Adoção de órfã afegã por militar dos EUA é sequestro, diz Departamento de Justiça

Fuzileiro naval tenta obter a guarda de um criança que perdeu os pais no Afeganistão, gerando uma disputa internacional

O governo dos Estados Unidos, através do Departamento de Justiça (DoJ), emitiu um alerta a um juiz no Estado da Virgínia, indicando que autorizar a adoção de uma órfã de guerra natural do Afeganistão por parte de um fuzileiro naval norte-americano e a mulher dele pode resultar em uma violação do direito internacional. Essas informações foram reveladas a partir de registros judiciais sigilosos examinados pela agência Associated Press.

A preocupação do governo reside no fato de que a decisão de permitir que o major da Marinha Joshua Mast e a esposa, Stephanie mantenham uma menina afegã órfã possa ser interpretada pela comunidade global como um ato de sequestro internacional de crianças.

As autoridades expressaram sérias preocupações sobre como Mast e Stephanie conseguiram persuadir um juiz na Virgínia a aprovar a adoção da menina, conhecida como “Baby L”, que está sob a guarda do casal desde 2021, desencadeando uma disputa internacional.

Mast e Stephanie com o filho biológico do casal (Foto: Facebook/Reprodução)

Atualmente, Mast e a esposa têm a custódia da menina, que em 2019 sobreviveu a um ataque que resultou na morte de seus pais e cinco irmãos, quando ela tinha apenas dois meses de idade. O oficial, que realizou uma breve missão como advogado no Afeganistão, conheceu a bebê em um hospital militar dos EUA e decidiu trazê-la para sua casa.

No entanto, não devolver a criança, agora com 4 anos, aos parentes afegãos nos Estados Unidos levanta preocupações significativas. Isso poderia comprometer os esforços de Washington para reassentar refugiados afegãos, ameaçar acordos de segurança internacionais e oferecer material de propaganda a extremistas islâmicos. Essa situação, por sua vez, poderia colocar em risco a segurança de soldados norte-americanos no exterior, conforme alertaram autoridades em processos judiciais que buscam intervir no caso.

O DoJ, citando várias “falsidades”, alegou que o tribunal se baseou em “deturpações intencionais” da Marinha e “negligenciou salvaguardas cruciais” para proteger crianças trazidas para os Estados Unidos.

Nos documentos judiciais, que incluem declarações assinadas por funcionários dos Departamentos de Estado e de Defesa, o DoJ afirma que “o sério dano causado pelos Masts à criança, à sua família e aos Estados Unidos persiste”. Eles expressaram preocupação pelo fato de a menina ainda estar sob a guarda do casal até hoje.

Esses documentos foram apresentados sob sigilo nos últimos meses, no âmbito de uma disputa intensa pela custódia da criança.

Alegação de “sem nacionalidade”

Ao argumentar a favor de devolver a menina aos seus parentes afegãos, o Departamento de Justiça afirmou que os Masts, que residiam no Condado de Fluvanna na época, convenceram o juiz local Richard E. Moore, em 2019, de que a criança, que estava a 11,2 mil quilômetros de distância, era uma filha “apátrida” (sem nacionalidade) de combatentes estrangeiros de um país vizinho desconhecido. Alegaram também que o governo afegão pretendia renunciar à jurisdição sobre ela. Um ano depois, Moore, que já se aposentou, tornou a adoção permanente.

No entanto, a criança nunca foi “apátrida”. O governo afegão não renunciou à sua jurisdição sobre ela e as ordens foram obtidas de maneira fraudulenta pelos Masts, que fizeram representações falsas conscientemente perante os tribunais da Virgínia, conforme alegou o Departamento de Justiça.

A lei da Virgínia exige que qualquer pessoa que tenha a custódia física de uma criança tenha a oportunidade de se manifestar em casos de adoção. No entanto, o Departamento de Justiça argumentou que o tribunal da Virgínia não notificou o governo dos EUA sobre a petição de custódia apresentada pelo militar.

O governo Biden argumentou nos documentos judiciais que os atrasos contínuos e a narrativa de que um militar dos EUA roubou uma criança muçulmana estão prejudicando a posição dos Estados Unidos no cenário mundial, especialmente no Afeganistão, onde a retirada das tropas deixou uma nação vulnerável.

Um funcionário do Departamento de Estado escreveu em uma declaração que “a percepção de que os Estados Unidos são um lugar onde crianças afegãs podem ser retiradas de suas famílias, mesmo contra a vontade delas e sem um recurso eficaz, aumenta os riscos percebidos”, prejudicando assim os interesses da política externa dos EUA.

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