Em meio a protestos, autoridade sugere que o Irã aboliu a ‘polícia da moralidade’

Procurador-geral diz que "a mesma autoridade que estabeleceu esta polícia a desligou", mas governo alega que ele foi "mal interpretado"

Informações desencontradas têm surgido no Irã quanto ao futuro da “polícia da moralidade”, que foi responsabilizada pela morte da jovem Mahsa Amini em setembro, dando início aos protestos populares que ainda hoje tomam as ruas do país. Uma declaração dada pelo procurador-geral Mohammad Jafar Montazeri gerou a especulação de que o órgão seria abolido, segundo a revista Newsweek.

De acordo com Montazeri, “a mesma autoridade que estabeleceu esta polícia a desligou”, disse ele, em declarações reproduzidas por agências de notícias estatais iranianas. E complementou: “A polícia da moralidade não tem nada a ver com o Judiciário”.

Apesar da alegação da autoridade, a informação carece de confirmação independente, bem como de um aval de Teerã. O procurador-geral foi além e indicou que o governo vai revisar a lei que exige o uso do hijab pelas mulheres, justamente o que levou à detenção de Amini.

Montazeri afirmou que “tanto o parlamento quanto o judiciário estão trabalhando” para avaliar se é necessário modificar a lei que obriga as mulheres a cobrirem a cabeça em público.

Entretanto, de acordo com a rede BBC, há dúvidas quanto à precisão das informações fornecidas pelo representante do Judiciário. O governo, além de não confirmar oficialmente a abolição da entidade, disse que as declarações foram “mal interpretadas”.

De acordo com a TV estatal iraniana, uma possível interpretação para as declarações de Montazeri é a de que as ações da “polícia da moralidade” simplesmente não estão relacionadas ao Judiciário, que assim se isentaria de responsabilidade em casos como o da jovem morta em setembro.

Em Estocolmo, na Suécia, cidadãos protestam contra a repressão no Irã (Foto: Artin Bakhan/Unsplash)
Por que isso importa?

Nos últimos meses, protestos populares tomaram as ruas do Irã após a morte de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos que visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela “polícia da moralidade” por não usar “corretamente” o hijab, o véu obrigatório para as mulheres. Sob custódia, ela desmaiou, entrou em coma e morreu três dias depois.

Os protestos começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica. As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de dezenas de mortes.

No início de outubro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

De acordo com a entidade, em ao menos 13 cidades do Irã foram registrados casos de uso de força excessiva ou letal. O relatório cita vídeos divulgados na internet que mostram agentes estatais usando rifles, espingardas e revólveres indiscriminadamente contra a multidão, “matando e ferindo centenas”.

Já a ONG de Direitos Humanos do Irã (IHRNGO) anunciou no dia 22 de novembro que ao menos 416 pessoas haviam morrido até então devido à violenta repressão aos protestos imposta pelas forças de segurança. Entre elas, 51 crianças.

Além dos mortos e feridos, a HRW cita os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. Condena ainda o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

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