China expande força militar e desafia equilíbrio de poder no Indo-Pacífico, dizem analistas

Marinha chinesa avança como peça-chave na estratégia de dominação regional, enquanto arsenal nuclear cresce de forma acelerada

A China está reformulando o cenário militar global, ao estabelecer sua Marinha com a maior do mundo, com mais de 370 navios, e ao desenvolver um arsenal nuclear que já conta com mais de 600 ogivas. Segundo o relatório anual do Pentágono, o Departamento de Defesa dos EUA, Beijing acelera sua modernização militar para consolidar uma força de classe mundial até 2049, levantando preocupações sobre o equilíbrio de poder no Indo-Pacífico.

O documento do governo norte-americano destaca que o avanço militar chinês coloca em risco inclusive a presença militar norte-americana na região, destacando que milhares de mísseis chineses poderiam atingir pistas de pouso em locais estratégicos, como Japão e Guam, em caso de uma guerra.

“As bases militares americanas desprotegidas são altamente vulneráveis a ataques precisos, mesmo que limitados em escala. Apenas dez mísseis poderiam neutralizar aeronaves e estoques de combustível em locais críticos, como a base de Iwakuni, no Japão”, diz o relatório.

Soldados do Exército de Libertação Popular da China (Foto: WikiCommons)

Alex Luck, analista naval baseado na Austrália ouvido pela revista Newsweek, destaca a modernização naval como um dos principais pilares da estratégia chinesa. Segundo ele, em apenas duas décadas, a China transformou sua frota de uma força voltada para defesa costeira em uma Marinha de águas profundas capaz de operar globalmente.

“O único elemento ausente até agora é o crescimento acelerado da frota de submarinos nucleares, embora sinais de mudança já estejam surgindo”, afirmou Luck.

O relatório do Pentágono também ressalta a ampliação do alcance operacional da Marinha chinesa, que agora ultrapassa as águas do Leste Asiático e alcança distâncias cada vez maiores. Essa evolução, combinada ao crescimento do arsenal nuclear, levanta questionamentos sobre o compromisso de Beijing com sua política de não usar armas nucleares como primeiro recurso.

Kitsch Liao, diretor associado do Global China Hub do Atlantic Council, alerta que a China está cada vez mais disposta a abandonar sua política de não iniciar ataques nucleares sob certas condições. “Existe uma combinação perigosa entre a disposição potencial da China para chantagem nuclear e seu poder militar convencional”, afirmou.

O arsenal de destruição em massa chinês também foi citado pelo especialista em relações EUA-China David Sacks, em artigo para o think tank Council of Foreign Relations. Ele destaca que, além de aumentar a quantidade de armas à disposição, Beijing aprimora todos os elementos de sua tríade.

Sacks cita em seu texto o investimento em mísseis balísticos intercontinentais (ICBMs) “novos e mais resistentes”, em submarinos com mísseis balísticos que podem alcançar os Estados Unidos em sua porção continental, em novos bombardeiros nucleares e até em uma opção de lançamento ferroviário móvel.

“A China também está desenvolvendo sistemas de bombardeio orbital fracionado e veículos de deslizamento hipersônico, possuindo agora ‘o maior arsenal de mísseis hipersônicos do mundo'”, disse Sacks. “A prontidão da China está melhorando”, complementou.

Armas nucleares contra Taiwan

O relatório do Pentágono aponta que Beijing poderia considerar o uso das armas nucleares caso uma derrota militar convencional em Taiwan ameaçasse gravemente o regime comunista. A China não renuncia ao uso da força contra a ilha, que considera uma província rebelde, intensificando as tensões na região.

Apesar das declarações oficiais de Beijing sobre o caráter defensivo de sua política militar, especialistas questionam as verdadeiras intenções do país. “Somente uma forte aliança liderada pelos EUA pode impedir que o Indo-Pacífico mergulhe em um conflito”, disse Liao.

Além de Taiwan, a crescente presença militar chinesa também coloca em alerta aliados tradicionais dos Estados Unidos, como Japão, Austrália e Coreia do Sul. Esses países têm fortalecido parcerias estratégicas e aumentado investimentos em defesa para conter o avanço de Beijing na região.

Ainda segundo o relatório, a modernização militar chinesa é comparável à expansão da Marinha soviética entre as décadas de 1960 e 1980. Essa comparação reflete não apenas o ritmo acelerado do desenvolvimento militar, mas também as implicações geopolíticas que ele traz para o equilíbrio de poder global.

Com o Indo-Pacífico definido como prioridade estratégica pelos Estados Unidos, o avanço militar de Beijing reforça a necessidade de articulações multilaterais na região. No entanto, permanece a dúvida sobre até onde a China está disposta a ir para alcançar seus objetivos, especialmente em relação a Taiwan e ao domínio das rotas marítimas globais.

Sacks avalia que nem os frequentes casos de corrupção permitem minimizar o projeto militar de Beijing, particularmente a unificação com a ilha. Segundo ele, “seria um erro focar nesse tema em detrimento dos significativos avanços que a China claramente está fazendo em direção à construção de um exército altamente moderno e capaz, que pode ameaçar os Estados Unidos, seus aliados e parceiros.”

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