Grupo ligado à Al-Qaeda assume ataque contra base militar no Mali

Um militar morreu na ação, a primeira de jihadistas contra uma instalação das forças armadas no país em dez anos de insurgência

O Grupo de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (GSIM, na sigla em francês), organização extremista sediada no Mali e vinculada à Al-Qaeda, assumiu a autoria de um ataque terrorista registrado na sexta-feira (22) contra uma base militar no país africano. As informações são da agência Reuters.

O alvo foi uma instalação das forças armadas em Kati, a cerca de 15 quilômetros da capital Bamako. Foi a primeira ação contra uma base militar desde que a insurgência jihadista foi registrada no país há dez anos. De acordo com GSIM, o ataque foi comandado por uma de suas fações locais, o Katiba Macina.

Os extremistas usaram dois carros-bomba para realizar o ataque, que deixou seis pessoas feridas. De acordo com os militares, sete agressores foram mortos e oito foram presos. A autoria foi confirmada pelo SITE Intelligence Group, que monitora grupos terroristas e teve acesso a um comunicado publicado pela unidade de mídia do GSIM.

Segundo descreveu a organização jihadista, um de seus membros detonou um carro-bomba no portão da base militar, enquanto o segundo foi detonado por combatentes de Burkina Faso que conseguiram entrar na instalação.

O GSIM diz que o ataque é uma resposta ao governo do Mali pela parceria firmada com o Wagner Group, contratado justamente para combater jihadistas em substituição às tropas da França, que estão em retirada. Os mercenários russos têm sido acusados de envolvimento em massacres de civis.

“Nós dizemos ao governo de Bamako: se você tem o direito de contratar mercenários para matar os inocentes indefesos, então nós temos o direito de destruí-lo e atingi-lo”, disse o grupo terrorista, que ainda assumiu a autoria de ataques na quinta-feira (21), nos quais mais um militar morreu.

Soldados do exército do Mali durante o golpe de Estado de 2012 (Foto: Wikimedia Commons)
Retirada francesa

Desde o ano passado, as forças armadas francesas iniciaram um processo de retirada de tropas devido a um desacerto entre os governos da França e do Mali. A decisão gerou dúvidas quanto à capacidade de o país africano sustentar os avanços na luta contra o jihadismo.

Segundo o general francês Laurent Michon, comandante da Operação Bakhane de combate ao terrorismo, a retirada dos militares franceses não tem nenhuma relação com a chegada ao Mali do grupo russo de mercenários Wagner Group, como se especulava. Ele diz que o governo militar maliano desde o início deixou claro seu desejo de “nos ver partir sem demora”.

A partir da saída do Mali, a Operação Barkhane tende a mudar sua abordagem e oferecer ajuda apenas aos países que a solicitarem. Nas palavras do comandante, os militares franceses darão “suporte sob demanda, adaptado com flexibilidade para atender às intenções de tal ou tal país”.

Permanecerão no Sahel africano cerca de 2,5 mil soldados da França, que passarão a atuar como coadjuvantes, dando o protagonismo aos países anfitriões.

Por que isso importa?

A instabilidade no Mali começou com o golpe de Estado em 2012, quando vários grupos rebeldes e extremistas tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.

A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.

Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.

Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.

Militarmente, especialistas e políticos ocidentais enxergam uma geopolítica delicada na região, devido ao aumento constante da influência de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e ao EI e à consequente explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares.

Além disso, trata-se de uma posição importante para traficantes de armas e pessoas, e o processo em curso de redução das tropas franceses, que atuam no país desde 2013, tende a piorar a situação.

Os conflitos, antes concentrados no norte do país, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. A região central do Mali se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra forças do governo.

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