Russos detidos quando homenageavam Navalny dizem ter recebido intimação militar

Levados pelas autoridades quando depositavam flores ou visitavam monumentos, cidadãos correm o risco de ir à guerra

Desde a morte de Alexei Navalny, ocorrida na última sexta-feira (16), cerca de 400 pessoas foram presas em toda a Rússia por prestarem homenagens públicas ao rival mais proeminente do presidente Vladimir Putin. De acordo com o jornal independente The Moscow Times, as autoridades de São Petesburgo, palco do maior número de detenções, passaram a convocar os acusados para que se apresentem às Forças Armadas.

Ao menos seis pessoas que foram detidas quando depositavam flores em monumentos públicos relatam que receberam uma intimação militar, embora tenham sido libertadas.

“A intimação diz que os presos devem comparecer ao cartório de alistamento dentro de alguns dias para verificar seus dados e se inscrever no serviço militar”, disse o canal Rotonda, hospedado no aplicativo de mensagens Telegram.

Outro canal de Telegram, o RusNews, diz que três pessoas que dizem ter recebido a intimação foram forçadas a assinar. Um jovem afirmou que foi levado a uma sala fechada e ameaçado por um policial, que prometeu quebrar-lhe os dedos caso não assinasse.

Pedra Solovetsky, imagem de outubro de 1990: monumento pelas vítimas da repressão soviética concentra homenagens a Navalny em Moscou (Foto: Dmitry Borko/WikiCommons)

A repressão foi intensa contra os manifestantes que se arriscaram a depositar flores ou exibir fotos de Navalny em público. Algumas pessoas foram abordadas pela polícia simplesmente porque transitavam com buquês nas mãos, segundo o site OVD-Info, que monitora a repressão no país.

As autoridades também agiram rápido para retirar objetos depositados em locais escolhidos como pontos de homenagem em diversas cidades. Aqueles que escaparam das garras da polícia podem enfrentar problemas futuros. Pessoas vestidas com roupas civis fizeram fotos dos manifestantes, indício de que os denunciarão às autoridades.

Quem conseguiu prestar sua homenagem a Navalny sem ser incomodada pelas autoridades foi a embaixadora dos EUA em Moscou, Lynne Tracy. Protegida pela imunidade diplomática, ela depositou flores e se ajoelhou diante de um memorial improvisado na Pedra Solovetsky, monumento em memória das vítimas da repressão estatal nos tempos da extinta União Soviética.

Protestos seguros em memória do ativista morto também ocorreram no exterior. A rede Radio Free Europe (RFE) divulgou um vídeo com cenas de pessoas reunidas em frente a diversas embaixadas russas, com flores, velas e cartazes.

Manifestações foram registradas inclusive na Sérvia, um aliado da Rússia. Também foram coletadas imagens de protestos na Geórgia e na República Tcheca, cujos governos se opõem fortemente a Putin, e na Armênia, um antigo aliado que tem se afastado cada vez mais de Moscou.

A morte de Navalny

Navalny morreu no dia 16 de fevereiro no IK-3, onde cumpria pena de mais de 30 anos de prisão por acusações que sempre alegou serem politicamente motivadas. A informação foi divulgada pelo FSIN  (Serviço Penitenciário Federal, da sigla em russo) e posteriormente confirmada por aliados.

De acordo com a agência Reuters, o rival de Putin “se sentiu mal” e desmaiou ao caminhar no pátio da prisão. Uma ambulância chegou a ser chamada e “foram realizadas todas as medidas de reanimação necessárias, que não deram resultado positivo.” Então, ainda de acordo com o órgão prisional, “os médicos da ambulância constataram a morte do condenado.”

Quem foi Alexei Navalny

Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A rede dele chegou a ter 50 sedes regionais em toda a Rússia e, entre outras ações, denunciava casos de corrupção envolvendo o governo Putin e figuras importantes ligadas a ele. Isso levou o Kremlin a agir judicialmente para proibir a atuação do opositor, que então passou a ser perseguido.

Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado por violar uma sentença suspensa de 2014, sob acusação de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.

Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril, para protestar contra a falta de atendimento médico. Depois, em junho daquele ano, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e sua Fundação Anticorrupção (FBK) de funcionarem, classificando-os como “extremistas”.

Após a morte, retomou-se o debate sobre o retorno dele à Rússia, mesmo sabendo que seria preso e possivelmente morto pelo regime. A mulher dele, Yulia Navalnaya, disse que Navalny não pôde optar por uma vida tranquila no exílio porque “amava profundamente” a Rússia e acreditava no potencial do povo russo para um futuro melhor. Alegou ainda que o marido não apenas expressava essas convicções, mas as vivia intensamente, estando até mesmo disposto a sacrificar sua vida por elas.

Quando morreu, ele cumpria pena de 30 anos de prisão por acusações diversas, que vão desde fraude até extremismo, esta a mais grave. Ele sempre alegou que as acusações eram politicamente motivadas, uma forma de conter suas ações em oposição a Putin.

Tags: