Putin segue firme no poder, mas insatisfação com a guerra tem aumentado no Kremlin, diz analista

Ex-chefe da inteligência da Estônia afirma que "tensões estão crescendo", e decisões do presidente não são mais unanimidade

As decisões mais recentes do presidente Vladimir Putin em relação à guerra da Ucrânia têm desagradado pessoas importantes dentro do governo russo, bem como oligarcas aliados. Quem afirma é Mikk Marran, ex-chefe da inteligência da Estônia, país vizinho à Rússia e membro da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), que concedeu entrevista à revista Newsweek.

“Acho que as tensões estão crescendo. Definitivamente, podemos ver alguns sinais aí”, disse Marran. “Houve funcionários no governo que foram muito críticos ou contra a guerra. Não posso dizer seus nomes, mas havia, e há, funcionários dentro do Kremlin que são totalmente contra a guerra”.

A declaração da autoridade estoniana não chega a ser novidade. Entretanto, em sua análise, ele põe mais luz sobre a questão ao dizer que o poder do presidente russo não está ameaçado, apesar da oposição crescente. “Acho que, durante meus dias no serviço e até agora, Putin mantém um bom controle do poder”, analisou.

Vladimir Putin, presidente da Rússia, em janeiro de 2021: guerra não é unanimidade (Foto: WikiCommons)

No final de dezembro de 2022, o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW, da sigla em inglês), um think tank de defesa com sede nos EUA, afirmou que Putin está “provavelmente preocupado” com a falta de apoio entre as elites russas.

Na ocasião, a entidade analisou o comportamento do presidente em uma entrevista concedida à mídia estatal e tirou algumas conclusões. Uma fala que chamou a atenção deu a entender que as decisões dele não eram mais unânimes entre antigos aliados.

“Não há nada de surpreendente no fato de algumas pessoas não agirem como verdadeiros patriotas”, disse Putin na entrevista. “Porque em qualquer sociedade sempre há pessoas que pensam em seus próprios interesses, ou seja, em seus próprios planos. Para ser honesto, não os julgo. Cada pessoa tem liberdade de escolha”.

Marran endossa a avaliação do ISW ao destacar que empresários influentes estão insatisfeitos com o desenrolar da guerra e com as decisões de Putin referentes a ela. Alguns inclusive deixaram a União Russa de Industriais e Empresários, um lobby que promove os interesses da comunidade empresarial local e teria um encontro com o presidente nesta semana.

“Também há oligarcas que não estão muito felizes com a guerra”, disse o ex-chefe da inteligência estoniana, que mais uma vez aposta na força do presidente. “Vemos algumas tensões, mas eu não diria que eles podem balançar muito o barco neste momento. O barco está balançando, mais ou menos, mas ainda assim, acho que Putin tem um bom controle do poder”.

Porém, o foco de insatisfação mais relevante está dentro do Kremlin. “Os oligarcas podem estar infelizes, mas ainda são empresários, preocupados com seus negócios”, disse Marran.

Nesse cenário, um nome que se destaca é o de Evgeny Prigozhin, que pode ser posicionado nos dois grupos. Embora seja empresário, ele ganhou força dentro do governo como chefe do Wagner Group, organização paramilitar que tem desempenhado papel crucial na guerra da Ucrânia, com dezenas de milhares de mercenários em ação.

Prigozhin entrou em rota de colisão com Putin ao atribuir ao Wagner Group algumas das conquistas militares russas no conflito. Depois, reclamou publicamente que seus mercenários não vinham recebendo munição do Ministério da Defesa. O presidente parece ter agido para reduzir o poder do antigo aliado, que mais recentemente disse ter sido excluído de todos os canais oficiais de comunicação com o Kremlin.

Quanto a isso, a analista política Tatiana Stanovaya escreveu um artigo que foi publicado em fevereiro pelo jornal independente The Moscow Times. E fez análise semelhante à de Marran. “Enquanto Putin for relativamente forte e capaz de manter o equilíbrio entre vários grupos de influência, Prigozhin não é perigoso”, disse ela no texto. “Mas a menor mudança poderia levar Prigozhin a desafiar as autoridades: talvez não o próprio Putin, a princípio”.

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