Taleban prende duas ativistas em 24 horas e amplia críticas da comunidade internacional

Grupo linha-dura tem sido particularmente repressor contra as mulheres, que voltaram às aulas em universidades apenas nesta semana

O Taleban prendeu duas ativistas no Afeganistão entre quarta (2) e quinta-feira (3), ampliando as críticas da comunidade internacional principalmente no que diz respeito à repressão de gênero e à liberdade de expressão. As informações são do site La Prensa Latina.

As duas militantes detidas pelas forças talibãs são integrantes do Movimento de Mulheres Poderosas do Afeganistão. Ambas foram levadas sob custódia enquanto participavam de protestos em Cabul pelos direitos educacionais e trabalhistas das mulheres, em repúdio às normas estabelecidas pelo Ministério da Propagação da Virtude e Prevenção do Vício.

Mulheres ativistas estão desaparecendo no Afeganistão. ONU cobra informações aos talibãs (Foto: Twitter/Reprodução)

A Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão (Unama, da sigla em inglês) condenou as prisões e instou os jihadistas a libertarem as mulheres, bem como a apresentarem justificativas para as detenções.
“A ONU repete seu apelo para que todas as ativistas e parentes ‘desaparecidas’ sejam libertadas”, escreveu a organização em sua conta no Twitter.

Até o momento, as autoridades talibãs não se pronunciaram sobre o episódio.

A repressão de gênero é uma das principais marcas desse início de governo talibã e se espalha por diversas setores da sociedade. Um pequeno avanço ocorreu na quarta-feira (2), quando as universidades públicas do país reabriram pela primeira vez desde que os insurgentes assumiram o poder em agosto do ano passado.

O Taleban ainda não detalhou qual o seu plano de ensino para as estudantes universitárias, mas autoridades da educação adiantaram à agência Reuters que as mulheres poderão frequentar as aulas na condição de que estejam fisicamente separadas dos alunos do sexo masculino.

Uma das ativistas presas nesta semana, Zahra Mohammadi, havia declarado em uma entrevista à agência EFE em dezembro, logo após liderar uma manifestação contra o regime islâmico, que “não somos as mulheres de 20 anos atrás, que costumavam ficar em casa”.

Jornalista interrogado e agredido

O jornalista Abdul Qayum Zahid Samadzai, repórter do 92News Media Group, com sede no Paquistão, foi preso em Cabul na terça-feira (1º) por um homem que se identificou como membro da Diretoria-Geral de Inteligência do Taleban. Ele trabalhava em uma reportagem sobre a reabertura das universidades públicas quando foi abordado e colocado dentro de um carro, onde foi submetido a um interrogatório por agentes do governo, informou o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ, da sigla em inglês).

Samadzai foi agredido e ficou preso por cerca de 36 horas antes de ser libertado sob fiança, segundo o CPJ. Após a liberação, um agente talibã deu ordens para que ele parasse com as reportagens até que recebesse permissão do grupo islâmico para retomar ao Paquistão.

(Foto: Abdul Qayum Zahid Samadzai/arquivo pessoal)

O jornalista relatou ter sido esbofeteado e acusado de praticar espionagem para países estrangeiros. Diante da acusação, ainda foi pressionado a revelar as identidades de outros jornalistas que “espionam” o Taleban.

“O Taleban deve acabar com as prisões arbitrárias e agressões a jornalistas como Zahid Samadzai, bem como deve responsabilizar os responsáveis ​​por tais ações”, disse Steven Butler, coordenador do programa para a Ásia do CPJ, em Washington. “É uma grave ameaça para os meios de comunicação livres restantes que operam no Afeganistão e precisa acabar”, acrescentou.

Por que isso importa?

As mulheres são as que mais sofrem nas mãos do regime islâmico dos talibãs. As que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão extremista seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.

Na educação, o governo extremista tem postergado uma tomada de decisão, o que mantém fora da escola as meninas acima dos sete anos de idade em diversas regiões do país. Algumas poucas províncias do país, entre as 34 existentes, permitiram a volta das meninas à escola. Assim, muitas meninas têm recorrido a uma instituição que ministra aulas online, a fim de não perderem o ano letivo ou interromperem os estudos.

Mulheres também não podem sair de casa desacompanhadas, e há relatos de solteiras e viúvas forçadas a se casar com combatentes. Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em partes do país, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.

Há também um código de vestimenta para as mulheres, forçadas a usar o hijab quando estão em público. Como forma de protestar, mulheres afegãs em todo o mundo iniciaram um movimento online, postando fotos nas redes sociais com tradicionais roupas afegãs coloridas, sempre acompanhadas de hashtags como #AfghanistanCulture (cultura afegã) e #DoNotTouchMyClothes (não toque nas minhas roupas).

A proibição do esporte feminino é outra realidade sob o governo talibã. Embora o grupo extremista não tenha emitido uma nota oficial sobre o veto, ele se faz presente na rotina das atletas afegãs. Depois do críquete feminino, cuja proibição foi anunciada pelo vice-líder da comissão cultural do Taleban, Ahmadullah Wasiq, a repressão atingiu outra modalidade muito popular no país: o taekwondo.

O Afeganistão tem apenas duas medalhas olímpicas em sua história: dois bronzes conquistados pelo atleta do taekwondo Rohullah Nikpai em Beijing 2008 e Londres 2012. As conquistas de Nikpai no masculino popularizaram o esporte no país, inclusive entre as mulheres. Porém, agora que o Taleban assumiu o poder, a prática tem se restringido aos homens, e as escolas que ofereciam aulas de taekwondo para mulheres fecharam as portas.

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