Em Moçambique, comunidades se beneficiam com recuperação de manguezais

O ciclone Eline, que atingiu o país africano em fevereiro daquele ano, destruiu cerca de 60% do ecossistema crucial para a população

Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News

Tudo começou após as cheias de 2000 quando o ciclone Eline, que atingiu Moçambique em fevereiro daquele ano, destruiu cerca de 60% dos mangais ou manguezais que rodeavam o estuário do rio Limpopo. Foram 400 hectares afetados pelo desastre natural.

Durante 45 dias os manguezais ficaram submersos. Por causa da carga de água doce, as plantas não sobreviveram. As comunidades sentiram a diferença na disponibilidade de recursos como lenha, madeira, caranguejo e peixe.

Mas, dez anos depois, o Centro de Desenvolvimento Sustentável visitou o local. As comunidades manifestaram a necessidade de restaurar o manguezal e usufruir dos recursos para sua sobrevivência. Foi assim que nasceu o projeto de restauração, usando uma técnica inovadora.

Image aérea do rio Limpopo, que sai da África do Sul e passa por Moçambique (Foto: WikiCommons)

Célia Macamo ecologista e docente na Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, capital de Moçambique, acompanha o projeto desde a sua criação. 

Comunidades em Limpopo sentiram a diferença na disponibilidade de recursos como lenha, madeira, caranguejo e peixe

“Este projeto foi uma escola, um laboratório, e seguiu uma técnica que é a restauração hidrológica. Além de se fazer o plantio, fez-se uma abertura de canais dentro da floresta. Estes canais permitem que a água entre para dentro da floresta e traga sementes que então vão se estabelecer onde for mais adequado. A técnica da restauração hidrológica é eficiente, permite que a floresta restaurada tenha uma estrutura, um desenvolvimento muito parecido com a de uma floresta natural”, disse ela

O projeto, liderado pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente (Pnuma) e financiado pelo Fundo Global para o Ambiente, tem como objetivo revitalizar os manguezais do distrito, muitos das quais foram vítimas da exploração madeireira e dos ciclones.

Trabalho coletivo e integrado

A integração da comunidade é outra forma de chamar a atenção para a melhor proteção dos manguezais face à intervenção humana, porém a ecologista defende que o trabalho deve ser coletivo e integrado.

“Mas a conscientização sozinha não é suficiente, tem de realmente haver alternativas tanto de fontes de renda, como de recursos. O desafio como bióloga e como ecologista é encontrar este equilíbrio, como fazer para produzir mudança de comportamento nas comunidades. Mas às vezes não é só nas comunidades, é preciso também envolver por exemplo as autoridades, até fazedores de políticas e de gestores, porque abordagens diferentes vão produzir resultados diferentes”, afirmou Macamo.

A outra forma adotada pelo projeto para a preservação dos manguezais, no distrito de Mahielene, a cerca de 200 quilômetros de Maputo, envolve 22 mulheres num esforço para replantar árvores de manguezais e obter meios alternativos de sobrevivência das comunidades.

“Com o financiamento do Pnuma, a comunidade produz do mel de mangal, tem criação de porcos e uma cooperativa de pesca, onde estão integradas mulheres. A cooperativa ainda está em formação, não está totalmente pronta. Já foram adquiridos três congeladores, por exemplo, e a intenção da cooperativa de pesca é melhorar a qualidade de processamento do produto pesqueiro para que ele tenha um valor mais elevado no mercado. Então, é um projeto que tem todas as componentes essenciais para sustentabilidade a longo prazo”, disse a ecologista.

A costa de África, com 30.500 quilômetros, é vulnerável e enfrenta riscos decorrentes da subida dos mares e de condições meteorológicas extremas. Moçambique é um desses exemplos. O país sofreu fortes tempestades, como o ciclone Idai em 2019 e o Freddy em 2023, o que provocou a destruição generalizada de infraestruturas e o deslocamento de populações.

Manguezal em Sundarban, na Índia, foto meramente ilustrativa (Foto: Maitheli Maitra/Unplash)
Sucesso do projeto

Para a ecologista Célia Macamo, a restauração é um projeto pioneiro, de sucesso, e os resultados já são visíveis. 

“O mapa mais atualizado mostrou que até 120 hectares de mangal já foram restaurados, e as comunidades sentem que há uma grande parte de serviços ecológicos que voltaram, a comunidade fala por exemplo do retorno das capturas de peixe, não como era no passado porque, entretanto, também houve alguma pressão humana que aumentou, falam da recuperação do caranguejo também e os serviços de proteção costeira”, disse ela

O Pnuma espera que os manguezais criem uma barreira em torno das comunidades locais, protegendo-as de tempestades e outras condições meteorológicas extremas ligadas à crise climática.

A necessidade de ajudar e encontrar soluções para as comunidades a adaptarem-se à crise climática é um dos temas de reflexão no encontro Semana do Clima em África 2023 que começou em 4 de setembro em Nairóbi, no Quênia

Dados do Pnuma indicam que os mangais sustentam as economias globais e locais, apoiando a pesca, fornecendo outras fontes de alimentos e protegendo as costas. Cada hectare de floresta de mangal cria até US$ 57 mil dólares em serviços ecossistêmicos, que são os benefícios que o mundo natural proporciona aos seres humanos.

Tags: