Imprensa ucraniana pró-Rússia encobre a agressão de Moscou, afirma especialista

Disseminação de reportagens enganosas aumentou após conversa entre Putin e Biden no último dia 7, segundo Olga Yurkova

A mídia ucraniana pró-Rússia estaria encobrindo as ameaças e agressões de Moscou contra Ucrânia, segundo uma perita em fact checking (checagem de fatos). Durante evento em Kiev, Olga Yurkova disse que o fato pôde ser observado particularmente com a disseminação de reportagens enganosas sobre a última reunião virtual do dia 7 de dezembro entre os presidentes Joe Biden e Vladimir Putin, que abordou as tensões relacionadas à possível invasão russa aos seus vizinhos do sul, relatou a agência estatal Ukrinform.

Yurkova é especialista em mídia baseada na Ucrânia e cofundadora do watchdog StopFake e participou nesta semana de um painel de discussão que abordou a questão.

“Durante as duas últimas semanas, desde a conversa de Putin com Biden, pesquisamos publicações da mídia pró-Rússia na Ucrânia, como a Strana.UA, plataformas online e canais de TV NewsOne. Quais narrativas surgiram ao longo desse período? Eles [a mídia] afirmam que o Ocidente ou os Estados Unidos estão por trás da escalada, ou seja, os Estados Unidos estão estressando a Ucrânia com informações, provocando-nos a provocar a Rússia”, analisa Yurkova.

Olga Yurkova durante conferência “Por dentro da luta contra o império de notícias falsas da Rússia” (Foto: TED Talks/Reprodução Twitter)

Segundo ela, a segunda narrativa mais comum da mídia pró-Moscou é a de que o governo ucraniano é incapaz de defender a Ucrânia “porque é muito fraco”. “Às vezes, surgem relatos de que [o legislador pró-Rússia, Viktor] Medvedchuk sabe como resolver esse problema, mas continua em prisão domiciliar. Além disso, as tentativas de desacreditar o presidente Volodymyr Zelensky fazem parte de retórica padrão”, disse a perita.

A analista observa que tanto a mídia russa quanto a ucraniana pró-Rússia sustentam essa mesma retórica há sete anos, intensificando certas narrativas e colocando outras em segundo plano. “Eles estão alegando agora que Zelensky está deliberadamente provocando uma escalada para desviar a atenção dos problemas existentes na Ucrânia. Isto é, porque temos problemas internos, estamos deliberadamente provocando a Rússia a escalar”, avalia Yurkova.

Yurkova também revela a existência de notícias divulgadas por esses canais que dão conta de que Kiev se transformaria em uma nova Cabul. “E há também a afirmação de que a Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte] não lutará pela Ucrânia, que se tornará um ‘Afeganistão 2.0’, embora a situação seja diferente aqui e seja impossível comparar. Há também uma narrativa que afirma que a Ucrânia está violando acordos, e que deve ser obrigada a cumpri-los”, salienta.

Por que isso importa?

A Rússia apoia os separatistas ucranianos que enfrentam as forças de Kiev na região leste da Ucrânia desde abril de 2014. O conflito armado, que já matou mais de dez mil pessoas, opõe o governo ucraniano às forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que formam a região de Donbass.

O conflito fez aumentar a tensão entre os dois países, que já era alta desde a anexação da Crimeia pela Rússia. Em 2021, a situação ficou especialmente delicada, com a ameaça de uma invasão russa à Ucrânia.

Washington tem monitorado o crescimento do exército russo na região fronteiriça e compartilhou informações de inteligência com seus aliados. Os dados apontam um aumento de tropas e artilharia russas que permitiriam um avanço rápido e em grande escala, bastando para isso a aprovação de Putin e a adoção das medidas logísticas necessárias.

Especialistas calculam que a Rússia tenha entre 70 mil e 100 mil soldados nas proximidades da Ucrânia, sendo necessária uma força de 175 mil para invadir, além de mais combustível e munição. Conforme o cenário descrito pela inteligência dos EUA, as tropas russas invadiriam o país vizinho pela Crimeia e por Belarus.

Um eventual conflito, porém, não seria tão fácil para Moscou como os anteriores. Isso porque, desde 2014, o Ocidente ajudou a Ucrânia a desenvolver e ampliar suas forças armadas, com fornecimento de armamento, tecnologia e treinamento. Assim, embora Putin negue qualquer intenção de lançar uma ofensiva, se isso ocorrer, as tropas russas enfrentariam um exército ucraniano muito mais capaz de resistir.

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