China aperta o cerco na fronteira marítima com a Coreia do Sul, sem disparar um tiro

Beijing intensifica patrulhas da Guarda Costeira em uma área marítima disputada e pressiona silenciosamente o aliado dos EUA

A China aumentou sua presença na Zona de Medidas Provisórias, criada em 2001 para gerenciar disputas sobre zonas econômicas exclusivas (ZEEs) sobrepostas entre Beijing e Coreia do Sul, ao enviar embarcações da Guarda Costeira para patrulhas prolongadas na região. A movimentação é vista por especialistas como parte de uma estratégia chinesa para consolidar seu controle efetivo sobre o território e exercer pressão sobre Seul, em meio ao fortalecimento da aliança sul-coreana com os Estados Unidos. As informações são da Newsweek.

Dados de rastreamento marítimo analisados pela reportagem indicam que três embarcações da Guarda Costeira da China permaneceram na área por semanas, navegando de um lado para o outro. O navio CCG-6104, de 650 pés, foi localizado a cerca de 170 milhas da costa oeste sul-coreana na última sexta-feira (21). Outra embarcação, o CCG-6501, estava a 120 milhas do estado de Jeonbuk. O terceiro navio, o CCG-1304, foi registrado no Mar da China Oriental, a sudoeste da Ilha de Jeju, antes de seguir para o Porto de Chongming, próximo a Xangai.

Além das patrulhas intensificadas, relatos apontam que a China construiu uma estrutura de 160 pés na Zona de Medidas Provisórias, repetindo uma tática utilizada anteriormente, quando instalou construções temporárias alegando apoio à pesca e, posteriormente, as removeu após protestos de Seul. Autoridades sul-coreanas temem que Beijing possa erguer até uma dúzia de novas instalações na área.

Navio da Guarda Costeira da China, janeiro de 2019 (Foto: Ted McGrath/Flickr)
Tensões regionais

A disputa marítima ocorre em um momento sensível para a Coreia do Sul, que enfrenta uma crise política interna relacionada ao julgamento de insurreição do presidente Yoon Suk-yeol, após sua breve declaração de lei marcial em dezembro. A crescente atividade da Guarda Costeira chinesa pode acirrar ainda mais as tensões entre os dois países, já afetadas pelas frequentes incursões de barcos pesqueiros chineses na ZEE sul-coreana.

A China reivindica suas águas territoriais no Mar Amarelo — chamado de Mar Ocidental na Coreia do Sul — com base em um tratado de fronteira de 1962, estabelecendo o meridiano de 124 graus de longitude leste como linha de demarcação. Essa delimitação, no entanto, avança sobre a ZEE da Coreia do Sul, que segue o direito marítimo internacional ao reivindicar uma área de até 200 milhas náuticas (aproximadamente 370 km) da costa.

Para Dong Gyu Lee, pesquisador do Instituto Asiático de Estudos Políticos, sediado em Seul, a presença chinesa pode ser vista como “uma pressão sobre o governo sul-coreano, que tem fortalecido laços com os EUA, além de representar uma tentativa de consolidar o controle efetivo da China sobre o Mar Ocidental”.

Já Ray Powell, diretor da organização de análise marítima SeaLight, afiliada à Universidade de Stanford, destaca que as ações chinesas seguem um padrão adotado por Beijing em outras disputas territoriais na região, como no Mar da China Oriental e no Mar da China Meridional.

Cenário futuro

Seul tem reagido ao aumento da presença chinesa em suas águas, intensificando sua resposta às incursões de barcos pesqueiros considerados ilegais. No ano passado, a Guarda Costeira sul-coreana expulsou diversas embarcações chinesas da região, apreendeu algumas e confiscou suas cargas.

“As crescentes atividades pesqueiras e os exercícios militares da China na ZEE da Coreia do Sul podem ser usados para consolidar sua presença no Mar Ocidental e ganhar vantagem nas negociações fronteiriças”, avaliou Dong Gyu Lee.

Além disso, a movimentação chinesa ocorre em um contexto de aumento das tensões entre Beijing e Washington, o que pode ter reflexos na segurança marítima da região.

Até o momento, as autoridades sul-coreanas não fizeram comentários públicos sobre as recentes patrulhas da Guarda Costeira chinesa.

Cenário de escalada

Embora a disputa pelo Mar Amarelo seja historicamente menos acirrada do que as tensões envolvendo as Filipinas, analistas alertam que a China pode intensificar sua presença caso as relações com os Estados Unidos, aliado da Coreia do Sul, se tornem ainda mais conturbadas.

Em uma análise publicada em 2021, Chungjin Jung, tenente-coronel da Força Aérea da Coreia do Sul e acadêmico visitante no Centro de Estudos de Segurança Ásia-Pacífico, observou: “Diante da postura assertiva da China em relação à soberania e aos direitos marítimos, é incerto quais medidas ofensivas Pequim pode adotar contra a Coreia no futuro”.

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