Mulher saudita é condenada a 34 anos de prisão por manifestação pacífica no Twitter

A estudante Salma al-Shehab foi condenada pelo regime da Arábia Saudita por seguir e compartilhar postagens de dissidentes e ativistas

No dia 9 de agosto, o Tribunal Criminal Especializado (SCC, da sigla em inglês) de Riad condenou a ativista e acadêmica saudita da minoria xiita Salma al-Shehab, de 34 anos, a 34 anos de prisão. Ela é acusada de “perturbar a ordem pública” por usar o Twitter para endossar a opinião de ativistas que apoiam os direitos das mulheres. As informações são da ONG Human Rights Watch (HRW).

Salma, que é estudante de doutorado na Universidade de Leeds, no Reino Unido, foi detida durante uma visita à Arábia Saudita em dezembro de 2020. Segundo documentos judiciais analisados ​​pela organização de direitos humanos Anistia Internacional (AI), ela ficou sob custódia em confinamento solitário por 285 dias antes de ser levada a julgamento. 

Ela recorreu da sentença alegando que não sabia que seus retuítes poderiam ser considerados um crime. A ativista ainda argumentou que seus dois mil seguidores formavam uma rede pequena demais para “perturbar a ordem e o tecido da sociedade”.

Salma al-Shehab foi condenada a 3 anos de prisão e depois teve pena ampliada (Foto: Twitter/reprodução)

De acordo com os documentos da Justiça saudita, obtidos e traduzidos pelo jornal britânico The Guardian, Salma foi considerada culpada por “ajudar aqueles que buscam causar agitação pública e desestabilizar a segurança civil e nacional seguindo suas contas no Twitter“. No caso, por seguir e retuitar dissidentes e ativistas.

A doutorada, mãe de dois filhos pequenos, teve negado o acesso a representação legal durante toda a sua prisão preventiva, inclusive durante os interrogatórios. Segundo a HRW, a sentença é provavelmente a mais longa já imposta a uma mulher saudita por conta de uma manifestação pacífica nas redes sociais.

“Mesmo para a Arábia Saudita, a sentença de 34 anos imposta a Salma por expressão pacífica é absurda”, disse Sarah Yager, diretora da HRW em Washington. “As autoridades sauditas claramente se sentem empoderadas para esmagar qualquer dissidência e as mulheres sauditas em particular. Os Estados Unidos, a França e outros governos que abraçaram diplomaticamente o reino devem condenar imediata e publicamente esta decisão”.

A pena da ativista foi construída da seguinte maneira: oito anos de prisão por “apoiar aqueles que incitam o terrorismo”, dez anos por “fornecer apoio àqueles que procuram perturbar a ordem pública, minar o segurança da sociedade e a estabilidade do estado seguindo e retuitando”, cinco anos por “criar uma conta online para cometer qualquer um dos atos proibidos pela lei de contraterrorismo” e mais cinco anos por “transmitir rumores falsos e maliciosos”.

A Justiça saudita não esclareceu quais foram os tuítes de Salma que a levaram ao cárcere. A HRW analisou a conta da ativista e constatou que a maioria dos tweets de 2018 para cá falava sobre sua família e questões de direitos das mulheres na Arábia Saudita. Nenhum defendia ou endossava a violência.

Por que isso importa?

A Arábia Saudita é governada em um sistema de monarquia absolutista, com fortíssima repressão e controle rígido por parte do príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, líder de facto do país. Perseguições a jornalistasoponentes e membros considerados inconvenientes da gigantesca família real são perseguidos de forma implacável.

Um caso que ficou conhecido no país envolvendo direitos das mulheres foi o da ativista Loujain al-Hathloul. Ela foi presa em maio de 2018 por liderar uma campanha para permitir que mulheres dirijam no país. Poucas semanas depois, o governo saudita suspendeu a proibição, mas manteve a jovem presa.

Em fevereiro de 2021, com o objetivo de garantir uma interlocução positiva no início do governo de Joe Biden, que havia prometido uma postura mais dura contra o regime, Loujain foi solta.

A ativista, que ganhou evidência global como símbolo da busca por direitos das mulheres sauditas, teve apenas parte de sua sentença suspensa. Ela foi condenada a prestar serviços comunitários no restante da pena e ficou proibida de sair do país por cinco anos. Também ficou impossibilitada de conversar com a imprensa internacional e participar de ações que questionem o regime.

Nem o “sangue azul” escapa da repressão. A princesa Basmah bint Saud bin Abdulaziz al-Saud, que além de membro da família real é empresária e ativista de direitos humanos, ficou três anos após ser presa sem qualquer acusação acompanhada da sua filha, Souhoud Al Sharif. Ela foi libertada no começo deste ano.

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