Dois anos após a publicação do relatório sobre os abusos cometidos pela China na região de Xinjiang, em 31 de agosto de 2022, uma atualização foi feita pelo Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) na terça-feira (27), durante coletiva de imprensa. Em síntese, o órgão disse que “muitas leis e políticas problemáticas permanecem em vigor” contra os uigures e outras comunidades predominantemente muçulmanas.
De lá para cá, o Alto Comissariado relatou ter continuado dialogando com o governo da China sobre várias questões importantes, como leis e políticas antiterrorismo, justiça criminal, e outras políticas que afetam os direitos humanos de minorias étnicas e religiosas. Essas discussões também abordaram a situação na Região Autônoma Uigur de Xinjiang, na Região Autônoma do Tibete, e a situação de igualdade e não discriminação, além de questões de segurança nacional e direitos humanos em Hong Kong.
As políticas da China em Xinjiang têm gerado tensões contínuas com a comunidade internacional. O governo chinês foi acusado de prender mais de um milhão de uigures em Xinjiang, com algumas acusações de genocídio, o que Beijing rejeita firmemente. A China afirma que as medidas são essenciais para enfrentar o extremismo, o terrorismo e o separatismo.
Em junho deste ano, uma equipe de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) visitou a China para discutir políticas antiterrorismo e o sistema de justiça criminal. A equipe destacou que, em Xinjiang, muitas leis e políticas problemáticas ainda existem. Diante desse cenário, a ONU pediu uma revisão das leis de segurança nacional e antiterrorismo, maior proteção para as minorias contra a discriminação e uma investigação completa das alegações de violações de direitos humanos, como tortura.
A atualização também destacou a necessidade de uma investigação completa sobre as alegações de violações de direitos humanos e tortura. O ACNUDH enfrenta dificuldades devido ao acesso restrito às informações em Xinjiang e ao risco de represálias contra quem interage com as Nações Unidas. A porta-voz Ravina Shamdasani comentou que, apesar desses desafios, o monitoramento da situação dos direitos humanos continua sendo uma prioridade.
Em comunicado, Shamdasani, afirmou: “Esperamos manter nosso engajamento ativo com o governo e a sociedade civil para alcançar avanços significativos na proteção dos direitos humanos na China”. E acrescentou: “continuamos a monitorar de perto a situação dos direitos humanos no país, apesar das dificuldades devido ao acesso limitado à informação e ao medo de represálias contra quem interage com as Nações Unidas. Continuamos a apresentar ao governo casos de preocupação específica, solicitando que tomem medidas imediatas para libertar indivíduos detidos arbitrariamente e esclarecer o estado e paradeiro daqueles sobre os quais suas famílias buscam informações”.
Resposta chinesa
Durante coletiva de imprensa do Ministério das Relações Exteriores da China na quarta-feira (28), o porta-voz Lin Jian destacou que a China coloca o povo no centro de suas ações, vê o respeito e a proteção dos direitos humanos como aspectos essenciais da governança, e tem feito progressos significativos nesse campo.
“A China está disposta a se envolver em trocas e cooperação construtivas” com o ACNUDH, mas acrescentou que uma revisão deve ser conduzida “com base no respeito mútuo”.
Lin afirmou que o ACNUDH deve agir de forma justa, objetiva, “respeitando a soberania dos países e cooperando com eles”. Ele destacou que Xinjiang está vivendo um período de “estabilidade social e crescimento econômico, com todas as etnias trabalhando juntas para uma vida melhor”, repercutiu a rede Voice of America (VOA).
Por que isso importa?
A província de Xinjiang faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.
Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.
Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.
O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.
A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.