França emite mandado de prisão para presidente sírio por crimes de guerra

Bashar al-Assad enfrenta acusações de cumplicidade em crimes contra a humanidade ligados a ataques químicos ocorridos em 2013

Na quarta-feira (15), um tribunal francês emitiu um mandado de prisão internacional contra o líder sírio, Bashar al-Assad, por sua suposta cumplicidade em crimes de guerra relacionados a ataques com armas químicas contra civis, conforme informado por fontes judiciais e demandantes no caso.

O mandado também se estende a dois altos funcionários do governo e o irmão de Assad, Maher al-Assad, comandante de uma unidade militar de elite. Este último é acusado pelo seu envolvimento na utilização de gás sarin, um agente nervoso altamente tóxico, em dois ataques ocorridos em agosto de 2013, resultando na morte de mais de mil pessoas, incluindo centenas de crianças.

Ativistas de direitos humanos aplaudiram o que consideram um “momento histórico”, já que é a primeira vez que uma nação emite um mandado de prisão por crimes contra a humanidade contra um chefe de Estado em exercício em outro país.

Presidente sírio Bashar al-Assad durante visita à Rússia em 2015 (Foto: WikiCommons)

A decisão foi descrita como “sem precedentes” pelo advogado sírio de direitos humanos, Anwar al-Bunni, fundador do Centro Sírio para Mídia e Liberdade de Expressão (SCM, da sigla em inglês), parte civil no caso, em entrevista à CNN.

Agora, um alerta vermelho da Interpol é aguardado, conforme indicado por Michael Chammas, advogado sírio com conhecimento do caso, em declarações à CNN na Alemanha.

Quando um alerta vermelho é emitido, ele contém informações sobre a pessoa procurada, como sua identidade, fotografia, detalhes do crime e informações sobre o mandado de prisão. Este aviso é distribuído para as autoridades policiais de todos os países membros da Interpol, solicitando assistência na localização e detenção do indivíduo até que processos legais, como extradição, possam ser iniciados.

Chammas ressaltou que todos os Estados-membros da Interpol deveriam cumprir o mandado de prisão.

A emissão de mandados de prisão pelo poder judiciário francês contra Assad e seus associados é considerada um marco pelo advogado Mazen Darwish, fundador e diretor-geral do SCM. Darwish destaca que essa ação representa “uma vitória para as vítimas, suas famílias e os sobreviventes”, além de ser “um passo significativo em direção à busca por justiça” e à promoção de uma “paz sustentável” na Síria, segundo repercutiu o jornal The Guardian.

Desde abril de 2021, juízes investigadores da divisão de crimes contra a humanidade do tribunal judicial de Paris têm conduzido investigações sobre os ataques químicos na Síria. A investigação foi iniciada em resposta a uma queixa apresentada por três organizações de parte civil: o SCM, a Open Society Justice Initiative (OSJI) e Arquivo Sírio (SA, da sigla em inglês), este último um projeto sírio que documenta violações dos direitos humanos e outros crimes ocorridos na Síria.

Gás venenoso

Em 21 de agosto de 2013, o governo sírio foi acusado de usar gás sarin em Ghouta, nos arredores de Damasco. O ataque resultou na morte de centenas de civis, incluindo crianças.

A comunidade internacional responsabilizou o governo sírio pelo uso de armas químicas, o que levou a pressões diplomáticas e discussões sobre intervenção militar, mas, posteriormente, a Síria concordou em destruir seu arsenal químico sob supervisão internacional.

Posteriormente, uma investigação foi iniciada em resposta a uma denúncia criminal fundamentada no depoimento de sobreviventes dos ataques.

O governo sírio, acusado há muito tempo de crimes de guerra, mantém sua posição ao afirmar que seus ataques visam “terroristas” e nega categoricamente o uso de armas químicas. Em 2017, Assad declarou que o governo sírio nunca utilizou seu arsenal químico na história, enfatizando que moralmente seria inaceitável.

Porém, no mesmo ano, o governo da Síria também teria usado os gases sarin e cloro em ao menos três ataques coordenados em Ltamenah, região central do país, segundo a Opaq (Organização para a Proibição de Armas Químicas), que atingiram ao menos cem pessoas.

Já em 2018, pelo menos um helicóptero das forças sírias jogou dois cilindros amarelos contendo gás cloro tóxico em dois prédios de apartamentos em uma área habitada por civis em Douma, que fica a 10 quilômetros da capital, Damasco. Pelo menos 43 pessoas morreram.

Os gases usadas pela Síria nessas ocasiões foram banidos em 1997 pela Convenção de Armas Químicas.

Por que isso importa?

A guerra civil da Síria, que já dura mais de 11 anos, opõe Rússia e Irã, aliados de al-Assad, à Turquia, que apoia os rebeldes do Exército Livre da Síria (ELS) na luta contra o governo.

A oposição apoiada pelos turcos e por líderes ocidentais exige a queda de al-Assad, a quem acusa de crimes contra a humanidade. Apoiadores do presidente, por outro lado, criticam o que consideram uma interferência de Washington com o intuito de derrubar o presidente.

Após sofrer duras perdas no início do conflito, as forças de al-Assad conseguiram reconquistar território graças à ajuda de seus aliados. A última região com forte presença da oposição armada inclui áreas da província de Idlib e partes das províncias vizinhas de Aleppo, Hama e Latakia.

Em 2020 foi estabelecida uma trégua intermediada por Rússia e Turquia, incluindo os rebeldes e as forças do governo, enquanto grupos extremistas como o Estado Islâmico (EI), ainda ativo na Síria, não fazem parte do pacto..

Desde então, Ancara conseguiu consolidar sua influência no norte do país, o que inicialmente ajudou a evitar uma nova etapa de combates e controlou o fluxo de refugiados. Porém, o governo turco retomou recentemente as operações militares, gerando insatisfação dos dois lados, tanto dos EUA quanto da Rússia.

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