Campanha contra drogas nas Filipinas é permissão para matar, diz ONU

Pelo menos 8,6 mil pessoas morreram devido à campanha; ONU acredita que o número é três vezes maior

Uma campanha para erradicação das drogas ilegais nas Filipinas, criada pelo presidente Rodrigo Duterte em 2016, levou oficialmente à morte de pelo menos 8,6 mil pessoas. O número pode ser, na realidade, três vezes maior.

O alerta foi feito pelo ACNUDH (Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos) no último dia 4.

Um relatório da entidade aponta para uma “quase impunidade” pelos assassinatos. As mortes somam-se a outros supostos abusos praticados durante a pandemia do novo coronavírus, como perseguição a defensores dos direitos humanos.

“Infelizmente, o relatório documentou impunidade profunda para violações graves dos direitos humanos, e as vítimas foram privadas de justiça para os assassinatos de seus entes queridos”, apontou a alta comissária da ONU Michelle Bachelet.

Campanha contra drogas nas Filipinas é permissão para matar, diz ONU
Vista de Manila, capital das Filipinas (Foto: Wolfgang Hägele/Wikimedia Commons)

Suspeitos neutralizados

Segundo o relatório da ONU, policiais receberam uma circular contendo terminologia referente à “negação” e “neutralização” de suspeitos de casos envolvendo drogas.

“Essa linguagem, aliada ao encorajamento verbal nos mais altos níveis do governo para que a polícia mate esses suspeitos, pode ter sido interpretado como permissão para matar”, aponta a co-autora do relatório Ravina Shamdasani.

Ela destaca que buscas em residências particulares ocorriam sem mandados. Relatórios policiais em que constam mortes de suspeitos usam termos parecidos com os da circular, levantando questionamento sobre como as operações de fato aconteceram.

Shamdasani também questiona as alegações policiais de autodefesa. Houcve casos em que a mesma arma foi recuperada com diferentes vítimas em diferentes locais, o que sugere fraude por parte das forças de segurança.

Com as frequentes prisões de suspeitos em casos envolvendo drogas, o congestionamento prisional atingiu taxas de 534%, uma das mais altas do mundo.

Lei antiterrorismo

O relatório da ONU destaca ainda que a nova lei antiterrorismo concede poderes ainda mais abrangentes aos serviços de segurança.

Entre as propostas do governo está o aumento de três dias para mais de três semanas no período em que um suspeito pode ser detido para interrogatório sem mandado.

“Depende muito mais das autoridades a designação de indivíduos e organizações como terroristas, mas não há oportunidade para os indivíduos apresentarem o seu caso e não há nenhuma disposição explícita ordenando uma audiência”, explica Shamdasani.

Entre 2015 e 2019, também foram mortos ao menos 248 defensores dos direitos humanos, advogados, jornalistas e sindicalistas no exercício de suas funções nas Filipinas.

De acordo com o relatório da ONU, defensores de direitos humanos são considerados terroristas e trazidos à público. Após a exposição, muitos deles acabam assassinados.

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