Fuga em massa de presos aprofunda crise pós-eleitoral em Moçambique

País enfrenta instabilidade desde as eleições de outubro, com acusações de fraude e violência que já levou a dezenas de mortes

Mais de 1,5 mil prisioneiros escaparam de uma prisão em Maputo, capital de Moçambique, em meio a uma onda de protestos desencadeada por resultados eleitorais contestados. A polícia confirmou que, durante o incidente, 33 pessoas morreram e 15 ficaram feridas em confrontos com guardas. Até o momento, cerca de 150 fugitivos foram recapturados, segundo informações da polícia. As informações são da BBC.

A fuga ocorreu na quarta-feira (25), quando manifestantes antigovernamentais se aproximaram da prisão, criando tumulto suficiente para que os presos derrubassem um muro e escapassem. A capital tem sido palco de violentos protestos desde que o tribunal superior do país confirmou, na última segunda-feira (23), a vitória do partido no poder, Frelimo, nas eleições presidenciais de outubro.

A agitação cresceu ainda mais após a revisão oficial dos resultados, que diminuiu a margem de vitória do presidente eleito, Daniel Chapo.

Daniel Chapo (Foto: WikiCommons)

Os números iniciais da eleição indicavam que Chapo havia vencido com 71% dos votos, contra 20% do principal candidato da oposição, Venâncio Mondlane. No entanto, após a decisão do tribunal constitucional, a vitória foi ajustada para 65%, enquanto Mondlane obteve 24%. Para muitos, a mudança nos números reforçou as acusações de fraude eleitoral levantadas pela oposição.

Mondlane, que atualmente está fora do país, tem mobilizado seus apoiadores por meio das redes sociais. Em uma mensagem recente, ele sugeriu que poderia haver uma “nova revolta popular” caso os resultados não fossem anulados. A instabilidade resultante levou à morte de pelo menos 150 pessoas nos três meses desde as eleições, segundo estimativas oficiais.

A onda de manifestações teve início após as eleições presidenciais realizadas em 9 de outubro, que garantiram a permanência do partido governista no poder, posição que ocupa há mais de meio século. No entanto, as acusações de fraude eleitoral por parte da oposição e de amplos setores da sociedade civil alimentaram a insatisfação popular. Os resultados oficiais foram amplamente contestados, com alegações de irregularidades que comprometem a legitimidade do pleito.

Capital em colapso

Na véspera de Natal, Maputo parecia uma cidade fantasma. A maioria dos negócios, delegacias de polícia e fábricas relacionadas à Frelimo foi saqueada, vandalizada ou incendiada. Escritórios e bancos também fecharam as portas, enquanto moradores preferiram permanecer em casa para evitar os confrontos.

De acordo com o ministro do Interior, 21 pessoas foram mortas apenas desde segunda-feira, no auge das tensões. A violência atual é a pior registrada na capital desde que o Frelimo chegou ao poder, em 1975.

Entenda o caso

Chapo foi declarado vencedor das eleições presidenciais e assegurou mais cinco anos de mandato ao partido que governa o país desde sua independência de Portugal, em 1975. A vitória de Chapo reforça a hegemonia da Frelimo, que há quase cinco décadas se mantém no poder em Moçambique, um país com aproximadamente 34 milhões de habitantes.

A vitória, no entanto, foi imediatamente contestada por partidos de oposição, que acusaram a Frelimo de fraudes generalizadas. Entre as principais denúncias estão alegações de enchimento de urnas, manipulação das listas de eleitores e nomeação de funcionários eleitorais leais ao partido governista nos centros de votação. As acusações não são novidade para a Frelimo, que já enfrentou reclamações similares em eleições passadas, colocando em xeque a transparência do processo democrático no país.

Uma missão de observadores internacionais da União Europeia (UE), que acompanhou o pleito, relatou irregularidades significativas, incluindo manipulação dos resultados em algumas regiões. Os observadores destacaram a falta de transparência e a pressão sobre os eleitores em áreas controladas pela Frelimo, levantando dúvidas sobre a legitimidade do resultado anunciado.

A imprensa local noticiou que o Conselho Constitucional, a entidade responsável por garantir o cumprimento das leis eleitorais, solicitou à Comissão Eleitoral Nacional explicações sobre as discrepâncias identificadas. Em resposta, a Comissão afirmou que está analisando os relatórios e prometeu investigar as supostas irregularidades, mas ainda não forneceu um prazo para a conclusão dessas averiguações.

O líder da oposição, que não foi identificado, convocou protestos pacíficos nas principais cidades do país, exigindo um recálculo dos votos e uma auditoria independente. “Não podemos aceitar que nossa democracia seja sequestrada”, declarou em um comício realizado em Maputo, onde centenas de apoiadores foram às ruas para expressar sua insatisfação.

Analistas observam que, caso as denúncias sejam confirmadas, o governo de Daniel Chapo poderá enfrentar dificuldades não apenas internas, mas também pressões externas, incluindo possíveis sanções internacionais que podem impactar a economia moçambicana. A comunidade internacional, especialmente países da União Europeia e organizações de direitos humanos, têm monitorado de perto a situação, exigindo um esclarecimento rápido das autoridades locais para garantir que a vontade do povo moçambicano seja respeitada.

No dia 29 de outubro, associações médicas divulgaram que pelo menos dez pessoas perderam a vida durante os protestos. Tanto a sociedade civil quanto a imprensa reportaram que o número de vítimas fatais aumentou devido à violência policial ao longo de uma semana de manifestações, iniciada em 31 de outubro por convocação de Venâncio Mondlane e que está prevista para culminar em Maputo no dia 7 de novembro.

Moçambique possui um histórico marcado por violações de direitos humanos em períodos eleitorais conturbados, incluindo episódios semelhantes ocorridos no ano passado.

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