Migrantes pagaram oito mil euros para viajar em barco que naufragou na Itália

Investigação está em andamento para identificar os contrabandistas que organizaram a viagem que matou mais de 60 pessoas

A travessia marítima entre Turquia e Itália que matou ao menos 65 pessoas no último final de semana, quando uma pequena embarcação de madeira naufragou perto da costa italiana, custou oito mil euros (R$ 44,3 mil) a cada uma das pessoas a bordo. A informação é da agência Associated Press (AP).

Uma investigação está em andamento para identificar os contrabandistas que organizaram a viagem e lucraram com ela. Na embarcação havia pessoas de várias nacionalidades, como iraquianos, sírios, afegãos, somalis, paquistaneses e iranianos.

As autoridades da cidade de Crotone, a mais próxima do local do naufrágio, estão conduzindo o caso e já identificaram três indivíduos acusados de participar do esquema, sendo um paquistanês e dois turcos. Um quarto suspeito, também da Turquia, está desaparecido.

Migrantes recuperados em travessia pelo Mar Mediterrâneo em 2019 (Foto: Acnur/F. Malavolta)

A embarcação partiu do porto turco de Izmir e naufragou ao se chocar com uma formação rochosa devido ao mau tempo. Ao menos 80 pessoas sobreviveram porque conseguiram nadar até Steccato di Cutro, um balneário na costa leste da Calábria.

Até agora, 65 mortes foram registradas, sendo que 14 das vítimas eram menores de idade. Porém, a expectativa é de que mais corpos sejam encontrados, vez que o barco tinha entre 180 e 200 pessoas quando deixou a Turquia.

Nova lei dificulta resgate

O acidente foi registrado dias depois de o governo italiano multar um navio operado pela ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) em dez mil euros (R$ 55,3 mil) por ter oferecido ajuda a um grupo de 48 migrantes e refugiados em perigo no Mediterrâneo.

Embarcações de ajuda humanitária habitualmente passam dias no Mediterrâneo para oferecer ajuda a pessoas que tentam chegar à Europa em pequenos barcos, colocando suas vidas em risco. Isso levou o governo italiano a adotar uma lei que prevê punição pesada e quem tentar ajudar os migrantes.

Aprovada em dezembro do ano passado, a legislação em vigor prevê multas de até 50 mil euros aos capitães dos navios que atuarem de forma irregular no resgate. Em caso de reincidência, a embarcação pode ser apreendida.

A ação do governo italiano, comandado pela primeira-ministra de direita Giorgia Meloni, gerou críticas de Volker Turk, alto comissário da ONU (Organização das Nações Unidas) para os direitos humanos. “Esta é simplesmente a maneira errada de lidar com esta crise humanitária”, disse ele.

Até a Igreja Católica entrou no debate, afirmando que as medidas violam o direito internacional e devem ser abandonadas pela Itália.

Itália se defende

Após o naufrágio do final de semana, Matteo Piantedosi, ministro do Interior italiano, negou que essa política repressiva de seu governo tenha adiado ou até mesmo impedido o resgate dos migrantes que morreram no naufrágio. “Tudo o que foi possível foi feito em condições de mar absolutamente proibitivas”, disse ele ao jornal Corriere della Sera.

O ministro acrescentou: “Não há ligação entre as novas regras e o possível aumento de mortes no mar. Na rota operada pelas ONGs, não ocorreu nenhum fato que não tenha sido adequadamente tratado pela Capitania e pela Guarda de Finanças (polícia especial italiana subordinada diretamente ao ministro de Economia e das Finanças)”.

Já a Frontex, agência de fronteiras da União Europeia (UE), afirmou que a Guarda Costeira italiana enviou dois navios-patrulha para interceptar a embarcação em perigo na noite de sábado (25), mas ambos tiveram que retornar devido ao mau tempo.

Além de alegar inocência no caso, o governo italiano cobra uma mudança de postura das demais nações europeias na questão da migração ilegal. A alegação é de que, ao contrário do que prometem, esses países não assumem a responsabilidade de aceitar uma parte dos imigrantes que buscam asilo na Itália, muitas vezes chegando ao país por rotas marinhas perigosas.

O acordo, segundo Piantedosi, prevê que cerca de oito mil pessoas sejam absorvidas pelos demais países da UE, sendo a Alemanha o principal destino. No entanto, o ministro diz que, entre junho de 2022 e fevereiro de 2023, apenas 387 foram realmente transferidas.

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