Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News
A Assembleia Geral da ONU é palco nesta quinta-feira (14) de um debate de alto nível sobre um dos maiores desafios de saúde da atualidade, a resistência antimicrobiana, ou RAM.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o problema é diretamente responsável por quase 1,3 milhão de mortes e contribui indiretamente para quatro milhões de fatalidades todos os anos.
Guerras favorecem surgimento e propagação
Em entrevista à ONU News, em Nova York, o diretor de Vigilância, Prevenção e Controle do Departamento de Resistência Antimicrobiana da OMS, uma das razões para a realização do evento é o fato da carga continuar aumentando.
Yvan Hutin afirmou que as projeções para 2050 são “muito preocupantes” e que por isso é preciso “agir agora”, envolvendo não apenas o setor da saúde, mas também da agricultura e do meio ambiente.
Ele explicou que em contextos de conflito existem circunstâncias que facilitam o surgimento de agentes patogênicos resistentes e sua propagação, pois existe “uma pressão de uso de antibióticos” e “práticas inadequadas de controle de infecções que levam à propagação”.
Problema real em Gaza, Ucrânia e Sudão
Em relação aos conflitos atuais em Gaza, Ucrânia e Sudão o especialista confirmou “relatos de pacientes com múltiplos organismos resistentes”. Ele acrescentou que esse é um problema real que pode se espalhar para outras partes do mundo.
Hutin explicou que em Gaza “as circunstâncias são extremamente difíceis”, pois a medida mais essencial de prevenção é acesso a água e o saneamento, que são atualmente precários no enclave. A segunda prioridade é o controle em meio hospitalar, também dificultada pelos confrontos e destruição do sistema de saúde.
Segundo ele, a OMS tem feito todo o possível para implementar um sistema simples para diagnosticar infecções sem testes de diagnóstico e implementar o melhor tratamento possível com base nas suspeitas.
Infecções que não conhecem fronteiras
Desde a sua descoberta, há um século, os medicamentos antimicrobianos, desde antibióticos a antivirais, aumentaram significativamente a esperança média de vida. Todos os dias, estes medicamentos essenciais salvam milhões de vidas, mas alguns deles estão começando a perder o efeito.
A resistência antimicrobiana ocorre quando microrganismos como bactérias, vírus, fungos e parasitas já não respondem aos medicamentos antimicrobianos.
Como resultado da resistência, as infecções podem tornar-se difíceis ou impossíveis de tratar, aumentando o risco de propagação de doenças, doenças graves, incapacidade e morte, de acordo com a OMS.
Do mesmo modo como a Covid-19, as infecções resistentes aos medicamentos não conhecem fronteiras e ninguém está imune.
“Pode acontecer com qualquer pessoa”
Alguns dos impactos crescentes ligados a este desafio de saúde pública são opções de tratamento limitadas, internamentos hospitalares prolongados, medicação constante, perda prolongada de rendimentos, dívidas médicas, pobreza, perda familiar e sofrimento.
Segundo a OMS, “isso pode acontecer com qualquer pessoa, em qualquer lugar”. Mesmo para pessoas com boa saúde, um ferimento leve, uma cirurgia de rotina ou uma infecção pulmonar comum podem evoluir inesperadamente para uma situação de risco de vida.
Para aqueles com doenças pré-existentes como câncer, HIV/Aids ou diabetes, uma infecção intratável pode surgir como uma segunda ameaça perigosa, atacando quando menos se espera.
O que está motivando a resistência antimicrobiana?
Vários fatores podem acelerar o aparecimento e a propagação da RAM, sendo o uso excessivo e indevido de antibióticos um dos principais. A prescrição e uso desses medicamentos quando não são necessários ou tratamentos incompletos podem contribuir para a resistência.
O uso de antibióticos na pecuária para promover o crescimento e prevenir doenças também pode geras cepas resistentes que podem ser transmitidas aos seres humanos.
O controle de infecções também é muito importante, por isso o saneamento e a higiene inadequados nos ambientes de saúde e nas comunidades facilitam a propagação de microrganismos resistentes.
Além disso, o aumento da circulação de pessoas e mercadorias permite que organismos resistentes se espalhem mais facilmente através das fronteiras.
Consequências
O aumento da RAM tem sérias implicações para a saúde pessoal e pública. Ela ameaça a vida de milhões de pessoas, com impactos adicionais na economia, sistemas alimentares, desenvolvimento e segurança.
Segundo a OMS o problema poderá acarretar um custo anual global estimado em até US$ 3,4 bilhões até 2030, empurrando cerca de 28 milhões de pessoas para a pobreza até 2050, segundo o Banco Mundial.
A reunião nesta quinta-feira será o principal evento oficial focado na saúde durante a semana de alto nível da Assembleia Geral da ONU. A OMS considera que sem medidas decisivas, como as descritas na declaração política da reunião, a RAM causará ainda mais sofrimento global, especialmente nos países em desenvolvimento.