China leva diplomatas aliados ao Tibete em mais uma tentativa de mascarar abusos

Visita de representantes de países autoritários teve como objetivo retratar os tibetanos desfrutando de direitos e liberdade

O governo chinês recebeu recentemente um grupo de embaixadores da ONU (Organização das Nações Unidas) em uma visita ao Tibete, que ocorreu antes da revisão programada para 2024 do histórico de direitos humanos da China pelo organismo internacional. A visita chama atenção pelo fato de que os diplomatas representavam países aliados ao gigante asiático, como Cuba, Venezuela, Nicarágua, Belarus e Paquistão. As informações são da rede Radio Free Asia.

As imagens da visita, realizada entre os dias 28 e 30 de agosto, foram compartilhadas no X, antigo Twitter. Segundo Tenzin Dawa, diretor do Centro Tibetano para os Direitos Humanos e a Democracia, todos os membros desse grupo pertencem a nações autoritárias com fortes laços econômicos com a China. Visita semelhante é feita habitualmente a Xinjiang, onde Beijing igualmente é acusada de praticar abusos e usa diplomatas estrangeiros para tentar disseminar uma imagem favorável do regime.

No caso do Tibete, Dawa disse que a intenção clara por trás da visita é igualmente retratar a região, conhecida como “Telhado do Mundo“, como um local onde a população desfruta de “direitos humanos e liberdade”. E acrescentou que isso ocorre à luz da próxima revisão pública do histórico de direitos humanos da China programada o ano que vem.

“Uma vez que os Estados-Membros da ONU irão examinar publicamente o histórico de direitos humanos da China no início de 2024, como parte de um processo de revisão no Conselho de Direitos Humanos em Genebra, esta visita organizada pelo governo chinês visa claramente retratar um Tibete onde, a China acredita, os tibetanos gozam de direitos humanos e de liberdade”, disse ela.

O Palácio de Potala, local sagrado para os budistas tibetanos, foi um dos locais visitados pelos diplomatas (Foto: Antoine Taveneaux/Wikimedia Commons)

A visita ocorreu em um momento em que as políticas da China no Tibete têm recebido críticas crescentes. Na região, as autoridades limitam as atividades políticas dos tibetanos e restringem a expressão pacífica de sua identidade cultural e religiosa. Os tibetanos frequentemente relatam discriminação e violações dos direitos humanos por parte das autoridades chinesas, alegando que essas políticas visam suprimir sua identidade nacional e cultural.

Durante a visita, os diplomatas exploraram locais importantes, como o Templo Jokhang, o Palácio Potala, o Mosteiro Sera e uma escola secundária em Lhasa, a capital da Região Autônoma do Tibete.

Juan Antonio Quintanilla Roman, representante permanente de Cuba em Genebra, expressou pelo X sua gratidão pela visita a uma escola em Lhasa, destacando a importância da educação para o governo chinês e observando que mais de mil estudantes recebem “uma educação de qualidade enquanto preservam a cultura tibetana”.

O Conselho de Direitos Humanos programa revisar o histórico de direitos humanos da China durante a quarta Revisão Periódica Universal, que acontecerá em Genebra, Suíça, no início de 2024.

Atualmente, Cuba e Paquistão fazem parte dos 47 membros do conselho, mas seus mandatos estão prestes a expirar no final deste ano. Venezuela, Nicarágua e Belarus não são integrantes, mas a China espera que esses países, como aliados próximos, ofereçam seu apoio diante das prováveis acusações que enfrentará.

Em maio, especialistas em direitos humanos da ONU expressaram preocupação com a possibilidade de programas obrigatórios de formação profissional e transferência de mão de obra na Região Autônoma do Tibete terem um impacto negativo nos direitos humanos dos tibetanos, semelhante à situação dos uigures em Xinjiang, de acordo com a RFA.

Em agosto, os Estados Unidos anunciaram planos de impor sanções de visto contra as autoridades chinesas responsáveis pela assimilação forçada de mais de um milhão de crianças tibetanas em internatos estatais.

Por que isso importa?

As questões históricas e de direitos humanos entre a China e o Tibete envolvem um conflito de longa data relacionado à soberania e à cultura.

A ocupação chinesa em uma das regiões mais fechadas e politicamente sensíveis do país começou em 1950, quando as tropas do ELP (Exército de Libertação Popular) invadiram o Tibete e assumiram o controle em um episódio que se convencionou chamar de “libertação pacífica”. Na ocasião histórica, a artilharia esmagou a resistência tibetana, executou os guardas do líder espiritual e destruiu mosteiros de Lhasa. Diante do cenário de destruição, o 14º Dalai Lama Tenzin Gyatso fugiu para a Índia.

Já as preocupações de direitos humanos incluem a supressão da identidade cultural e religiosa tibetana, restrições à liberdade de expressão e detenções arbitrárias.

Além disso, a China implementou políticas de assimilação cultural, incluindo a transferência forçada de tibetanos para programas de formação profissional e internatos estatais, semelhantes ao que tem sido denunciado em Xinjiang em relação aos uigures. Essas políticas geraram preocupações internacionais e críticas de organizações de direitos humanos.

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