Zelensky minimiza laser da Rússia e tem o aval de especialista: ‘Não é uma arma surpreendente’

Para o presidente ucraniano, Moscou busca solução milagrosa para vencer a guerra, e novo armamento é apenas "propaganda"

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, recebeu com tranquilidade e uma certa dose de ironia as recentes declarações da Rússia de que colocaria em uso um novo sistema a laser capaz de destruir os drones ucranianos, que têm sido a principal arma de Kiev na guerra. Um especialista de Israel, país que de fato testou uma arma a laser, endossou a posição do líder ucraniano e disse que tal sistema seria incapaz de mudar os rumos do conflito.

Zelensky classificou o anúncio de Moscou como “propaganda” e disse que isso “indica claramente o fracasso completo da invasão”, de acordo com a rede Radio Free Europe. Segundo ele, os líderes russos “têm medo de admitir que erros catastróficos foram cometidos no mais alto nível militar e estatal na Rússia”.

O líder ucraniano fez até um paralelo com a Alemanha nazista ao dizer que Moscou busca uma “arma maravilhosa” para vencer a guerra, o mesmo que Hitler prometia quando percebeu que dificilmente venceria a Segunda Guerra Mundial.

“Quanto mais claro ficava que eles não tinham chance na guerra, mais propaganda havia sobre uma arma incrível que seria tão poderosa a ponto de garantir um ponto de virada”, disse ele em um discurso em vídeo, segundo a rede britânica BBC. “E assim vemos que, no terceiro mês de uma guerra em grande escala, a Rússia está tentando encontrar sua ‘arma maravilhosa'”.

Questionado sobre a questão, um funcionário do Departamento de Defesa dos EUA que não quis ser identificado concordou com Zelensky e disse que não viu “nada para corroborar os relatos de lasers sendo usados” na Ucrânia.

O líder ucraniano, Volodymyr Zelensky (Foto: Governo da Ucrânia/Divulgação)
Arma laser já existe

Em abril, o primeiro-ministro de Israel, Naftali Bennett, publicou um vídeo mostrando um sistema laser desenvolvido no país para derrubar mísseis e drones inimigos. Segundo ele, a grande vantagem é o preço dos disparos.

“Israel testou com sucesso o novo sistema de interceptação a laser Iron Beam (feixe de ferro, em tradução literal). Este é o primeiro sistema de armas baseado em energia do mundo que usa um laser para derrubar UAVs (veículos aéreos não tripulados, da sigla em inglês), foguetes e morteiros a um custo de US$ 3,50 por tiro. Pode parecer ficção científica, mas é real”, disse o premiê no Twitter.

Militarmente, entretanto, um sistema como esse não tende a oferecer vantagem a quem o utiliza. Mesmo a questão do preço é questionável, já que o desenvolvimento do sistema tem um custo elevado. Essa é a análise do especialista em defesa antimísseis Uzi Rubin, do Instituto de Estratégia e Segurança de Jerusalém (JISS).

“Zelensky está certo, não é uma arma surpreendente”, disse ele à BBC, destacando que um sistema de mísseis poderia fazer vários disparos de uma vez, contra apenas um disparo do laser. “Foram vários segundos até derrubar o UAV. Existem maneiras muito melhores de fazer isso. Usar um Stinger ou qualquer míssil antiaéreo teria sido mais barato, mais rápido e com maior alcance”.

Rubin também contesta o argumento russo de que o laser destrói rapidamente o alvo. “Não é como em Star Wars, onde apontam uma arma laser para os bandidos, apertam um botão e o bandido explode. Na realidade, é como um forno de microondas. Se você quiser fazer um copo de água ferver, leva tempo. O laser é o mesmo. Você precisa colocá-lo no alvo e esperar até que o aqueça e o destrua”, disse.

Laser x drones

O primeiro-ministro russo Yury Borisov disse na quarta-feira (18) que o novo sistema laser de suas forças armadas, chamado Zadira, é “muitas vezes mais poderoso, permitindo a incineração de vários alvos”. O alcance do armamento seria de 5 quilômetros, capaz de incinerar drones em cinco segundos. E, “sim, os primeiros protótipos já estão sendo usados”, segundo ele.

O presidente russo Vladimir Putin já havia citado a criação de uma arma laser em 2018, parte de seu arsenal secreto de guerra. Seria um sistema mais moderno e barato para substituir os mísseis de defesa aérea usados atualmente. Um outro sistema a laser, esse batizado Peresvet, também estaria sendo usado, mas não para derrubar drones, e sim para desativar satélites.

O principal interesse de Moscou com o laser, entretanto, é mesmo derrotar os drones ucranianos. O drone Bayraktar TB2, fabricado na Turquia, é a arma de maior destaque do exército da Ucrânia. O porta-voz do Kremlin Dmitry Peskov chegou a alertar, no final de 2021, que o Bayraktar poderia ter um impacto “desestabilizador” na região.

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho, no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo ano. Aquele conflito foi usado por Vladimir Putin como argumento para justificar a invasão integral, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país.

No início da ofensiva, o objetivo das forças russas era dominar Kiev, alvo de constantes bombardeios. Entretanto, diante da inesperada resistência ucraniana, a Rússia foi forçada a mudar sua estratégia. As tropas, então, começaram a se afastar de Kiev e a se concentrar mais no leste ucraniano, a fim de tentar assumir definitivamente o controle de Donbass e de outros locais estratégicos naquela região.

Em meio ao conflito, o governo da Ucrânia e as nações ocidentais passaram a acusar Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, dando início a investigações de crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos pelos soldados do Kremlin.

O episódio que mais pesou para as acusações foi o massacre de Bucha, cidade ucraniana em cujas ruas foram encontrados dezenas de corpos após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.

O jornal The New York Times realizou uma investigação com base em imagens de satélite e associou as mortes em Bucha a tropas russas. As fotos mostram objetos de tamanho compatível com um corpo humano na rua Yablonska, entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.

Fora do campo de batalha, a Rússia tem sido alvo de todo tipo de sanções. As esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais já começaram a sufocar a economia russa, e o país tem se tornado um pária global. Desde a invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro, mais de 600 empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral.

Os mortos de Putin

Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.

Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.

A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.

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