As zonas de conflito ao redor do mundo se multiplicaram e estão afetando diretamente a segurança e os lucros da aviação comercial. Companhias aéreas enfrentam cada vez mais rotas fechadas, interferências em sistemas de navegação, desvios inesperados por riscos militares e, em casos extremos, até a queda de aviões atingidos por armamentos. As informações são da agência Reuters.
A guerra na Ucrânia, o conflito entre Israel e Hamas, as tensões entre Índia e Paquistão e os ataques frequentes com drones na Rússia estão tornando o espaço aéreo global mais perigoso e imprevisível. A consequência é clara: mais voos cancelados, rotas alternativas longas e caras e pilotos voando sob constante incerteza.
“O planejamento de voos nesse tipo de ambiente é extremamente difícil”, disse Guy Murray, chefe de segurança da companhia aérea europeia TUI Airways. “A indústria aérea depende da previsibilidade — e a ausência dela sempre gera custos maiores.”
Segundo Mark Zee, fundador do OPSGROUP, grupo de entidades para compartilhamento de riscos aéreos, “mais da metade dos países sobrevoados em um voo típico entre Europa e Ásia agora precisa ser cuidadosamente avaliada antes de cada decolagem”.

Esses riscos já se concretizaram em tragédias recentes. Em dezembro de 2023, um voo da Azerbaijan Airlines foi derrubado no Cazaquistão, matando 38 pessoas. Segundo fontes ouvidas pela Reuters, o avião foi atingido por engano por defesas aéreas russas. Dois meses antes, cinco pessoas morreram após a queda de um cargueiro atingido no Sudão. Desde 2001, seis aviões comerciais foram abatidos e outros três escaparam por pouco, segundo a consultoria Osprey Flight Solutions.
A Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata) afirma que os governos precisam compartilhar melhor as informações para manter a aviação civil segura. Em fevereiro, a entidade declarou que incidentes relacionados a zonas de conflito exigem “coordenação global urgente”. “O espaço aéreo não deveria ser usado como instrumento de retaliação, mas é”, afirmou Nick Careen, vice-presidente da entidade para segurança e operações.
Enquanto isso, companhias tentam se adaptar como podem. A Singapore Airlines, por exemplo, já alterou três vezes a rota do voo SQ326 entre Singapura e Amsterdã nos últimos doze meses. A empresa parou de sobrevoar o Irã após os ataques com mísseis entre Israel e Teerã, passou a evitar o Paquistão quando as tensões cresceram com a Índia e agora cruza o Golfo Pérsico e o Iraque para chegar à Europa. A empresa não comentou as mudanças.
A desigualdade de acesso ao espaço aéreo também gera distorções no mercado. Com o fechamento do espaço russo para companhias ocidentais desde 2022, empresas da China, Índia e Oriente Médio continuam a usar as rotas mais curtas sobre a Sibéria — com menor consumo de combustível e menos tripulação — ganhando vantagem comercial em voos entre Europa e Ásia.
Além das perdas financeiras, há a preocupação crescente com o risco para os tripulantes. “A Iata diz que as companhias devem decidir se é seguro voar sobre zonas de conflito, não os reguladores. Mas a história mostra que pressões comerciais podem interferir nessas decisões”, afirmou Paul Reuter, da Associação Europeia de Pilotos.
Ainda assim, a Iata afirma que os próprios pilotos têm o direito de recusar voos se não se sentirem seguros e que a maioria das empresas respeita essa decisão.