Beijing usa centros de serviço no exterior para perseguir seus cidadãos, aponta ONG

Trinta nações, inclusive o Brasil, recebem as estações ligadas ao regime, que oficialmente servem como ponto de apoio aos chineses

O Partido Comunista Chinês (PCC) opera, em 30 países dos cinco continentes, inclusive no Brasil, ao menos 54 “centros de serviço” no exterior. Embora eles sirvam essencialmente para atender a residentes e turistas chineses com questões administrativas, um estudo realizado pela ONG de direitos humanos Safeguard Defenders aponta que alguns têm sido usados para assediar cidadãos chineses e convencê-los a retornar a seu país, mesmo que contra a própria vontade.

Os centros foram originalmente criados como associações comunitárias de cidadãos de uma mesma região chinesa. “Embora muitas vezes forneçam serviços genuínos à comunidade, agora se tornaram esmagadoramente cooptados pelas organizações da Frente Unida do PCC, que buscam controlar cada vez mais a diáspora chinesa“, diz a Safeguard Defenders, que registrou somente os centros criados pelos condados de Fuzhou e Qingtian. Ou seja, é provável que em todo o mundo haja mais que os 54 listados.

O relatório publicado pela ONG aponta que, na maioria dos casos de assédio a cidadãos chineses, esses “centros de serviços” somente operam um sistema online que coloca o cidadão chinês em contato com as autoridades na China. Porém, há casos registrados de envolvimento ativo dos “centros de serviço” no rastreamento e na perseguição de alvos em países estrangeiros.

Xi Jinping, presidente da China: chineses silenciados inclusive no exterior (Foto: Wikimedia Commons)

Conforme os dados da ONG, entre abril de 2021 e julho de 2022, 230 mil cidadãos chineses “foram devolvidos para enfrentar possíveis acusações criminais na China por meio desses métodos, que geralmente incluem ameaças e assédio contra membros da família em casa ou diretamente contra o alvo no exterior, seja por meio online ou físico”.

Para todos os efeitos, o governo chinês alega que os 230 mil repatriados são acusados de algum crime. Dois casos investigados e confirmados ocorreram em território europeu. Um em Madrid, na Espanha, e o outro em Belgrado, na Sérvia. Em ambos os casos, os cidadãos chineses compareceram aos centros, onde falaram com autoridades na China através do aplicativo WeChat. Então, foram convencidos a retornar ao país de origem para responder por seus atos supostamente ilegais.

Para convencer os indivíduos a aceitar voluntariamente a ideia de voltar à China, são adotados métodos abusivos. “Um desses métodos, descrito na documentação oficial, é negar aos filhos do suspeito ainda na China o direito à educação”, diz o relatório.

Em outros casos, parentes aparecem no vídeo ao lado de autoridades chinesas e atuam para convencer o cidadão a retornar. “Os familiares que se recusam a ajudar a polícia em operações de ‘persuasão’ podem ser punidos”, segundo o documento.

Através desses métodos, Beijing se permite driblar o sistema legal dos países onde vivem seus cidadãos, vez que as legislações locais “preveem mecanismos de controle para proteger os direitos do alvo, incluindo o direito a um julgamento justo e a presunção de inocência antes do julgamento”.

Embora receba dois desses “centros de serviço”, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, o Brasil não surge no relatório como tendo registrado qualquer caso de assédio.

A Safeguard Defenders conclui que as “associações da diáspora chinesa no exterior podem desempenhar um papel positivo na assistência a residentes e turistas chineses em sua localização”. Entretanto, os casos investigados confirmam que “pelo menos algumas delas desempenham um papel muito mais nefasto”.

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