ONG relata agressão contra jornalista afegã e responsabiliza membros do Taleban

Selgay Ehsas diz que levou uma pancada na cabeça quando andava pela rua e mais tarde foi forçada a gravar um vídeo absolvendo os radicais

A ONG Comitê para Proteger Jornalistas (CPJ), sediada em Nova York, nos EUA, acusa membros do Taleban de agredirem a jornalista afegã Selgay Ehsas, que apresenta um programa de esportes na emissora independente Radio Dost, do Afeganistão.

O relato do CPJ afirma que Ehsas foi abordada por talibãs armados com rifles quando voltava para casa na província de Nangarhar. Eles teriam dado um tiro de alerta para o alto, o que assustou a jornalista e a fez derrubar o celular. Na sequência, quando se abaixou para pegar o aparelho do chão, ela conta que levou uma forte pancada na cabeça, provavelmente desferida com a coronha de uma arma.

Antes de desmaiar, a mulher afirma que ouviu um dos homens dizendo que o ataque aconteceu porque ela não “se sentou em casa, apesar dos avisos”. Ela diz, ainda, que eles se identificaram como Mujahedin, termo que designa os combatentes talibãs.

Socorrida por indivíduos que presenciaram o episódio, ela foi levada ao hospital, onde os médicos constataram uma lesão nas costas.

Após o ocorrido, Ehsas gravou um vídeo direcionado ao grupo radical, questionando se apoia ataques a mulheres. As imagens foram compartilhadas com um conhecido e caíram nas redes sociais, chegando ao conhecimento dos talibãs.

Jornalista em Maimana, no Afeganistão, conduz entrevista para o rádio local (Foto: Knottleslie/Flickr)

O vídeo levou o Taleban a agir novamente contra a jornalista. O pai e o tio dela foram detidos, a fim de pressioná-la a se retratar. Então, ela diz que gravou um vídeo roteirizado pelos talibãs, no qual negou o envolvimento do grupo no incidente. Posteriormente, relata ter sofrido novas ameaças, o que a levou a se esconder juntamente com os familiares.

“Quase um ano desde a tomada do Afeganistão pelo Taleban, o ciclo de ameaças, espancamentos e intimidações de jornalistas continua em ritmo alarmante”, disse Carlos Martinez de la Serna, diretor de programas do CPJ. “O ataque brutal à jornalista afegã Selgay Ehsas, seguido por membros do Taleban forçando-a a gravar um vídeo supostamente absolvendo o grupo, mostra que membros da imprensa enfrentam obstáculos gigantes ao trabalhar sob o domínio do Taleban”.

Por que isso importa?

As estatísticas mostram que o jornalismo afegão tem sido sufocado pelo Taleban. Em dezembro de 2021, uma pesquisa feita em parceria pela ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e a Associação de Jornalistas Independentes do Afeganistão (AIJA) apontou que 231 veículos de imprensa foram fechados e mais de 6,4 mil jornalistas perderam o emprego no país desde 15 de agosto, quando o Taleban assumiu o poder.

Conforme os dados, mais de quatro em cada dez veículos de comunicação desapareceram nesse período, e 60% dos jornalistas e funcionários da mídia estão impossibilitados de trabalhar. As mulheres sofreram muito mais: 84% delas perderam o emprego, contra 52% no caso dos homens. Entre as 34 províncias do país, em 15 delas não há sequer uma mulher jornalista trabalhando atualmente.

Dos 543 meios de comunicação registrados no Afeganistão antes da ascensão talibã, apenas 312 ainda operavam no final de novembro. Isso significa que 43% dos meios de comunicação locais desapareceram em três meses. Das 10.790 pessoas que trabalhavam na mídia afegã (8.290 homens e 2.490 mulheres) no início de agosto, apenas 4.360 (3.950 homens e 410 mulheres) ainda atuavam quando a pesquisa foi feita.

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