Autoridades de Hong Kong advertem crianças pela falta de empolgação com o hino da China

Governo alega que os jovens cantaram 'muito suavemente', alerta feito dentro de uma ampla campanha de educação patriótica

Ao menos duas instituições de ensino de Hong Kong foram advertidas pelas autoridades devido à falta de empolgação mostrada por seus alunos durante a execução do hino nacional da China. Os professores foram orientados a “cultivar o hábito e a confiança” dos jovens, sob o argumento de que eles cantam “muito suavemente”, segundo a rede BBC.

As advertências foram direcionadas à Escola Primária da Igreja Luterana de Hong Kong e Macau e à Escola Secundária Lim Por Yen do Hospital Yan Chai. O comunicado diz que os docentes devem “ajudar os alunos a desenvolver o hábito de cantar o hino nacional em voz alta e em uníssono.”

A notificação consta de um relatório de inspeção publicado pelo Departamento de Educação do governo de Hong Kong. Além da questão do hino, seis escolas foram orientadas a reforçar o currículo voltado à educação patriótica, parte de uma campanha mais ampla do governo.

Bandeiras de Hong Kong (esq.) e China lado a lado (Foto: Lianqing Li/Flickr)

A campanha visa a doutrinar a juventude com propaganda do Partido Comunista Chinês (PCC) e de seu líder, o presidente Xi Jinping. Ela determina que as escolas e organizações voltadas a crianças e jovens ofereçam educação ideológica e política, abrangendo a história oficial do partido, símbolos nacionais, “unidade nacional” e “segurança nacional”.

O projeto tornou as “atividades patrióticas” obrigatórias por lei, especialmente para os menores. De acordo com a mídia estatal, o objetivo é promover o espírito de patriotismo através de prêmios nacionais, eventos durante o Dia Nacional, aniversários importantes e grandes festivais, além de cerimônias de hasteamento de bandeiras, execução do hino nacional e juramentos de fidelidade à Constituição.

A campanha, que também vale para Macau, outro território sob o controle de Beijing, determina inclusive o estudo do “pensamento de Xi Jinping” nas escolas, focado no ‘Socialismo com Características Chinesas Para Uma Nova Era’, uma ideia desenvolvida pelo presidente.

Hong Kong, embora funcione dentro do sistema “um país, dois sistemas” desde que deixou o domínio britânico e passou para o chinês, em 1997, tem cada vez menos autonomia. O hino nacional da China, a Marcha dos Voluntários, é uma peça central desse movimento. No início do mês, três pessoas foram presas acusadas de desrespeitar a execução da Marcha dos Voluntários durante um jogo de futebol.

Os detidos, dois homens e uma mulher com idades entre 18 e 31 anos, foram presos no Estádio de Hong Kong, com base na Lei do Hino Nacional. O incidente ocorreu durante um jogo de qualificação para a Copa do Mundo de 2026, no qual o Irã venceu Hong Kong por 4 a 2. Se condenados, podem pegar até três anos de prisão e multa de 50 mil dólares de Hong Kong (R$ 34 mil).

Lei de segurança nacional

A repressão, no entanto, vai muito além dos casos ligados ao hino nacional. A principal ferramenta de Beijing para apagar a autonomia honconguesa é a lei de segurança nacional, que dá ao governo poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos.

Imposta pela China em 2020, a lei foi substituída em março deste ano por uma nova versão, ainda mais dura e sancionada pelos legisladores locais. Atendeu, assim, a uma determinação da Lei Básica, uma espécie de Constituição do território, que exigia um mecanismo próprio para substituir o anterior.

A lei pune crimes como traição, insurreição, incitação de membros das Forças Armadas ao motim e conluio com forças externas. O texto também cita o crime de sedição, que não constava no antigo, e os casos mais graves são puníveis com a prisão perpétua.

Os críticos alegam que, desde a imposição da lei, os direitos de expressão e de associação têm diminuído cada vez mais, com o aumento da repressão aos dissidentes. Já as autoridades de Hong Kong reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território

O Reino Unido, por sua vez, entende que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.

Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras de Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”

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