Após dizer que foi solto, jornalista preso pelo Taleban continua incomunicável

Bahram Aman, âncora de um telejornal da principal TV independente do país, foi detido junto do editor e de um assessor jurídico da emissora

Um dia após ser preso pelo Taleban, um conhecido apresentador de notícias da rede afegã TOLOnews declarou em seu perfil no Facebook nesta sexta-feira (18) que já estava em liberdade. A emissora, porém, disse que ainda não conseguiu contato com ele para confirmar a soltura. As informações são da rede Radio Free Europe.

Bahram Aman, âncora de um telejornal da principal televisão independente do país, foi levado sob custódia junto do diretor de notícias Khpolwak Sapai e do consultor jurídico Nafi Khaleeq. Eles foram detidos em um escritório do canal.

Bahram Aman nos estúdios da principal TV independente do Afeganistão (Foto: Bahram Aman/Reprodução Facebook)

Oficiais de inteligência da organização islâmica, que assumiu o poder central no Afeganistão, em agosto, chegaram ao local por volta das 20h. Segundo comunicado da TOLOnews, os três foram levados sob a acusação de “transmitir notícias de que as autoridades proibiram os canais de televisão de transmitir séries de drama estrangeiras”. Sapai e Khaleeq foram libertados em poucas horas. Aman permaneceu detido até o dia seguinte, quando fez uma postagem na rede social.

“Depois de quase 24 horas, saí da prisão. Sempre serei a voz do povo!” escreveu o apresentador em seu post no Facebook.

No entanto, pelo Twitter, a TOLOnews informou que não conseguiu confirmar a libertação do jornalista, nem pode afirmar se ele tinha controle sobre suas contas nas redes sociais.

O Ministério da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício em dezembro aos canais locais de televisão para que fossem encerradas as exibições de dramas e novelas em que mulheres aparecem atuando, a menos que tenham um tema islâmico. As novas medidas também se estendem às jornalistas de TV, que devem usar a burca diante das câmeras.

Inicialmente, a proibição foi estabelecida de forma vaga. Agora, segundo a emissora independente, o regime talibã estaria sendo mais rigorosa na aplicação e fiscalização da diretiva, o que foi noticiado pelo programa apresentado por Aman.

A Unama (Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão) repercutiu a prisão do trio. “A ONU pede a libertação de todos aqueles levados por homens armados e o fim da intimidação e ameaças contra jornalistas e meios de comunicação independentes”, escreveu a entidade no Twitter.

O Comitê para a Proteção dos Jornalistas também saiu em defesa dos funcionários da TOLOnews, emitindo uma declaração no Twitter que pedia a libertação imediata de Aman, bem como o fim da intimidação a jornalistas afegãos.

Por que isso importa?

Diversas pessoas foram presas pelo Taleban em 2022 por serem jornalistas ou colaborarem com profissionais da área. No dia 6 de janeiro, três repórteres foram detidos enquanto trabalhavam na cobertura de manifestações contra os jihadistas na província de Panjshir. Eles estavam a serviço de um canal no YouTube chamado Kabul Lovers, com aproximadamente 244 mil inscritos.

Em outro caso registrado neste ano, o Taleban prendeu Faizullah Jalal, professor de Direito e ciência política da Universidade de Cabul, em 8 de janeiro. Ele foi detido por quatro dias sob acusações de fazer declarações “sem sentido” e “incitar” pessoas contra os talibãs. Depois de solto, Jalal disse ter sido preso por ter discutido com um porta-voz talibã em um debate na televisão. Aslam Ejab e Waris Hasrat, da Ariana TV, são as vítimas mais recentes da repressão talibã à mídia.

Números mostram que o jornalismo afegão tem sido sufocado pelo Taleban. Em dezembro de 2021, uma pesquisa conduzida em parceria pela ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e pela Associação de Jornalistas Independentes do Afeganistão (AIJA) apontou que 231 veículos de imprensa foram fechados e mais de 6,4 mil jornalistas perderam o emprego no Afeganistão desde o dia 15 de agosto, quando o Taleban assumiu o poder no país.

Os dados apontam que mais de quatro em cada dez veículos de comunicação desapareceram nesse período, e 60% dos jornalistas e funcionários da mídia estão impossibilitados de trabalhar. As mulheres sofreram muito mais: 84% delas perderam o emprego, contra 52% no caso dos homens. Entre as 34 províncias do país, em 15 delas não há sequer uma mulher jornalista trabalhando atualmente.

Dos 543 meios de comunicação registrados no Afeganistão antes da ascensão talibã, apenas 312 ainda operavam no final de novembro. Isso significa que 43% dos meios de comunicação afegãos desapareceram em um espaço de três meses. Das 10.790 pessoas que trabalhavam na mídia afegã (8.290 homens e 2.490 mulheres) no início de agosto, apenas 4.360 (3.950 homens e 410 mulheres) ainda estavam trabalhando quando a pesquisa foi realizada.

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