ONU contesta nova lei e insta Espanha a proteger vítimas de violência sexual

Em abril, pelo menos 943 de quatro mil responsáveis por violência sexual, sentenciados e presos, receberam redução da pena

Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News

A relatora especial designada pela ONU (Organização das Nações Unidas) para violência contra mulheres e meninas, Reem Al Salem, disse estar apreensiva com os efeitos de uma nova lei sobre consentimento sexual que vem sendo debatida na Espanha. Em nota, ela desataca negativamente a possibilidade de o país reduzir as penas impostas a pessoas condenadas pelo crime.

Para Al Salem, a Espanha não pode recuar nesse tema. O governo e suas instituições devem “supervisionar o impacto real da liberdade antecipada” de autores de violência na vida das vítimas.

Em abril, pelo menos 943 de quatro mil responsáveis por violência sexual, sentenciados e presos, receberam redução da pena. O fato aconteceu após a aprovação da Lei Orgânica de garantia integral de liberdade sexual, segundo dados do Conselho Geral do Poder Judicial.

Quanto à chamada lei “Só Sim é Sim”, a especialista expressou preocupação com a falta de recursos para garantir que haja uma aplicação correta.

Para Al Salem, os efeitos negativos da mudança na lei de consentimento sexual superam os positivos, desde medidas preventivas para combater o crime, reconhecimento dos direitos das vítimas e facilitação do acesso delas aos recursos, destacando “a obrigação do Estado de fornecer assistência jurídica e médica com garantias do direito à reparação”.

Estima-se que um terço das vítimas de violência sexual na Espanha não recebeu nenhuma indenização. Metade não teve qualquer compensação prevista nas sentenças declaradas pelos tribunais aos agressores.

Prédio do Tribunal Supremo de Madrid, na Espanha (Foto: WikiCommons)
Acabar com a violência  e combater crimes

Para a relatora, num país com uma alta taxa de feminicídios, baixar penas de culpados por atos de violência sexual é passar uma mensagem errônea sobre prioridades do Estado para acabar com a violência e combater crimes.

A especialista acredita que as consultas sobre o projeto de lei deveriam ter mais tempo em vez de se recorrer a uma aprovação apressada, devido à importância da lei e a suas implicações de longo prazo para as vítimas de violência sexual.

Para Al Salem, o uso do consentimento ou não como ônus da prova perde sentido, e em muitas situações pode fazer com que esse encargo recaia sobre as vítimas, não sobre os agressores. Ela lembra que algumas mulheres até receberam multas em casos como exploração sexual, abuso, prostituição e pornografia.

Descrição mais clara da palavra gênero

A relatora especial elogiou o presidente do governo espanhol por se ter se desculpado, publicamente, pelo impacto involuntário da nova lei.  

Mas ela enfatiza que a revisão da Lei Orgânica de 27 de abril de 2023 restaurou níveis de castigo para os delitos sexuais e de gênero contra as mulheres e menores de idade que existiam no Código Penal antes de introduzir a nova.

Al Salem recomendou que a norma incluísse uma descrição mais clara da palavra gênero, que fosse ao encontro do padrão internacional de direitos humanos, além de uma distinção mais clara na lei entre os termos “sexo” e “gênero”.

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