Russo é multado após reagir com ‘emoji triste’ em post antiguerra nas rede sociais

Aleksei Argunov, professor na Sibéria, terá de desembolsar uma boa quantia de rublos após contrariar o Kremlin com as famosas carinhas amarelas

Uma lei assinada por Vladimir Putin no início de março aplica pesadas multas quem “desacredita o uso das forças armadas”, que podem chegar a 300 mil rublos (R$ 16,9 mil). Após inúmeras condenações, nesta segunda-feira (25) surgiu a notícia de um precedente extremo aberto na nova legislação, criada especialmente para os tempos de conflito: um homem foi autuado em 30 mil rublos (cerca de R$ 2,8 mil) por reagir com emojis a publicações antiguerra na internet. As informações são da rede Radio Free Europe.

O professor Aleksei Argunov, que vive na Sibéria, contou à reportagem que a multa se originou em um emoji triste que ele deixou na caixa de comentários de um post nas redes sociais. A publicação falava sobre a condenação de um político que se posicionou com contrariedade à invasão, declarando que “doía ver russos matando ucranianos e ucranianos sendo forçados a matar russos”.

Aleksei Argunov (Foto: Facebook)

Não parou por aí. Argunov ainda teve problemas com um emoji de aprovação que usou para comentar um vídeo publicado no canal de YouTube do ator Arnold Schwarzenegger, no qual o astro pede a Putin o fim dos ataques das tropas russas na Ucrânia.

“A própria polícia entendeu que era estúpido redigir as acusações”, disse o professor, que leciona filosofia e história na cidade de Barnaul. Até o momento, ele é o primeiro russo de que se tem notícia condenado por um tribunal local pelo uso das icônicas carinhas amarelas.

Embora a repressão estatal não seja novidade, desde 24 de fevereiro, data que marca o início do conflito, Moscou vem reprimindo qualquer expressão pública que esteja em desacordo com a narrativa oficial, que é de “missão de paz”.

Por que isso importa?

Na Rússia, protestar contra o governo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas desde que o governo passou a usar a pandemia de Covid-19 como argumento para punir grandes manifestações, sob a alegação de que o acúmulo de pessoas fere as normas sanitárias. Assim, tornou-se comum ver pessoas solitárias erguendo cartazes com frases contra o governo.

Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro, o desafio dos opositores do presidente Vladimir Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos. Uma lei do início de março, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das forças armadas”.

Dentro dessa severa nova legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 16,9 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, que é como o governo descreve a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.

Apesar dos riscos, muitos russos enfrentam a repressão e a possibilidade de serem presos e protestam de diversas maneiras para deixar clara sua oposição ao conflito.

Em Moscou, no dia 15 de março, ignorando todos esses riscos, uma mulher escolheu como ponto de protesto a Catedral do Cristo Salvador. Em um cartaz, reproduziu o sexto mandamento segundo a Igreja Ortodoxa: “Não matarás”. Outra mulher desafiou a censura e se posicionou em uma esquina próxima do Kremlin com um cartaz que dizia “Não à guerra”. Ambas foram retiradas por policiais e colocadas em um camburão menos de dez minutos depois de exibirem os cartazes.

Artista russa é presa por protestar contra a guerra nas etiquetas de preços
Jovem russa exibe cartaz com a frase “não matarás” em protesto antiguerra (Foto: reprodução/Twitter)

Yevgenia Isayeva, uma artista e ativista da cidade russa de São Petesburgo, optou por um protesto mais gráfico no dia 27 de março. Com um vestido branco, ela se posicionou em frente à prefeitura da cidade e, então, despejou tinta vermelha sobre a roupa, enquanto dizia repetidamente: “Meu coração sangra, meu coração sangra…”. Também teve poucos minutos para se manifestar antes de ser retirada à força.

Há, ainda, os manifestantes que querem deixar sua mensagens sem expor a própria imagem. Casos dos grafiteiros que têm feito surgir nos muros de cidades russas mensagens antiguerra. Também em 27 de março, dois homens foram presos na cidade de Tula, no sul do país, acusados de grafitar mensagens como “Derrubem Putin” e “Parem Putin”.

Coletivamente, um jeito diferente de protestar tem sido através de mensagens escritas em cédulas e moedas de rublos. O fenômeno passou a ser compartilhado em plataformas como TwitterTelegram e Reddit. As mensagens são normalmente escritas à mão, sendo as frases mais comuns “não à guerra” e “russos contra a guerra”.

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