Soldados israelenses citam questões éticas e impacto do conflito e se recusam a lutar em Gaza

Cerca de 200 militares das IDF se recusam a lutar no enclave, denunciando abusos e pedindo um cessar-fogo imediato. O movimento cresce em meio à pressão internacional

Pelo menos 200 soldados israelenses assinaram uma carta manifestando a recusa em continuar servindo, caso o governo não garanta um cessar-fogo no conflito em território palestino. A medida ocorre no contexto de um crescente número de soldados que denunciam ações questionáveis em Gaza, como assassinatos indiscriminados de palestinos e destruição de propriedades, e afirmam que cruzaram linhas éticas ao seguir ordens de suas lideranças militares. Embora o movimento ainda seja pequeno, os soldados acreditam que ele representa apenas a ponta do iceberg e incentivam outros a se juntarem à causa. As informações são da Associated Press (AP).

Yotam Vilk, um dos soldados que se uniu a esse movimento, afirmou que testemunhou ou participou de ações que cruzaram as linhas morais, como assassinatos indiscriminados de palestinos e destruição de propriedades civis. Cerca de 200 militares assinaram uma carta pedindo um cessar-fogo imediato, com a promessa de interromper a luta se o governo de Israel não tomar medidas concretas.

Embora ainda um movimento pequeno, os soldados afirmam que sua ação representa apenas a ponta do iceberg e incentivam outros colegas a se manifestarem.

Soldados das IDF em treinamento (Foto: WikiCommons)

A recusa dos soldados surge em um momento de crescente pressão internacional para o fim do conflito. As negociações de cessar-fogo estão em andamento, e tanto o presidente Joe Biden quanto o presidente eleito Donald Trump solicitaram um acordo antes da posse em 20 de janeiro. No entanto, o exército israelense ainda enfrenta críticas pela suposta violação dos direitos humanos em Gaza. Grupos internacionais acusam Israel de crimes de guerra e até genocídio, alegações que estão sendo investigadas pelo Tribunal Internacional de Justiça e pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), que busca as prisões de figuras como o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o ex-ministro da Defesa Yoav Gallant.

Em entrevista à AP, sete soldados descreveram o impacto psicológico e moral da guerra. Vilk, que entrou em Gaza em novembro de 2023, disse que no início acreditava que o uso da força poderia forçar as negociações, mas, com o tempo, testemunhou a desintegração do valor da vida humana. Ele relatou, por exemplo, a morte de um adolescente palestino em agosto de 2023, quando as tropas israelenses dispararam tiros de advertência, mas seguiram atacando sem tentar avaliar adequadamente a situação.

Vários soldados mencionaram a ordem para queimar casas que não representavam ameaça, além de relatos de saque e vandalismo por parte das tropas israelenses. Yuval Green, médico de 27 anos, contou que abandonou seu posto em janeiro de 2024 após presenciar abusos como o saque de casas e a destruição indiscriminada de bens civis. A gota d’água para Green foi quando seu comandante ordenou a queima de uma casa, justificando que isso impediria o Hamas de utilizá-la. Para ele, o fogo não era uma medida estratégica, mas uma ação vingativa que não deveria ser executada.

Em resposta às recusas, o exército israelense condena publicamente os atos de desobediência, alegando que cada caso será tratado individualmente e que a deserção pode levar à prisão. No entanto, até o momento, nenhum dos soldados que assinaram a carta foi detido. A organização “Soldados pelos Reféns”, por trás da iniciativa, continua a arrecadar mais adesões e promove eventos para aumentar a visibilidade do movimento, incluindo um painel em Tel Aviv e a distribuição de adesivos com citações de Martin Luther King Jr., como a famosa frase: “Temos a responsabilidade moral de desobedecer leis injustas”.

Apesar do apoio crescente entre os soldados que se recusam a servir, há críticas de militares que lutaram e perderam colegas durante o conflito. Com mais de 830 soldados israelenses mortos, o movimento é visto por alguns como uma afronta a aqueles que sacrificaram suas vidas na guerra. Mas, de acordo com a reportagem, para os soldados que se rebelaram, a recusa é um ato de protesto contra o que consideram ser ações que ultrapassam os limites da moralidade e da humanidade, e uma tentativa de levar a discussão sobre a ética da guerra a um novo patamar.

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