O Taleban anunciou no domingo (26) que as mulheres que quiserem viajar longas distâncias devem estar acompanhadas por um homem da família. A determinação, que vem junto de um pacote linha-dura de novas medidas do regime extremista, é o mais recente episódio da repressão de gênero imposta pelo Ministério da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício. As informações são da rede France24.
O órgão governamental também determinou a todos os proprietários de veículos para que ofereçam caronas apenas para as mulheres que estejam usando hijab, o véu que faz parte do conjunto de vestimentas recomendado pela doutrina islâmica.
“Mulheres que viajam por mais de 72 quilômetros não devem receber oferta de carona se não estiverem acompanhadas por um parente próximo”, disse o porta-voz do ministério Sadeq Akif Muhajir à agência AFP, especificando que o familiar deve ser do sexo masculino.
A norma, divulgada nas redes sociais, vem poucas semanas após o ministério ter determinado aos canais locais de televisão para que fossem encerradas as exibições de dramas e novelas em que mulheres aparecem atuando. As novas medidas também se estendem às jornalistas de TV, que deverão usar a burca diante das câmeras.
A nova leva de regras do Ministério da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício ainda inclui a proibição de os cidadãos afegãos ouvirem música dentro dos veículos. As apresentações de música ao vivo estão formalmente proibidas desde setembro.
A nova realidade no país tem sido particularmente devastadora para as mulheres, que voltaram a viver sob um regime repressivo baseado numa interpretação radical do Islã. Entre as imposições dos talibãs às mulheres, além da proibição de saírem de casa desacompanhadas, estão o veto à educação em escolas e ao trabalho e inúmeros casos de solteiras ou viúvas forçadas a se casar com combatentes.
O tratamento opressivo dedicado às mulheres pela organização extremista tem sido o principal motivo de críticas por parte do Ocidente. Nos encontros diplomáticos dos novos governantes afegãos com representantes de nações e de organismos internacionais, por exemplo, apenas homens têm sido enviados, atendendo a uma reivindicação dos próprios talibãs.
Por que isso importa?
A repressão de gênero é uma das principais marcas desse início de governo talibã e se espalha por diversas setores da sociedade. As mulheres que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.
Na educação, o governo extremista tem postergado uma tomada de decisão, o que mantém fora da escola as meninas acima dos sete anos de idade em diversas regiões do país. Algumas poucas províncias do país, entre as 34 existentes, permitiram a volta das meninas à escola. Assim, muitas meninas têm recorrido a uma instituição que ministra aulas online, a fim de não perderem o ano letivo ou interromperem os estudos.
Mulheres também não podem sair de casa desacompanhadas, e há relatos de solteiras e viúvas forçadas a se casar com combatentes. Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em partes do país, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.
Há também um código de vestimenta para as mulheres, forçadas a usar o hijab quando estão em público. Como forma de protestar, mulheres afegãs em todo o mundo iniciaram um movimento online, postando fotos nas redes sociais com tradicionais roupas afegãs coloridas, sempre acompanhadas de hashtags como #AfghanistanCulture (cultura afegã) e #DoNotTouchMyClothes (não toque nas minhas roupas).
A proibição do esporte feminino é outra realidade sob o governo talibã. Embora o grupo extremista não tenha emitido uma nota oficial sobre o veto, ele se faz presente na rotina das atletas afegãs. Depois do críquete feminino, cuja proibição foi anunciada pelo vice-líder da comissão cultural do Taleban, Ahmadullah Wasiq, a repressão atingiu outra modalidade muito popular no país: o taekwondo.
O Afeganistão tem apenas duas medalhas olímpicas em sua história: dois bronzes conquistados pelo atleta do taekwondo Rohullah Nikpai em Beijing 2008 e Londres 2012. As conquistas de Nikpai no masculino popularizaram o esporte no país, inclusive entre as mulheres. Porém, agora que o Taleban assumiu o poder, a prática tem se restringido aos homens, e as escolas que ofereciam aulas de taekwondo para mulheres fecharam as portas.