Irã condiciona acesso à educação ao respeito ao código de vestimenta islâmico

Quem não usar o hijab, por exemplo, não terá direito a estudar nas escolas e universidades mantidas pelo governo iraniano

O governo do Irã anunciou, através de um pronunciamento oficial na segunda-feira (3), que não mais oferecerá educação pública em escolas e universidades às mulheres que desrespeitarem o rígido código de vestimenta islâmica, que exige por exemplo o uso do hijab. As informações são da rede Radio Free Europe (RFE).

O comunicado afirma que mulheres que não cobrirem suas cabeças como determina a lei serão impedidas de frequentar as aulas. O objetivo da restrição, segundo o texto, é “criar um discurso positivo e construtivo entre os alunos sobre a questão da cultura e crenças islâmicas”.

A nova determinação surge em meio ao aumento da desobediência civil ligada ao código de vestimenta. Cresceu bastante nos últimos meses o número de mulheres que se recusam a adotar o véu obrigatório, que foi responsável pela morte da jovem Mahsa Amini em setembro de 2022.

O uso incorreto do hijab levou a chamada “polícia da moralidade” a repreender a jovem de 22 anos. Ela foi detida, desmaiou sob custódia e foi internada em coma. Morreu três dias depois, levando a população a protestar contra a repressão e a brutalidade do governo.

Iranianas usando o hijab em foto de outubro de 2017 (Foto: BockoPix/Flickr)

Nos protestos, tem sido comum ver mulheres sem o véu islâmico e pedindo o fim da obrigatoriedade. Porém, Mohammad Jafar Montazeri, promotor-chefe do país, afirmou ainda em dezembro de 2022 que o governo não pretende ceder.

“Não podemos dizer que o hijab é um assunto pessoal”, diz ele, reforçando a necessidade de seguir a lei atual, instituída em 1979 e válida para mulheres e meninas com mais de nove anos de idade.

De acordo com o promotor-chefe, as mulheres que vão às ruas sem a cabeça coberta cometem um “crime óbvio”. Ele ainda culpou os “inimigos do país”, provavelmente referindo-se às nações ocidentais, encabeçadas pelos EUA, por influenciar negativamente as iranianas quanto a essa questão.

Nesse sentido, as autoridades chegaram a fechar empresas, restaurantes e outros estabelecimentos devido à presença nesses locais de pessoas vestidas em desacordo com as regras islâmicas. Os proprietários foram acusados de falhar na repressão aos clientes desobedientes.

Por que isso importa?

O código de vestimenta islâmico está diretamente associado aos protestos que tomaram as ruas do Irã nos últimos meses. Eles começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa Amini, e posteriormente se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica.

As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de dezenas de mortes.

No início de outubro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

De acordo com dados divulgados pela ONG Ativistas de Direitos Humanos do Irã (HRAI, na sigla em inglês), ao menos 503 pessoas morreram nas mãos de agentes estatais até o dia 19 de dezembro, entre elas 69 crianças. A entidade diz ainda que 18.452 pessoas foram detidas pelas autoridades sob a acusação de participar dos protestos.

Além dos mortos e feridos, a HRW cita os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. Condena ainda o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

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