Gigante da construção é acusada de crimes contra a humanidade por financiar o EI

Lafarge, maior produtora de cimento do mundo, teria pagado ao grupo extremista para manter suas operações no norte da Síria durante a guerra civil

A francesa Lafarge, uma gigante global da construção civil, está sob investigação por cumplicidade em crimes contra a humanidade, acusada de financiar o grupo terrorista Estado Islâmico (EI). A suprema corte francesa reconheceu a acusação ao derrubar uma decisão favorável à empresa emitida por uma corte inferior. As informações são da agência estatal turca Andalou.

A relação entre Lafarge e EI ocorreu quando a empresa manteve operações no norte da Síria, no início da guerra civil que ainda assola o país. A gigante da construção teria pagado aos extremistas para manter uma fábrica de cimento na região, além de comprar matéria-prima e combustível de grupos armados da região.

“Uma entidade pode ser cúmplice de crimes contra a humanidade, mesmo que não tenha a intenção de ser associado aos crimes cometidos”, diz a decisão emitida pela suprema corte francesa. “Pagar conscientemente vários milhões de dólares a uma organização cujo único propósito é exclusivamente criminoso é suficiente para constituir cumplicidade, independentemente de a parte em questão estar agindo para exercer uma atividade comercial”.

Gigante francesa da construção civil é acusada de financiar o Estado Islâmico
Lafarge é a maior produtora de cimento do mundo e opera na Síria, onde fez pagamentos ao Estado Islâmico (Foto: Wikimedia Commons)

A empresa, que tornou-se a maior produtora de cimento do mundo após a fusão com a suíça Holcim, chegou a informar às agências de inteligência francesas de sua relação comercial com o EI. A inteligência, ciente do fato, em nenhum momento informou que aquilo constituía um crime. Ao contrário, usou a conexão para obter informações sobre sobre a atuação do grupo extremista.

“Se houver documentos apontando para a responsabilidade de atores estatais franceses, esperamos que a investigação atual os leve em consideração e que os juízes de investigação examinem a possível responsabilidade criminal do Estado francês, assim como da Lafarge”, disse Cannelle Lavite, do Centro Europeu de Direitos Constitucionais e Humanos (ECCHR, na sigla em inglês), entidade civil que foi admitida como parte na ação judicial.

O caso pode respingar inclusive no European Investment Bank (Banco de Investimento Europeu, em tradução literal), que é um dos maiores investidores da Lafarge na Síria. Segundo Lavite, se a empresa tinha conhecimento de que cometia um crime e ele foi de alguma forma facilitado pelos investimentos, o banco pode ser igualmente acusado.

Por que isso importa?

O EI teve uma considerável perda financeira recentemente, de acordo com relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas). O documento afirma que as perdas se devem a dois fatores: as operações antiterrorismo no mundo e a má gestão de fundos por parte do grupo. Ainda assim, os Estados-Membros do órgão estimam que o EI tenha “recursos significativos”, algo entre US$ 25 milhões e US$ 50 milhões.

As análises sugerem que a maior parte desse dinheiro esteja no Iraque, tornando a rede do EI na Síria parcialmente dependente de apoio financeiro. “Acredita-se que os combatentes do EI na República Árabe Síria tenham recebido vários milhões de dólares em 2020 do EI no Iraque”, diz o documento.

Em meados de abril de 2021, as autoridades iraquianas anunciaram a descoberta, em Mosul, do equivalente a US$ 1,7 milhão enterrados, em dinheiro, ouro e prata. A descoberta sugere que a verba do grupo jihadista pode ser maior que a imaginada, devido ao dinheiro escondido pelo grupo do qual não se tem conhecimento.

Segundo o relatório da ONU, as maiores despesas do EI são os salários dos combatentes e o sustento das famílias de militantes mortos. Outro gasto considerável é com a libertação de soldados e parentes presos em campos de detenção. Já as principais fontes de arrecadação do grupo são extorsão, sequestro e pilhagem.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um “porto seguro” para extremistas. Em dezembro de 2013, um levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram. Saiba mais.

Tags: