EUA negam participação em ataque aéreo que matou civis na Somália

Operação teria sido conduzida pelas forças armadas da Somália, com os norte-americanos acionados para resgatar feridos

O governo norte-americano negou, na última sexta-feira (8), ter participado de um ataque aéreo que causou a morte de civis, inclusive crianças, na Somália. A ação, atribuída à força aérea do país africano, foi realizada dentro da operação de combate ao extremismo do governo somali, que tem os EUA como parceiros. As informações são da agência Associated Press (AP).

Embora tenham feito o anúncio das mortes, os Estados Unidos alegam que suas tropas não participaram do ataque na cidade de El-Garas, no estado de Galmudug. O Comando na África (Africom) das forças armadas norte-americanas diz ter sido acionado pelo governo somali somente para ajudar na evacuação dos feridos.

Entretanto, um funcionário do governo regional deu informação diversa. “Foi um ataque aéreo norte-americano”, disse Abdifatah Ali Halane, secretário-geral da administração de El-Garas. “Eles têm fornecido apoio aéreo crucial durante as nossas operações contra extremistas no estado de Galmudug.”

O grupo extremista, que é uma facção da Al-Qaeda no território somali, também acusou Washington, que respondeu. “A alegação divulgada pelo Al-Shabaab de que as forças dos EUA causaram os infelizes danos aos civis é falsa”, diz comunicado do Africom.

Os governos somali e norte-americano concordam em um ponto: três terroristas teriam sido mortos na ação. Não está claro o número de vítimas civis, mas um morador de El-Garas diz o ataque aéreo atingiu um casa onde estavam uma mulher e cinco netos dela. Os seis teriam morrido.

Forças da Somália em operação contra o Al Shabaab, outubro de 2012 (Foto: Wikimedia Commons)
Terroristas acuados

Atualmente, o Al-Shabaab é alvo de uma grande operação de contraterrorismo realizada pelo governo da Somália com apoio norte-americano. Washington havia decidido, durante o governo de Donald Trump, retirar suas tropas do território somali, mas o presidente Joe Biden reativou a missão e enviou cerca de 500 soldados ao país africano em 2022.

Em março deste ano, os Estados Unidos anunciaram a ampliação do apoio militar ao país africano com o envio de 61 toneladas de armamento e munição. O pacote inclui fuzis de assalto AK-47, metralhadoras pesadas e munições. 

De acordo com o presidente somali Hassan Sheikh Mohamud, com o suporte de Washington sobretudo nas operações aéreas, o objetivo de seu governo é derrotar completamente o grupo extremista até o início do próximo ano.

“Queremos eliminar o Al-Shabaab do país nos próximos cinco meses”, disse Mohamud durante reunião de governo em 17 de agosto. “Se não os eliminarmos completamente, talvez haja alguns bolsões com alguns Al-Shabaabs inofensivos que não poderão causar problemas.”

Por que isso importa?

O Al-Shabaab chegou a controlar Mogadíscio até 2011, quando foi expulso de lá pelas forças da União Africana (UA). Atualmente, controla territórios nas áreas rurais da Somália e luta para derrubar o governo nacional, tendo inclusive se expandido para a vizinha Etiópia.

O grupo concentra seus ataques no sul e no centro da Somália. As atividades envolvem ataques a órgãos e oficiais do governo e a entidades de ajuda humanitária, além de extorsão contra a população local e proteção de terroristas internacionais que se escondem no país.

Um levantamento feito pela ONU e divulgado em dezembro de 2022 aponta que 613 civis morreram no ano passado na Somália em ações terroristas. A maioria dessas pessoas, 315, foi vítima de dispositivos explosivos improvidas (IEDs, na sigla em inglês).

Os números, apresentados pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), apontam, ainda, casos de vítimas civis atingidas pelas forças do governo, por milícias armadas aliadas às forças armadas somalis e por outros “atores não identificados”. As mais de 600 mortes representam um aumento de um terço em relação a 2021, maior número registrado no país desde 2017.

Devido ao crescimento do Al-Shabaab, o presidente Hassan Sheikh Mohamud iniciou, em agosto do ano passado, uma grande ofensiva contra os insurgentes. Na ocasião, ele comparou a facção a “uma cobra mortal” e disse que “não há solução a não ser matá-la, antes que ela mate você”.

Ao prometer confrontar os insurgentes, ele inclusive alertou a população para que não seja pega no fogo cruzado. “O Al-Shabaab será confrontado usando todos os métodos que a guerra permitir. Eles serão bombardeados, invadidos e submetidos a ataques aéreos. Então, fique longe deles”, disse Mohamud.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista. E, mais recentemente, em outubro de 2022, um associado ao EI, com nacionalidade brasileira e negócios no país, foi sancionado pelos EUA.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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