O Equador enfrenta uma séria crise de segurança, a ponto de ter declarado na segunda-feira (8) estado de “conflito armado interno” após fugas da prisão de importantes chefes do narcotráfico e uma série de ataques violentos realizados por poderosos grupos criminosos que controlam o mercado de entorpecentes.
Na terça-feira (9), homens armados interromperam uma transmissão ao vivo da emissora de televisão local TC, dando início a uma escalada de violência que afasta o país de seu passado tranquilo e o coloca como um dos locais mais perigosos da América Latina. Tudo é efeito de uma bola de neve que começou a se formar há quatro anos.
O caos de agora teve a fagulha acesa no início da pandemia de Covid-19, em março de 2020. O coronavírus deixou marcas profundas na economia e na segurança do Equador. Enquanto muitas empresas fechavam e pessoas perdiam o emprego, a segurança do país foi impactada, algo que ficou evidente pelo aumento de crimes violentos e atividades relacionadas ao tráfico de drogas.
Em 2023, as mortes violentas no Equador ultrapassaram oito mil, quase o dobro de 2022, segundo a agência Reuters. O governo atribui esse aumento à expansão de facções que impulsionam o tráfico de cocaína, desestabilizando socialmente amplas regiões de um país espremido entre os dois maiores produtores mundiais da droga, a Colômbia e o Peru. O cenário violento afetou até mesmo a política, com o assassinato de Fernando Villavicencio, um candidato anticorrupção durante a eleição presidencial do ano passado.
Dentro das prisões equatorianas, facções aproveitam a falta de controle estatal para ampliar seu poder, resultando em crescente violência e centenas de mortes. O país apresenta níveis históricos de insegurança, que chegam a 40 homicídios por cem mil habitantes. Guayaquil, a maior cidade costeira equatoriana, é considerada a mais perigosa, com seus portos sendo centros de contrabando de drogas.
Foi nesse cenário que o presidente Daniel Noboa iniciou seu mandato em outubro do ano passado, com a promessa de enfrentar os chamados “narcos”. À época, ele apresentou o “Plano Fênix” de segurança, envolvendo uma nova unidade de inteligência, armas táticas para as forças policiais, prisões de alta confiabilidade e reforço de segurança em portos e aeroportos.
Atualizando a situação para janeiro de 2024, em meio ao caos, Noboa designou 22 facções ligadas ao tráfico de drogas como grupos terroristas e determinou a realização de operações militares para neutralizá-las. O anúncio ocorreu nas redes sociais logo após criminosos invadirem a TC Televisión, com sede em Guayaquil.
#ABCMundo #Ecuador | "Por favor, que se vaya la Policía".
— ABC Digital (@ABCDigital) January 9, 2024
Uno de los encapuchados obligó al presentador del canal TC Televisión en Guayaquil a suplicar el despeje policial del lugar. https://t.co/GwwEvN5J9s pic.twitter.com/wc3SUcAcXH
No começo da semana, Noboa decretou estado de exceção após a fuga da prisão de um criminoso conhecido como Fito, líder do grupo Los Choneros. Na terça (9), as autoridades informaram sobre a fuga de Fabricio Colón Pico, chefe do Los Lobos, preso na semana anterior por sequestro e suspeito de envolvimento em um plano para assassinar a procuradora-geral do país. O decreto permanece em vigor e impõe toque de recolher das 23h às 5h.
Criminosos desafiam política antidrogas
Ouvido pelo jornal The Guardian, Fernando Carrión, especialista em segurança do Instituto Latino-Americano de Ciências Sociais em Quito, disse que os tentáculos do crime organizado nunca haviam alcançado tão profundamente os corredores do poder.
Segundo ele, neste momento, diversas facções se insurgem contra a abordagem rigorosa do novo presidente, que busca minar o controle dos criminosos sobre as prisões através de propostas que incluem a militarização das penitenciárias, o aumento das sentenças e o isolamento de líderes poderosos, como foi o caso de Fito e Pico.
“Sempre nos definimos como uma ilha de paz. Mas previmos que isso aconteceria”, sintetizou Carrión.
Diante de dificuldades econômicas e do risco de violência, muitos equatorianos optam por fugir do país, tornando-se a segunda nacionalidade, após os venezuelanos, que mais frequentemente atravessa a perigosa rota do Darién, entre Colômbia e Panamá, para chegar aos EUA, de acordo com o escritório de migração panamenho.