberta e a uma intenção de intimidar e desestabilizar nossa sociedade”, disse ele em 19 de março, segundo a agência estatal Tass.

Mas não ficou nisso. Um aviso mais específico foi emitido posteriormente em contato entre os dois governos. Autoridades norte-americanas ouvidas pelo jornal The Washington Post afirmaram, sob condição de anonimato, que Washington informou a Moscou que o alvo dos extremistas seria o Crocus City Hall, onde efetivamente ocorreu o atentado que matou 144 pessoas.

Apesar da falha evidente na segurança, Sergei Naryshkin, chefe do Serviço de Inteligência Estrangeira da Rússia, disse que seu governo “tomou medidas apropriadas para prevenir” o ataque. E contestou a precisão do alerta norte-americano, dizendo que ele foi, na verdade, “muito genérico e não nos permitia identificar completamente aqueles que cometeram este crime terrível.”

Aí surge um novo relato, do site investigativo Dossie Center. Uma fonte dos serviços de segurança, cuja identidade foi mantida em segredo, confirmou que o governo tinha informações sobre o planejamento de um atentado na capital russa. E sabia que ele vinha sendo tramado por cidadãos do Tadjiquistão, de fato a nacionalidade dos autores da matança em nome do Estado Islâmico-Khorasan (EI-K).

Se o fato de os EUA serem um rival pode ter de alguma forma desencorajado uma prevenção mais eficiente por parte de Moscou, o mesmo não se pode dizer do Irã, aliado da Rússia e que também foi alvo de um atentado realizado pelo EI-K recentemente, com mais de cem mortos. A agência Reuters revelou que também Teerã alertou Moscou.

“Dias antes do ataque na Rússia, Teerã compartilhou informações com Moscou sobre um possível grande ataque terrorista dentro da Rússia, que foi obtido durante interrogatórios de pessoas presas em conexão com atentados mortais no Irã”, disse uma fonte, citando justamente extremistas detidos após o episódio de 3 de janeiro, quando duas explosões ocorreram durante uma procissão em homenagem ao general iraniano Qassem Soleimani.

O ataque em Moscou

O ataque de 22 de fevereiro foi perpetrado por quatro cidadãos do Tadjiquistão, que entraram no Crocus City Hall com rifles automáticos e dispararam a esmo. Ao tiroteio se seguiu um grande incêndio que destruiu parcialmente a casa de espetáculos, onde aconteceria o show da banda Picnic, bastante popular nos tempos de União Soviética.

O atentado foi reivindicado pelo EI-K, atualmente a mais violenta das facções do Estado Islâmico (EI) do Iraque e da Síria. Originário do Afeganistão, o grupo vê a Rússia como um inimigo por razões diversas. Na guerra civil síria, Moscou apoia o presidente Bashar al-Assad, que tem no EI um inimigo. As tropas russas inclusive realizaram bombardeios contra posições rebeldes, matando um bom número de jihadistas.

Também pesa para a hostilidade a proximidade entre o governo russo e o Taleban, ampliada desde que este assumiu efetivamente o governo do Afeganistão, em agosto de 2021, depois da saída da tropas estrangeiras. No país do Oriente Médio, os talibãs são tratados como inimigos pelo EI-K, que tem neles o principal alvo de seus ataques.

Após o atentado, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Taleban, Abdul Qahar Balkhi, usou a rede social X, antigo Twitter, para oferecer condolências. “O Ministério condena nos termos mais veementes o recente ataque terrorista em Moscou, na Rússia, reivindicado pelo Daesh (sigla em árabe usada para se referir ao Estado Islâmico) e o considera uma violação flagrante de todos os padrões humanos.”

Tags: