Líder do governo de Darfur Ocidental é morto em meio ao conflito no Sudão

Khamis Abakar foi assassinado logo após acusar combatentes paramilitares de matar civis em grande número e pedir intervenção internacional

O governador regional do Estado de Darfur Ocidental, no Sudão, foi morto na noite de quarta-feira (14) após fazer declarações públicas responsabilizando as Forças de Apoio Rápido (RSF, da sigla em inglês), corpo paramilitar da violenta milícia Janjawid, pelas mortes de civis. O assassinato de Khamis Abakar marca uma escalada no conflito que já dura dois meses. As informações são da agência Al Jazeera.

A guerra começou em 15 de abril, quando as tensões entre o chefe do exército, Abdel Fattah al-Burhan, e o comandante do RSF, Mohamed Hamdan “Hemedti” Dagalo, se intensificaram e resultaram em um confronto armado. O conflito entre duas facções militares rivais segue sem perspectiva de interrupção mesmo com as negociações de paz conduzidas por Arábia Saudita e Estados Unidos

Ainda na noite de quarta, imagens divulgadas nas redes sociais mostravam claramente um grupo de homens armados detendo Abakar, sendo que alguns deles estavam vestindo uniformes da RSF. Além disso, em outros vídeos, é possível ver o governador no chão, apresentando ferimentos no pescoço e no rosto.

Uma paisagem da cidade de El Geneina, capital de Darfur Ocidental, Sudão (Foto: UNAMID/Hamid Abdulsalam)

Horas antes, o político havia feito acusações graves contra a RSF e os combatentes árabes aliados, alegando que estavam cometendo “genocídio“. Em entrevista à Al Hadath TV, ele denunciou que civis estavam sendo mortos indiscriminadamente e em grande quantidade. Diante disso, ele apelou para a comunidade internacional intervir a fim de proteger a população em el-Geneina, a capital de Darfur Ocidental.

Além disso, Abakar expressou sua indignação ao afirmar que o exército não havia tomado medidas para defender a população, mesmo quando estes estavam em perigo.

O exército sudanês acusou o RSF de sequestrar e assassinar o governador, considerando-o um ato brutal. Segundo o exército, isso se encaixa no histórico de crimes bárbaros cometidos pela RSF contra o povo sudanês.

Em resposta, o RSF emitiu um comunicado condenando o assassinato e atribuindo-o a bandidos envolvidos no conflito tribal em andamento no estado. Além disso, o RSF responsabilizou a Inteligência Militar Sudanesa e seus apoiadores islâmicos radicais, ligados ao antigo regime do ditador Omar al-Bashir, por alimentar o conflito através do fornecimento de armas às tribos.

O grupo paramilitar nega envolvimento em ataques contra civis em Darfur. No entanto, refugiados ouvidos pela reportagem em assentamentos no Chade afirmaram ter testemunhado homens vestindo uniformes do RSF se unindo a grupos armados árabes. Esses refugiados relataram que a violência ocorreu em suas cidades e aldeias após a retirada do exército ou da polícia local, resultando em um vácuo de poder que foi preenchido pelas milícias árabes. Nenhum dos residentes afirmou ter recebido proteção do exército.

Ativistas e moradores de el-Geneina relataram agressões sexuais contra dezenas de mulheres, tanto em suas casas como durante tentativas de fuga dos combates. A grande maioria desses casos de estupro foi atribuída ao RSF, que não respondeu aos pedidos de comentários feitos repetidamente, segundo a AP.

De acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas), mais de 2 milhões de pessoas foram deslocadas pelo conflito no Sudão. Além disso, a intensificação dos ataques em Darfur é considerada uma possível ocorrência de “crimes contra a humanidade“.

No início dos anos 2000, ocorreu uma guerra genocida em Darfur, com grupos étnicos africanos se rebelando contra o governo de Cartum. O governo retaliou armando combatentes árabes nômades conhecidos como Janjawid, resultando em deslocamentos em massa e centenas de milhares de mortes. O grupo evoluiu para as RSF, tornando-se uma força governamental em 2017.

Por que isso importa?

O Sudão vive um violento conflito armado que coloca frente a frente dois generais que comandam o país africano desde o golpe de Estado de 2021: Abdel Fattah al-Burhan, chefe das forças armadas, e Mohamed Hamdan Daglo, apelidado de “Hemedti”, à frente das Forças de Apoio Rápido (RSF, da sigla em inglês), corpo paramilitar da violenta milícia Janjawid, que combateu os rebeldes de Darfur.

As tensões iniciadas em 15 de abril decorrem de divergências sobre como cem mil soldados da milícia paramilitar devem ser integrados ao exército e quem deve supervisionar esse processo. 

No dia 16 de abril, um domingo, explosões puderam ser ouvidas no centro da capital Cartum, mais precisamente no entorno do quartel-general militar do Sudão e do palácio presidencial, locais estratégicos reivindicados tanto por militares quanto pelas RSF.

O aeroporto internacional da capital, tomado pela milícia, foi bombardeado com civis dentro. Aeronaves foram destruídas, e caças da força aérea sudanesa e tanques foram usados contra os paramilitares.

Desde que o conflito se espalhou, primeiro pela capital, depois por outras regiões do país, as nações estrangeiras que tinham cidadãos e representantes diplomáticos no Sudão realizaram um processo de evacuação, viabilizado por um frágil cessar-fogo que não foi totalmente respeitado pela partes. Muitos estrangeiros, porém, não conseguiram sair.

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