Embora o Al-Shabaab, ligado à Al-Qaeda, seja a principal força extremista na Somália, o Estado Islâmico (EI) também marca presença no país africano. E, segundo o general norte-americano Michael Langley, chefe do Comando Africano (Africom) das Forças Armadas dos EUA, a facção vem crescendo e dobrou de tamanho no último ano. As informações são da rede Voice of America (VOA).
“Estou preocupado com a parte norte da Somália e com o crescimento em números do Estado Islâmico”, disse o militar. Embora ele não tenha apresentado dados, estimativas anteriores sugeriam que o grupo tinha cerca de 200 combatentes ativos no país, o que levaria o contingente atual para a casa dos 400.
Os EUA têm agido para conter o avanço do EI na Somália. Em novembro de 2022, sanções foram impostas ao grupo, acusado de envolvimento com o tráfico de armas que alimenta a rede extremista islâmica no continente africano. Em janeiro do ano passado, o secretário de Defesa Lloyd Austin disse que um líderes da organização no país, Bilal al-Sudan, foi morto em uma operação militar.
O fortalecimento da organização tem levado cada vez mais cidadãos de outras nacionalidades à Somália para se juntar a suas fileiras. O general de brigada Abdi Hassan Hussein, ex-comandante de inteligência da região somali de Puntland, disse que há “centenas” de estrangeiros atuando pelo EI no país, embora os números careçam de verificação independente.
Há quem acredite inclusive que o líder do EI na Somália seja também a principal figura global do grupo terrorista atualmente. Trata-se de Abdulqadir Mumin, que sobreviveu a um ataque aéreo realizado pelos EUA em junho deste ano. De acordo com Langley, os relatórios que apontam Mumin como principal chefe da facção são “credíveis”.
Por que isso importa?
O EI passou por um processo de enfraquecimento que começou com a derrota da organização em seus dois principais redutos. No Iraque, o exército iraquiano retomou todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela facão extremista na Síria.
Desde fevereiro de 2022, o EI sofreu diversos duros golpes, com três líderes da organização mortos em operações de combate ao terrorismo. O mais recente deles foi Abu al-Hussein al-Husseini al-Qurashi, morto em abril. O governo turco reivindicou a ação, embora a própria organização terrorista alegue que o comandante morreu em confronto com o Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), uma organização extremista associada à Al-Qaeda e listada pelo governo norte-americano como terrorista.
Ultimamente, porém, os EUA relatam um ressurgimento do grupo extremista que se concentra na Síria, onde novos seguidores são treinados para atuar como homens-bomba. Diante de tal cenário, dobraram em 2024 os ataques contra as forças aliadas de combate ao terrorismo, que ocorrem também no Iraque.
Mas o continente onde a facção mantém presença mais relevante é a África, através de afiliados locais. Um deles é o Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS), que ampliou sua área de atuação, com aumento de ataques no Mali, em Burkina Faso e no Níger. Ainda tenta alcançar a Nigéria para fins logísticos e de recrutamento, possivelmente em colaboração com o ISWAP” (Estado Islâmico da África Ocidental).
“Apesar do progresso feito no direcionamento de suas operações financeiras e quadros de liderança, a ameaça representada pelo Daesh (sigla árabe para se referir ao grupo) e suas afiliadas regionais permaneceu alta e dinâmica nas amplas áreas geográficas onde está presente”, diz relatório divulgado em agosto de 2023 pela ONU (Organização das Nações Unidas).
Terrorismo no Brasil
Episódios recentes mostram que o Brasil é visto como porto seguro pelos extremistas e é, também, um possível alvo de ataques. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao EI foram presos e dois fugiram.
Mais tarde, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles foram acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
A ameaça voltou a ser evidenciada com a prisão, em outubro de 2023, de três indivíduos supostamente ligados ao Hezbollah que operavam no Brasil. Eles atuavam com a divulgação de propaganda do grupo extremista e planejavam atentados contra entidades judaicas.
Para o tenente-coronel do exército brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), tais episódios causam “preocupação enorme”, vez que confirmam a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras).
A opinião é compartilhada por Barbara Krysttal, gestora de políticas públicas e analista de inteligência antiterrorismo.
“O Brasil recorrentemente, nos últimos dez, cinco anos, tem tido um aumento significativo de grupos terroristas assediando jovens e cooptando adultos jovens para fazer parte de ações terroristas no mundo todo”, disse ela, que também vê o país sob ameaça de atentados. “Sim, é um polo que tem possibilidade de ser alvo de ações terroristas.”