O Equador e a espiral de caos e violência: entenda o que está acontecendo

Criminosos rebelaram-se contra a nova política antidrogas e a proposta de militarização das prisões. Pandemia impulsionou o tráfico em um país que antes era tranquilo

O Equador enfrenta uma séria crise de segurança, a ponto de ter declarado na segunda-feira (8) estado de “conflito armado interno” após fugas da prisão de importantes chefes do narcotráfico e uma série de ataques violentos realizados por poderosos grupos criminosos que controlam o mercado de entorpecentes.

Na terça-feira (9), homens armados interromperam uma transmissão ao vivo da emissora de televisão local TC, dando início a uma escalada de violência que afasta o país de seu passado tranquilo e o coloca como um dos locais mais perigosos da América Latina. Tudo é efeito de uma bola de neve que começou a se formar há quatro anos.

Polícia do Equador em Quito, 2009: crise de segurança se formou aos poucos (Foto: akeg/WikiCommons)

O caos de agora teve a fagulha acesa no início da pandemia de Covid-19, em março de 2020. O coronavírus deixou marcas profundas na economia e na segurança do Equador. Enquanto muitas empresas fechavam e pessoas perdiam o emprego, a segurança do país foi impactada, algo que ficou evidente pelo aumento de crimes violentos e atividades relacionadas ao tráfico de drogas.

Em 2023, as mortes violentas no Equador ultrapassaram oito mil, quase o dobro de 2022, segundo a agência Reuters. O governo atribui esse aumento à expansão de facções que impulsionam o tráfico de cocaína, desestabilizando socialmente amplas regiões de um país espremido entre os dois maiores produtores mundiais da droga, a Colômbia e o Peru. O cenário violento afetou até mesmo a política, com o assassinato de Fernando Villavicencio, um candidato anticorrupção durante a eleição presidencial do ano passado.

Dentro das prisões equatorianas, facções aproveitam a falta de controle estatal para ampliar seu poder, resultando em crescente violência e centenas de mortes. O país apresenta níveis históricos de insegurança, que chegam a 40 homicídios por cem mil habitantes. Guayaquil, a maior cidade costeira equatoriana, é considerada a mais perigosa, com seus portos sendo centros de contrabando de drogas.

Foi nesse cenário que o presidente Daniel Noboa iniciou seu mandato em outubro do ano passado, com a promessa de enfrentar os chamados “narcos”. À época, ele apresentou o “Plano Fênix” de segurança, envolvendo uma nova unidade de inteligência, armas táticas para as forças policiais, prisões de alta confiabilidade e reforço de segurança em portos e aeroportos.

Atualizando a situação para janeiro de 2024, em meio ao caos, Noboa designou 22 facções ligadas ao tráfico de drogas como grupos terroristas e determinou a realização de operações militares para neutralizá-las. O anúncio ocorreu nas redes sociais logo após criminosos invadirem a TC Televisión, com sede em Guayaquil.

No começo da semana, Noboa decretou estado de exceção após a fuga da prisão de um criminoso conhecido como Fito, líder do grupo Los Choneros. Na terça (9), as autoridades informaram sobre a fuga de Fabricio Colón Pico, chefe do Los Lobos, preso na semana anterior por sequestro e suspeito de envolvimento em um plano para assassinar a procuradora-geral do país. O decreto permanece em vigor e impõe toque de recolher das 23h às 5h.

Criminosos desafiam política antidrogas

Ouvido pelo jornal The Guardian, Fernando Carrión, especialista em segurança do Instituto Latino-Americano de Ciências Sociais em Quito, disse que os tentáculos do crime organizado nunca haviam alcançado tão profundamente os corredores do poder.

Em 2021, durante a pandemia, polícia equatoriana coordena destruição de toneladas de drogas apreendidas (Foto: Ministerio de Gobierno Ecuador/Flickr)

Segundo ele, neste momento, diversas facções se insurgem contra a abordagem rigorosa do novo presidente, que busca minar o controle dos criminosos sobre as prisões através de propostas que incluem a militarização das penitenciárias, o aumento das sentenças e o isolamento de líderes poderosos, como foi o caso de Fito e Pico.

“Sempre nos definimos como uma ilha de paz. Mas previmos que isso aconteceria”, sintetizou Carrión.

Diante de dificuldades econômicas e do risco de violência, muitos equatorianos optam por fugir do país, tornando-se a segunda nacionalidade, após os venezuelanos, que mais frequentemente atravessa a perigosa rota do Darién, entre Colômbia e Panamá, para chegar aos EUA, de acordo com o escritório de migração panamenho.

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