Nova lei contra espionagem implementada na China atinge empresários e jornalistas

Para analistas, medida deliberadamente abraça a ambiguidade, permitindo que seja usada para reprimir qualquer ameaça ao regime

A China implementou recentemente uma nova lei de relações exteriores que amplia a definição de espionagem, aumentando a complexidade e os desafios para jornalistas e empresários estrangeiros que desejam operar com segurança no país. As informações são da rede Radio Free Asia.

A medida, que passou a valer no sábado passado (1º), parece ter como objetivo fornecer uma base legal para punir indivíduos e organizações que representem uma ameaça aos interesses chineses. Isso pode incluir ações que sejam interpretadas como tentativas de “eliminar riscos” ou “desvincular-se”, de acordo com o que foi veiculado pela mídia estatal.

Além disso, a lei é vista como uma tentativa de fornecer uma estrutura legal para a visão de mundo do presidente chinês, Xi Jinping. Ela abrange duas das principais iniciativas de política externa de Xi: a Iniciativa de Segurança Global e a Iniciativa de Civilização Global.

O emblema nacional da República Popular da China pendurado na  Praça da Paz Celestial (Foto: WikiCommons)

O decreto estende a definição de espionagem, incluindo o acesso a documentos, dados, materiais ou itens relacionados à segurança e interesses nacionais. Essa ampla abrangência gerou preocupações entre especialistas, como Cedric Alviani, da ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que afirmou que a lei abarca “praticamente qualquer tipo de informação”.

A lei foi aprovada pelo comitê permanente do Congresso Nacional do Povo poucos dias antes do 102º aniversário do Partido Comunista Chinês (PCC), que ocorreu no sábado passado.

Essas alterações na lei de contraespionagem chinesa foram propostas inicialmente no final de abril deste ano, coincidindo com ataques a empresas estrangeiras em Xangai e Beijing. Empresas como a consultoria de gestão dos EUA Bain and Co. e a empresa de due diligence – especializada em realizar investigações detalhadas para avaliar a integridade, riscos e conformidade legal de uma entidade ou negócio – norte-americana Mintz foram particularmente afetadas.

Durante uma entrevista coletiva, Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, afirmou que não há motivo para relacionar a nova lei de contraespionagem às atividades de reportagem de jornalistas estrangeiros.

Mao destacou que a China sempre recebe com satisfação meios de comunicação e jornalistas de todos os países para conduzirem entrevistas e publicarem histórias em conformidade com as leis e regulamentos vigentes. Ele assegurou que Beijing fornecerá facilidades e assistência aos jornalistas, desde que respeitem as leis e regulamentos do país.

“Desde que a pessoa cumpra as leis e regulamentos, não há necessidade de se preocupar”, enfatizou Mao.

Os analistas, por sua vez, afirmam que as designações de “segredos de Estado” e “atividades que prejudicam a ordem social” são tão vagas que torna-se desafiador determinar como evitar ser acusado de violar tais diretrizes.

Nova ordem mundial

Especialistas jurídicos questionam se a nova lei pode ser usada para suprimir opositores e banir indivíduos, dado o histórico da China nesse sentido. Eles acreditam que a medida busca justificar a resistência do país a um sistema internacional considerado tendencioso em relação ao seu desenvolvimento e ascensão.

Suisheng Zhao, professor da Escola de Estudos Internacionais Josef Korbel, da Universidade de Denver, descreveu a lei como uma ampla legitimação legal do objetivo proclamado pelo presidente chinês, Xi Jinping, de estabelecer uma nova ordem mundial pós-ocidental.

“É uma personificação da política externa chinesa por meio de um processo legal”, deixando claro que “o partido é responsável pela política externa, enquanto o Ministério das Relações Exteriores e o Conselho de Estado são as instituições responsáveis pela implementação”, afirmou Zhao.

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