Irã aprova lei sobre ‘hijab e castidade’ que prevê até dez anos de prisão para mulheres

Texto legal que ainda precisa ser aprovado por um órgão conservador, foi classificado como 'apartheid de gênero' pela ONU

O parlamento do Irã aprovou na quarta-feira (20) uma lei sobre “hijab e castidade” que endurece o já existente código de vestimenta imposto a seus cidadãos. Embora as novas normas sirvam também para os homens, as mulheres são atingidas mais duramente, com penas de prisão de até dez anos em caso de violação.

De acordo com a rede BBC, a lei agora será submetida ao Conselho Guardião, um órgão conservador de supervisão composto por clérigos e juristas que precisa aprovar o texto legal antes de colocá-lo em vigor. Se aprovado, ele terá um período probatório de três anos antes de se tornar definitivo.

No caso das mulheres, a lei diz que é inaceitável qualquer “roupa reveladora ou apertada, ou roupa que mostre partes do corpo abaixo do pescoço ou acima dos tornozelos ou acima dos antebraços.” Já para os homens é vetada a “roupa reveladora que mostre partes do corpo abaixo do peito ou acima dos tornozelos ou ombros”, segundo a agência Al Jazeera.

Iranianas usando o hijab em foto de outubro de 2017 (Foto: BockoPix/Flickr)

A pena inicial para quem descumprir as regras é de multa. Mas está prevista a prisão em certos casos, como violações registradas “de forma organizada” ou “em cooperação com governos, redes, mídia, grupos ou organizações estrangeiros.”

Assim, tendem a ser passíveis de prisão os casos de violação da nova lei registrados em protestos populares como os desencadeados pela morte da jovem Mahsa Amini, em setembro de 2022, que Teerã alega terem sido promovidos pelo Ocidente.

O véu é obrigatório no país desde 1981, dois anos após a Revolução Islâmica. Pela lei atual, mulheres que aparecerem em locais públicos sem o hijab estão sujeitas a uma pena que varia entre dez dias e dois meses de prisão ou uma multa de até 500 mil riais (R$ 58).

Apartheid de gênero

A lei, que vinha sendo debatida desde junho, foi abordada pela ONU (Organização das Nações Unidas) no início de setembro. Oito especialistas em direitos humanos foram designados pela entidade para avaliar o texto legal e seus desdobramentos.

“O projeto de lei poderia ser descrito como uma forma de apartheid de gênero, uma vez que as autoridades parecem governar através de discriminação sistêmica, com a intenção de reprimir mulheres e meninas até à submissão total”, disseram especialistas.

Ainda segundo eles, a legislação “viola direitos fundamentais, incluindo o direito de participar na vida cultural, a proibição da discriminação de gênero, a liberdade de opinião e expressão, o direito ao protesto pacífico e o direito de acesso a serviços sociais, educacionais e de saúde e a liberdade de movimento.”

Levante popular

O Irã vive um levante popular contra o governo iniciado após a morte, em 16 de setembro de 2022, de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos que visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela “polícia da moralidade” por não usar “corretamente” o hijab, véu muçulmano obrigatório.

As manifestações começaram no Curdistão, província onde ela vivia, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da República Islâmica.

As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de centenas de mortes nas mãos da polícia e inúmeros casos de execuções judiciais abusivas, aplicadas contra manifestantes julgados às pressas.

“A máquina de matar do governo está acelerando”, afirmou Mahmood Amiry Moghaddam, diretor da IHR. “O objetivo é intimidar as pessoas, e as vítimas são as pessoas mais fracas da sociedade”, acrescentou, referindo-se ao fato de que a maioria dos condenados pertence a minorias étnicas iranianas.

No início de outubro do ano passado, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

Além dos mortos e feridos, a HRW cita os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. Condena ainda o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

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