Ataque mais mortífero contra o exército deixa 42 soldados mortos no Mali

Ação foi atribuída ao Estado Islâmico no Grande Saara, que teria usado artilharia, drones e bombas para atingir as tropas

O exército do Mali informou na quarta-feira (10) que 42 de seus soldados morreram em um ataque jihadista no último domingo (7), na cidade de Tessit, região da tríplice fronteira com Burkina Faso e Níger. Trata-se da ação mais mortífera contra as forças armadas do país desde 2019, segundo informações da rede France 24.

As autoridades malianas atribuíram a ação ao Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS), dizendo que os insurgentes usaram artilharia, drones, explosivos e um carro-bomba para atacar as posições do exército. O documento que confirmou o número de baixas disse ainda que 22 militares foram feridos, com 37 terroristas “neutralizados”.

A última vez em que as forças armadas do Mali sofreram tantas perdas foi entre o final de 2019 e começo de 2020, quando extremistas realizaram uma série de ataques contra as tropas na mesma área da tríplice fronteira. Naquela ocasião, os agressores usaram veículos e motos para atacar postos do exército, o que levou os militares a recusarem em busca de abrigo em instalações mais seguras.

A cidade de Tessit é localizada em uma região rica em ouro. Além do EIGS, outra facção de forte presença ali é o Grupo de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (GSIM, na sigla em francês), que tem vínculo com a Al-Qaeda e já se expandiu para países vizinhos.

O GSIM, também conhecido pelo nome em árabe Jamaat Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM), lidera a principal rede jihadista do Sahel e rivaliza com a facção ligada ao Estado Islâmico (EI).

A violência na região levou milhares de pessoas a deixarem suas casas, muitas delas rumo à cidade de Gao, a cerca de 150 quilômetros de distância.

Assimi Goita, coronel que governa o Mali, escoltado pelo exército (Foto: Twitter/PresidenceMali)
Retirada francesa

Desde o ano passado, as forças armadas da França, até então as principais parceiras do Mali no combate ao terrorismo, iniciaram um processo de retirada de tropas devido a um desacerto entre os governos. A decisão gerou dúvidas quanto à capacidade de o país africano sustentar os avanços obtidos nessa área.

Segundo o general francês Laurent Michon, comandante da Operação Bakhane de combate ao terrorismo, a retirada dos militares franceses não tem nenhuma relação com a chegada ao Mali do grupo russo de mercenários Wagner Group, como se especulava. Ele diz que o governo militar maliano desde o início deixou claro seu desejo de “nos ver partir sem demora”.

A partir da saída do Mali, a Operação Barkhane tende a mudar sua abordagem e oferecer ajuda apenas aos países que a solicitarem. Nas palavras do comandante, os militares franceses darão “suporte sob demanda, adaptado com flexibilidade para atender às intenções de tal ou tal país”.

Permanecerão no Sahel africano cerca de 2,5 mil soldados da França, que passarão a atuar como coadjuvantes, dando o protagonismo aos países anfitriões.

Por que isso importa?

A instabilidade no Mali começou com o golpe de Estado em 2012, quando vários grupos rebeldes e extremistas tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.

A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.

Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.

Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.

Militarmente, especialistas e políticos ocidentais enxergam uma geopolítica delicada na região, devido ao aumento constante da influência de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e ao EI e à consequente explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares.

Além disso, trata-se de uma posição importante para traficantes de armas e pessoas, e o processo em curso de redução das tropas franceses, que atuam no país desde 2013, tende a piorar a situação.

Os conflitos, antes concentrados no norte do país, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. A região central do Mali se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra forças do governo.

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